Cap. 6 - Olhos de carvão

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  Queria eu poder não confiar nas pessoas.
  A confiança é uma forma inevitável de quebrar a cara, eventualmente, em qualquer situação e relação. Isso porque você só se decepciona com alguém que criou expectativas, e só cria expectativas depois de construir uma certa confiança sobre essa pessoa. Me diga... É inteligente ser um expectaste esperançoso?

 Eu acho que isso é uma necessidade humana, sabe? Ter alguém aí, do seu lado. Para depois se decepcionar e mesmo assim, procurar alguém novo para preencher o vazio.

A busca constante pela compreensão e reciprocidade.

É meio excitante lembrar uma e outra vez que todos nós temos os mesmos sentimentos. Mesmo a pior pessoa do mundo, alguma vez, já sentiu alguma compaixão. Algum amor. Alguma tristeza...

 Eu fico pensando, por que não podemos todos pensar assim? Digo... É impossível ter a resposta para a paz mundial. Mas, não é preciso ver os outros fazer alguma coisa boa para poder fazer também.

O errado está sempre errado, mesmo que estejam todos fazendo. E o certo está sempre certo, mesmo que só um esteja fazendo.

Não podemos negar que vivemos em um mundo de hipocrisia também.
Por que chamamos alguém de mentiroso quando nós mesmos já mentimos alguma vez? Por que dizemos que algo é "meio-verdade" sendo que se tiver uma porcentagem falsa é mentira?
Eu fico pensando nisso.

Por que minha mãe está no hospital?

O que será que ela vê quando não está consciente?

"Um, dois, três..." Grace conta. "...quatro. Quatro pontos. Ele sempre tinha razão."

"Por que você conta os pontos dos parágrafos?" Pergunto.

"Porque assim saberei quantas vezes o escritor visualizou uma pausa para respirar." Ela responde e sorri. "Eu faço isso desde que aprendi para que servem os sinais de pontuação e como lê-los." Eu assinto. Apenas ela tem essa paciência.

Eu continuo olhando minha sanduíche. Novamente mostarda. Porquê mostarda?

"Você está esquisita hoje." Grace aponta e eu olho para ela. "Tá calada. Isso é estranhamente desconfortável."

"Estou preferindo o silêncio hoje. E talvez sempre." Eu respondo. Preguiçosamente.

"E porquê? Você está triste?"

"Não." Respondo simplesmente. Ela assente.

   Eu olho para frente. O garoto do cabelo castanho chamava a minha atenção. Na verdade, acho que só ele pensava que não chamava atenção, porque olhar para ele não é só curioso, é encantador, de certa maneira. Sorrio pelo pensamento.

  Minha nossa Sol, você está tentado, de uma maneira enrolada, dizer que ele é lindo?

 Talvez esteja. Mas é algo que jamais admitiria em voz alta.

 Ele tirou os óculos escuros e olhou para frente, antes de apagar o cigarro que estava fumando. Ele olhou para mim por alguns segundos antes de desviar e eu pude notar seus lindos olhos azuis. Eram tão azuis quanto o céu da manhã de um dia ensolarado, sem nuvens — o que definitivamente não era o caso de hoje. Eu abro o meu caderno castanho e começo a rabiscar o que em minutos se tornaria um esboço do perfil lateral do rosto de Jacob.

"E Jacob?" Grace tenta puxar assunto mais uma vez, provavelmente notando que estava olhando para ele.

"O que tem ele?" Pergunto, escondendo o caderno. Ela sorri.

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