Capítulo DOIS

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Todo mundo já passou por uma situação na vida onde aconteceu uma coisa que jamais se esperava. Isso dá aquela sensação de não estar vivendo aquele momento, que na verdade você vai acordar no dia seguinte e tudo aquilo não vai ter passado de um sonho — ou pesadelo, dependendo do caso.
Mas aí o amanhã chega e absolutamente nada mudou.
A Glamour é meu sonho desde que eu descobri que ela existe. É uma empresa francesa de moda, altamente sofisticada, uma das mais influentes no mercado, que anualmente dá a chance de muitos estilistas meio que sem muitas oportunidades de trabalho — como eu — conseguirem mostrar o seu verdadeiro trabalho e brilhar em todo o mundo. Todo ano há uma competição, reality, concurso, algo do tipo, para o qual são selecionados 30 estilistas recém-formados, de países completamente diferentes, para competirem durante dois meses e conseguirem alcançar o grand finale: vencer a competição e ter o seu nome estampado em todos os países com uma grife própria patrocinada pelos maiores designers que existem. É um sonho para qualquer pessoa sonhadora, como eu.
Eu não posso negar que por mais perdedora que eu me ache, eu devo ser realmente muito talentosa para ser uma dentre os 30 escolhidos. Ou alguém lá em cima gosta muito de mim.
Estou dobrando a última camisa para guarda-la na mala, quando ouço Lohan gritar da sala de estar:
— Lu, mandaram as passagens! E... — ele faz uma pausa — Ah não!
— O que houve? — já corro desesperada até ele, típico de uma pessoa completamente insegura que pensa sempre que tudo vai dar errado.
Ele faz uma carinha triste.
— Não vamos sentar juntos!
Fecho os olhos em direção aos céus e respiro aliviada. Depois acerto Lohan com a minha camisa, que antes estava perfeitamente dobrada.
— Não me assusta assim de novo! — reclamo.
— Como assim você não acha isso um absurdo? — ele pergunta, completamente indignado.
Reviro os olhos e volto à missão da mala.
— Sabe o que eu estava pensando? — a voz de Lohan invade novamente meus ouvidos.
— Que você vai fazer a festa com os franceses?
Ele aparece na porta do quarto e encosta na parede, pensativo.
— Na verdade não. É que... Sabe, isso é um passo importante na sua vida...
— Nossa vida — corrijo.
Hoje faz uma semana desde o dia em que finalmente eu dei mais um passo em direção ao meu sonho. Meu sonho e de Lohan, no caso, mesmo que eu não goste da ideia dele ser só meu assessor, pois para mim, ele merece a Glamour tanto quanto eu — se é que eu mereço. Mas ele sempre me disse que por mais que tenha cursado Moda, ele nunca pensou em algo só dele, mas sim em algo conjunto, e por mais que isso pareça um sonho pequeno, para ele é tudo o que mais deseja. Eu não faço questão de brilhar sozinha e, embora eu ache que Lohan devesse, também concordo que funcionamos melhor juntos. Mas, mesmo assim, por mais que seja o meu nome que esteja oficialmente participando da Glamour, o trabalho e o sonho é de nós dois. Amanhã, nesse mesmo horário, estaremos voando em direção à Paris.
— Sim, sim — ele confirma — Mas é de você que eu quero falar..
— Sem enrolações, Lohan.
— É que... Lu, você não acha que devia falar com a sua mãe?
Ah, não. O assunto.
— Não sei, de verdade — respondo sinceramente, enquanto luto com o zíper da minha mala — Minha mãe é um assunto complicado pra mim.
— Eu sei, Lu. Mas é porque eu também sei que você vai querer visitar seus avós, que são apaixonados por você, e vai ser estranho quando eles contarem à Martha que a filha dela está por lá e não contou nada à mãe...
Definitivamente, eu e minha mãe não temos uma relação de mãe e filha desde os meus 8 anos de idade. Ela, inclusive, tem origem francesa, morou em Paris com meus avós até quando conheceu meu pai, que tinha ido à França para um intercâmbio. Então, eles tiveram uma linda história de amor, eu fui feita em solo francês e viajei para o Rio, ainda na barriga dela, e quando cheguei aqui resolvi que estava na hora de sair daquele útero apertado, porque o que eu queria mesmo era ser carioca.
Fomos uma família linda até que toda a desgraça aconteceu. E desde então, guardo uma mágoa enorme que eu não consigo libertar.
— Eu vou pensar nisso — digo.
Lohan se aproxima de mim e segura minhas duas mãos, em um gesto muito protetor.
— Lu, você tem que fazer aquilo que seu coração mandar — ele fala de uma forma serena, o que é até estranho já que ele sempre está gritando — Mas não esqueça que ela é sua mãe.
Antes que eu diga qualquer coisa, Lohan me puxa para um abraço. Envolvo meus braços na cintura dele e aproveito os segundos de paz enquanto estou acolhida pelo melhor abraço do mundo.
— Bem... — ele se afasta — Eu vou visitar a minha família para me despedir. Promete ficar bem?
— Claro — respondo, tentando não demonstrar muito sentimentalismo na minha voz.
Lohan dá um beijo na minha testa e sai. E eu fico sozinha com a minha mala e meus pensamentos.


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⏰ Última atualização: Jun 22, 2019 ⏰

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