Era uma construção grande. Poderia ser alocadas ali no mínimo umas 3 famílias. Mas a realidade era diferente, havia apenas um jovem que ao passar dos anos se transformou em um homem.
O problema daquela situação não era o fato de ser muito espaço para pouca pessoa ou era?
Com tanto lugar sobrando, aquela casa virou o mundo para o jovem que entrava na vida madura. Ele não queria mais sair, não queria ver outras pessoas, nem mesmo a sua família! Ele estava isolado em seu mundo de tijolos e concretos.
Há quem diga que a casa retribuía aquele amor, mas como se ela era constituída de tanto material grosso e sem vida? Esses lunáticos...
Mas para o garoto a casa sempre estava cheia, os sentimentos de alegria, amor e gratidão preenchiam o lugar, eram imagens graciosas fazendo os trabalhos domésticos. Eles até se juntaram para criar uma horta, assim o homem teria seu próprio alimento e o principal, dado pela a sua casa.
Ali se instalava um relacionamento abusivo, sim, entre a casa, o homem e seus sentimentos que deixaram se enganar.
A casa para firmar esse contrato macabro, começou a responder o que o jovem fazia. Se o homem contava uma piada, ela soltava uma risada, se ele a elogiava, ela agradecia. E foi assim que tudo tendeu a piorar.
O homem já não sabia mais o que era o mundo exterior. Ele estava dentro do mito das cavernas. E toda noite ele se reunia na sala, acompanhado dos seus sentimentos mais puros e profundos, estava mergulhando com intensidade naquela realidade. Sim, era um tolo.
E a casa macabra adorava aquilo, afinal, não era culpa dela se um maluco a idolatrava a esse ponto. O importante era se manter impecável por dentro e por fora, mesmo que uma parte de seu interior fosse podre.
O tempo foi passando e a vaidade da casa foi aumentando ao ponto de desgastar o homem, ele já não ficava tão animado quanto antes, sua disposição havia sumido. E aqueles sentimentos que o ajudavam, nem mesmo apareciam.
E da parte escura da casa, uma quantidade de sombras se espalhavam pelos cômodos grandes da casa. O homem não se importou com aquela sujeira, pois estava a um estado em que ele havia deixado a casa suja. Então para ele aquilo era fruto de sua insuficiência, o que deixava a situação ainda pior.
As sombras tomaram proporções maiores, a vontade da casa de ter a vida dele estava falando mais alto. A tristeza, a sensação de inferioridade e a baixa autoestima do homem se juntaram com aquele sentimento obscuro.
Os quatros estavam reunidos em volta da cama do homem doente, observando sua noite desconfortável de sono.
O jovem sentiu as presenças e com isso acordou, mas acordou sem movimentos bruscos, sem uma respiração alta. A única coisa que ele conseguiu fazer era abrir os olhos, como se estes dois órgãos quisessem saltar de seu rosto. Era praticamente uma paralisia do sono, porém, infelizmente era real para ele.
As imagens negras tentaram açoitar seu corpo, mas em uma mudança súbita de sorte, o homem conseguiu escapar da cama e correr para a cozinha. Como ambos ali faziam parte da casa e do homem, eles já estavam a espera do prisioneiro.
O homem como meio de defesa, pegou uma faca que havia deixado no balcão que dividia a sala com a cozinha. E foi nesse momento que começou a luta pela vida.
Primeiro os sentimentos ruins do homem o atacaram, sua imagem estava depreciativa e sua autoestima baixa era mais forte que ele. Mas o homem não se deixou vencer, acabou com a autoestima e dali atacou a tristeza que foi um pouco mais fácil.
A indisposição do homem já tinha fugido com o rabo entre as pernas e agora só restava ele e a casa com sua intenção perversa.
O sequestrado antes de ser atacado moveu sua mão em um lance rápido, agarrando um castiçal e lançando suas velas nas cortinas. O contato da vela com o tecido resultou em uma chama alta que se espalhou rapidamente pelas paredes.
O jovem por estar cansado, largou a faca, morreria ele ali? Entregaria a sua vida assim como a casa desejava?
Não, como qualquer um, ele não poderia desistir dessa maneira. Sendo derrotado por algo irracional! Então ele se apoiou no sofá e levantou, encarando as sombras da casa. Ele gritou e correu, partindo para cima daquelas imagens.
Eram socos e chutes inúteis, ele acertava um e recebia três. Por fim, a faca que era sua arma, se voltou contra ele. Perfurando sua barriga.
Foi um golpe desesperado da casa que estava virando cinzas. Assim como o desespero de alguém que não sabe o que está fazendo.
As sombras deixaram o rapaz de lado, sua vida iria se esvair conforme a casa iria queimar. Mas mesmo com esse destino, o homem ainda quis tentar, ele rastejou pelo piso de madeira deixando seu sangue conforme levava seu corpo para fora. E ele conseguiu, chegou até a varanda onde felizmente pode ver os bombeiros estacionarem as pressas. Ele sorriu e usou suas energias para viver mais um pouco. Enquanto era levado para dentro da ambulância, sua visão estava direcionada perfeitamente para sua moradia.
E a casa, já não tinha mais jeito, desmoronou junto a uma imensa labareda e o homem deu um sorriso. Aquela chama foi capaz de iluminar a cidade ao fundo, a cidade que havia esquecido e agora está livre novamente para relembrar e ter uma vida, desta vez, sem prisões. Pelo menos, é o que se espera.
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Pensamentos e sentimentos não tão lúcidos
Short StoryO intuito dos contos é narrar de uma forma diferente os sentimentos alheios e pessoais. Sabe aquela mensagem subliminar que você consegue captar por já ter passado ou sabe como é o sentimento? É assim que se sentirá lendo. Pode ser que não seja agor...