4 - Mortos vivos

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    Anos se passaram desde que Black havia começado a estudar em casa, cinco dias por semana professores entravam e saiam da casa. Hoje Black já não era mais uma criança, já com 18 anos o filho do ferreiro era bem mais instruído do que muitos filhos de nobres, tanto em matérias comuns quanto em combate. Fizera de seu passatempo ajudar o pai com as encomendas de armas e armaduras, sua adolescência trabalhando na forja,o fez um rapaz de aspecto musculoso, e assim como quando pequeno, continuava com o rosto de lindo apesar de verde.
   Com o tempo, o rapaz já não se importava mais com os preconceitos, tinha orgulho de si e até mesmo adotou um penteado nativo do povo orc, coisa que nem seu pai concordou muito no começo, um pequeno moicano no alto da cabeça quase raspada.

-Filho, já é hora de fechar. Por favor tranque a porta da frente.   -Antes que Black pudesse reagir ao pedido, a porta se abriu e um homem de armadura branca entrou.

- Já encerramos por hoje. - Anunciou Black, mas o homem sequer deu ouvidos e continuou até o velho ferreiro.

- Trago uma mensagem de vossa majestade. O rei Lúcius requisita sua visita ao Palácio amanhã ao meio dia em ponto,   isso é de extrema importância, então chegue na hora.

- Obrigado. - Edgar respondeu quase sem ar. Black conhecia muito bem seu pai para saber que seu velho estava assustado. Após o anúncio, o cavaleiro se foi e logo em seguida, o jovem girou a chave na porta e a trancou.

- Oque foi pai?

- Eu sabia que esse dia chegaria cedo ou tarde, tenho certeza de que é isso. Ele vai me mandar pra guerra, assim como fez com o ferreiro de alma que o serviu antes de mim.

- Mas qual utilidade o senhor teria na guerra?

-Meu filho, eu converso com as almas nas lâminas, alguém da minha patente pode aprisionar a alma de um cavaleiro morto e extrair a informação que quiser.  - Black emudeceu por um instante.

- Se você for, eu vou junto!!

- Não, não temos certeza se é isso. Mas se for, preciso que assuma a forja enquanto eu estiver fora. - Assim que o filho ia abrir a boca para contestar... - Isso é uma ordem! - Então nervoso e assustado,  o ferreiro subiu as escadas que levam para os cômodos da casa, dando as costas para o filho.

   Normalmente não haveria motivo para tanto alvoroço em um pedido assim, más considerando o grande número de mortos aliados, mesmo não lutando no campo de combate, o medo era justificado, ainda mais tamanha a importância do pai em uma guerra.  Black balançou a cabeça, não iria se preocupar tanto sem saber se realmente era isso que o rei queria.

-PAI, VOU DAR UMA VOLTA.
- Não volte muito tarde.

   Estava anoitecendo e os bares da avenida principal abririam, era hora de esfriar a cabeça. Quem pensasse que com o anoitecer as ruas ficariam menos movimentadas, se engana, pois é quando tudo fica ainda mais agitado. Bares e restaurantes baratos lotam, carroças provavelmente transportando itens que seriam apreendidos durante o dia, agora circulam sem medo.  Mas hoje estava tudo diferente, assim que o orc saiu de casa se deparou com a rua deserta, as luzes dos restaurantes estavam desligadas e não havia sinal de carroças ou som de cavalos trotando por perto. Após andar um pouco pela avenida avistou outro cavaleiro vestido como o de mais cedo na oficina.

- Não devia estar na rua, é perigoso. Vá pra sua casa.

- Oque tá acontecendo aqui?

- Parece que o exército inimigo contornou nossas bases e de alguma forma chegou até a fronteira da cidade. - A pouco mais de cinco anos atrás, algo misterioso aconteceu no mundo, algo que não pôde ser explicado até hoje. No enterro de um mago foragido do reino, o cadáver simplesmente se levantou do caixão e com força sobrenatural assassinou todos da vila próxima ao cemitério, apenas um cavaleiro que fugiu do local sobreviveu. Mas quando voltou com reforço, a pequena vila agora era povoada por outros como o cadáver do mago, assim surgiram os mortos-vivos, criaturas de força descomunal e que lutam conosco até os dias de hoje. - Vá agora.

   Com a notícia, Black retornou até o pai e contou sobre, coisa que apenas deixou o ferreiro mais nervoso e agora totalmente inapto a descansar. Edgar vestiu novamente seu avental surrado e com a cabeça cheia voltou ao trabalho em uma tentativa de esquecer tudo oque acontecia a sua volta.

    No dia seguinte, estava na hora de se encontrar com o rei. Edgar nem se deu ao trabalho de retirar as vestes de ferreiro ou tentar parecer mais limpo, apenas largou seu martelo próximo à brasa quente e retirou as luvas de trabalho. Proxima a porta Black aguardava com vestes de tecido negro e a bota reforçada com aço que usam na oficina.

- Onde pensa que vai?

- Vou te acompanhar, pai, e nada que o senhor diga vai me impedir, tô preocupado tanto quanto você.

- Ahh… tanto faz,  vamo logo. - E então puseram-se a caminho do Castelo, que não ficava tão longe da oficina. A cidade ainda repousava vazia, com um cidadão aqui, outro ali, apenas aqueles que mantinham a cidade funcionando.  Quando próximo aos portões do castelo,  um cheiro terrível de carne podre invadiu suas narinas, ficava mais e mais insuportável a cada passo que davam. Ao virar a esquina em frente aos portões, de longe era nítido o monte de corpos mortos amontoados no chão, as criaturas tinham conseguido entrar.

Black - O livro das feras  (Em Andamento) Onde histórias criam vida. Descubra agora