Prólogo

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   A lua já iluminava a cidade quando Rose Moretti foi ao quarto da filha para lhe contar uma história, o que significava que já era o último dia do mês.

  Esse já era um costume comum na casa dos Moretti. Já que todo final de mês Rose e Frederic contavam uma história para sua pequena filha Emily dormir, e além de criar fantasias de seres mágicos usando as próprias roupas para usarem durante a narração e encenação, eles também faziam mímica imitando os personagens. Apenas para que cada noite fosse inesquecível, assim como as histórias contadas.

  Como você deve estar imaginando, eles eram um casal um tanto quanto... Excêntrico. Não ligavam para o quão louco parecessem por suas animadas noites de histórias, eles adoravam fazer aquilo, estavam sempre alegres e sorridentes. E a pequena Emily adorava ainda mais, dava risadas e seus olhos sempre brilhavam à medida em que ficava cada vez mais imersa naquelas aventuras fantásticas.

  Porém, em uma noite de novembro, já passado o décimo primeiro aniversário de Emily. A mesma tentava dormir enquanto as primeiras gotas de chuva já batiam contra sua janela, mas algo a manteve acordada. Algo incomum que ela nunca viu acontecer antes.

  Seus pais estavam discutindo.

  Os gritos de impaciência de Frederic atravessaram os corredores e chegaram ao quarto de Emily com facilidade. A garota se encolheu na cama, nunca tinha visto o pai com raiva, pelo menos não daquela forma. Ela sabia que seus pais discutiam no quarto deles, pois os gritos pareciam distantes de seu quarto, e a luz do corredor permanecia apagada.

  Mas Emily não conseguia entender o que falavam, e apesar do medo sua curiosidade sempre falou mais alto. Ela só se deu conta do que estava fazendo quando já estava na metade do corredor escuro, em frente a porta do quarto de seus pais. Os dois ainda discutiam lá dentro.

  - Ela já tem onze anos! Com certeza lidaria bem com a verdade. Emily é uma menina muito inteligente pra idade que tem, além de ser bem compreensível. Ela precisa saber. - Esbravejou Frederic, acompanhado do som de seus passos que andavam de um lado ao outro do quarto.

  - Mas querido. - Um suspiro cansado de Rose, sua voz estava baixa e com certeza era por causa da filha que ela pensava estar dormindo no fim do corredor. - Está tudo indo tão bem, não quero que Emily fique preocupada com isso. Vamos deixar para contar daqui a alguns anos.a

  - Henry pediu para que contássemos o quanto antes. Para ela já estar preparada quando acontecer. - Respondeu Frederic seriamente, e Emily quase tropeçou para trás no corredor.

  Henry... Emily já ouvira aquele nome em várias das histórias contadas por sua mãe. Henry Solarian era o bruxo mais forte de Eclantis - a terra fictícia onde se passava as histórias mágicas que seus pais contavam-, ele era o herói da maioria delas além de ser amado por todos.

  Mas não podia ser ele, era bobagem e Emily sabia disso. Deveriam haver tantos Henry's no mundo, que por um segundo Emily quis rir de si mesma por pensar na possibilidade de ser o homem de uma história de fantasia.

  - Preparada? - A voz de Rose parecia embargada como se segurasse o choro. Emily engoliu em seco. - Preparada para que? Ouvir que não somos seus pais biológicos e que Henry Solarian nos pediu para cuidar dela até que ele retornasse?

  E então o silêncio veio, e logo depois um suspiro.

  Emily se sentou tremendo no chão com as costas contra a parede e pensou no que tinha acabado de ouvir. As últimas palavras de sua mãe não faziam sentido. Será que aquilo fazia parte da história da noite? Será que seus pais sabiam que ela estava ouvindo e fizeram isso só para ela se sentir parte das histórias de fantasia? Seria aquilo uma encenação?

  Ela já tinha onze anos, sabia que nada daquilo era real. Porque eles estavam fazendo isso? Não era legal, nem engraçado. Então para confirmar sua teoria Emily voltou para perto da porta e olhou através da fechadura.

  O quarto estava escuro, a única iluminação era o abajur da cômoda em que a mãe de Emily parecia procurar por algo. Quando Rose se virou, Emily viu que havia algo em suas mãos. Algo pequeno e dourado, e seja o que quer que fosse aquilo, fez com que a luz de abajur piscasse quando se aproximou.

  - Me desculpe. - Frederic disse para Rose em algum lugar do quarto que Emily não conseguia ver. Com a voz carregada de emoção. - Eu sei o quanto isso vai ser difícil.

  Emily viu sua mãe largar o objeto dourado em cima da cômoda e caminhar para fora de sua visão da fechadura.

  - Fico feliz por não ter que passar por isso sozinha. - Respondeu Rose. Emily apoiou a mão no chão para não perder o equilíbrio. - Contaremos a ela quando for a hora certa.

  Emily sentiu as pernas enfraquecer com as palavras, mas ela não caiu, não podia fazer barulho. Seus olhos ainda estavam fixos no pequeno objeto dourado na cômoda, que fazia o abajur ao lado dele piscar continuamente de uma forma pouco perceptível.

  Ela queria ver o que era aquilo, mas ainda estava escuro. Se pudesse deduzir diria que é uma chave. Ela queria entrar no quarto e perguntar para os pais. Mas o que diria? Que estava bisbilhotando e escutando as conversas dos pais mesmo depois de anos sendo ensinada do quanto isso era feio?

  Emily voltou ao quarto sem fazer barulho e com a mente transbordando de pensamentos. Eles não eram seus pais verdadeiros. Henry viria para buscá-la. E sua mãe guardava algo que fazia o abajur piscar, além de também guardar muitos outros segredos. Tinha alguma coisa muito grande acontecendo.

  No dia seguinte quando Emily sem se aguentar questionou os pais sobre o que tinha ouvido, teve como resposta o rosto confuso dos dois que não pareciam saber do que ela falava. E um pai totalmente paciente a dizendo que aquilo não passara de um sonho.

  E no mês seguinte não houve uma noite de histórias, nem no posterior. E muito menos nos anos que vieram a seguir.

Emily e as Sete Chaves Mágicas [Hiato]Onde histórias criam vida. Descubra agora