Capítulo 1 - Fernanda

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CAPÍTULO 1

~ FERNANDA

— NANDA, EU PRECISO mesmo ficar na casa de dona Lourdes?

Marcele me perguntou pela décima vez, em apenas trinta minutos. Estávamos em meu quarto e eu arrumava a minha mala. No dia seguinte, sexta-feira, eu viajaria para uma fazenda no interior que fora alugada para as filmagens do novo filme. Eu teria de me ausentar por três dias, e por conta disso, minha irmã de dez anos ficaria aos cuidados da vizinha.

— Precisa, sim. — Eu me virei para Marcele, que estava deitada de bruços em minha cama. — Mas eu prometo trazer algo bem bonito para você. Combinado? Qualquer coisa que você quiser, Marcele, você terá.

— Qualquer coisa? — replicou Marcele, com uma expressão sonhadora.

Eram incríveis as nossas semelhanças, apesar de sermos irmãs apenas por parte de mãe. Marcele possuía as mesmas sardinhas no nariz — características que herdamos de Mônica —, mas os olhos dela eram iguais aos de seu pai, um lindo tom de azul, enquanto o meu era o castanho comum. A tonalidade de nosso cabelo também era diferente: os meus são castanhos escuros, os de Marcele, castanhos claros.

— Sim, Marcele, qualquer coisa.

— Eu quero a mamãe. — Ela sussurrou. Enfiou a cabeça debaixo do travesseiro.

— Marcele — chamei, mas ela não me respondeu. — Marcele, olhe para mim.

Ela me olhou sob os longos cílios.

— O quê?

—  Nós já tivemos essa conversa, esqueceu? A mamãe não está mais entre nós. Ela não vai voltar.

— Eu sinto falta da mamãe, Nanda.

As lágrimas de Marcele quebraram o meu coração. Como dizer a uma menina de dez anos que a sua mãe está morta? Eu tentei contar a ela a verdade parcial, que Mônica morreu, mas Marcele teima em imaginar que nossa mãe está em uma viagem e que, a qualquer momento, vai aparecer.

— Eu também sinto, meu anjo. — Coloquei-a sentada em meu colo, seu rostinho de anjo se aninhando em meu peito, e disse suavemente: — Agora, que tal limparmos essas lágrimas? Mônica não ficaria nada feliz em ver a sua princesa chorar. Você quer ver a mamãe triste, Marcele?

— Não! — ela respondeu de imediato, levantando os bracinhos e com as mãos limpando as lágrimas de seu rosto.

— Uma princesa não deve chorar, Marcele. Agora, aonde quer que a mamãe esteja, ela está feliz.

— Eu não quero deixar a mamãe triste.

— E não deixará. Agora eu preciso terminar de arrumar a mala para a viagem.

— Eu não posso ir com você? Deixa, Nanda, por favor. Eu juro que vou me comportar. As minhas amigas na escola vão ao trabalho de suas irmãs mais velhas e eu nunca fui ao seu. Por favor, Nanda...

O que eu nunca contei — e nem pretendia contar — a Marcele era que o meu emprego não era convencional.

— Eu gostaria muito de poder te levar, Marcele, mas não posso. Você ainda é uma criança, e lá não é permitida a entrada de crianças.

— Mas ninguém precisa saber!

— E se eu levá-la e descobrirem, eu posso perder o meu emprego. Ou até mesmo ser presa! Você quer que eu seja presa, Marcele?

Certo. Eu acho que exagerei um pouco. No máximo, José me demitiria. Mas eu não podia levar a minha irmã de dez anos para um lugar em que havia sexo explícito.

POR TRÁS DAS CÂMERASOnde histórias criam vida. Descubra agora