Capítulo 3

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Fiz uma careta quando papai entrou em meu quarto sem bater. Eu estava jogada na cama, me divertindo com o perfil exótico e animado da Hana Collins, tentada a espiar o perfil do Robert Parker.

— A semana de provas está chegando, certo? — ele disse e olhei para o teto tentando lembrar que dia era aquele no calendário. Fazia apenas alguns dias desde o início das aulas do novo semestre.

Papai estava com uma pilha de livros sobre os braços, e a deixou sobre minha escrivaninha. Sentei na cama e fiquei encarando aquele material de forma apática.

— Comprei no caminho para casa. — pôs as mãos na cintura e me encarou daquela forma exibida, e com toda certeza ele ficaria se gabando o semestre inteiro. — Esses livros servem para Mecânica, e seguem para os estudos de Análise Estrutural e Resistência dos Materiais. Não precisa me agradecer!

— A biblioteca deve ter todos esses livros — sibilei desanimada.

— Mas agora não terá que devolver — deu tapinhas sobre os livros. — Olhei seu horário e comprei das disciplinas certas. Dessa vez, faça o favor de passar em Álgebra.

— A grade curricular não é mais a mesma do seu tempo — falei tentando defender a mim mesma. Meu pai achava que tudo era extremamente fácil, uma vez que ele já tinha o diploma daquele curso.

— Não me venha com essas conversinhas, Mary! Estude e me agrade.

Murmurei baixinho, chateada, mas papai não prestou atenção em mim quando afastou a cortina da minha janela e olhou para fora com uma tensão sobre seus olhos. Algum carro estava estacionando em nossa garagem, e devia ser a mamãe.

Ele saiu do meu quarto e segui seus passos com meus olhos. Aquilo não era bom, porque ele estava com uma expressão de que tinha muito para falar. Meus pais não eram capazes de conversar civilizadamente mais, qualquer deslize, qualquer minuto de atraso, qualquer creme dental sem a tampa, era motivo de um estardalhaço de tremer a casa.

Andei lentamente até as escadas e pude ver a cena da minha mãe tropeçando pelos sapatos. Papai a segurou quando a mesma estava para ceder no chão, mas recebeu um empurrão.

— Não me toque! — ela disse com a língua embolada.

Aparentemente estava bêbada. Minha mãe sempre foi uma mulher muito comedida, mas desde que os conflitos de casal começaram, ela estava desafiando o demônio e agindo como uma garota rebelde, coisa que eu nem conseguia ser direito. Eu não fazia ideia do que estava acontecendo com meus pais, e tentar entendê-los era pior do que resolver as equações de Álgebra.

— Você veio dirigindo? — meu pai rosnou, o que era uma perda de tempo, já que a bronca num bêbado era irrisória. — Está louca?

— Sou uma boa motorista, ok? — ela disse se apoiando nas paredes até chegar na escada. Sorri sem graça quando me enxergou finalmente. — Mary! Você está aqui?

— Você bebeu de novo? — falei a observando subir os degraus entre tropeços e solavancos.

Corri para ajudá-la e subimos juntas. Papai, felizmente, resolveu não nos seguir. Talvez ele tivesse entendido que discutir com ela naqueles momentos era perda de tempo, assim quando ela queria brigar quando ele estava trabalhando.

— Por que bebeu tanto? — perguntei quando chegamos ao quarto deles.

— Me deixe em paz — recolheu-se na cama, já fechando os olhos, sem tirar o blazer e os grampos no cabelo.

Apenas enrolei suas pernas e saí do quarto. O clima em casa já não era agradável há bons meses. Qualquer coisa que se fizesse incomodava a todos e perdemos a ação de nos apoiar. Ligar a TV já era motivo de causar caretas estranhas nos demais. Eu não me incomodava com nada, porém meus pais encontravam problemas em qualquer detalhe.

A luz do escritório do papai estava acesa. Ele andava trazendo muito trabalho para casa e só falava disso.

— Mary, não se esqueça de estudar antes de dormir — ouvi sua voz, o que me fez parar e olhar para trás. — O hábito de estudar todos os dias vai ajudá-la a se formar no tempo certo.

Era tudo que ele tinha para me dizer. 

Atenciosamente, RobertOnde histórias criam vida. Descubra agora