BRUNA

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Bruna dizia que eu não era o mesmo que ela conheceu anos atrás. Estava mais triste, mais reservado, mais desanimado com tudo que vinha acontecendo. Ela dizia não me reconhecer mais e que eu era diferente. Ao final dessa frase já deixei de ser quem eu era também. Normal, as pessoas mudam. Bruna estava deitada em sua cama, sem roupa, eu fazia carinho em suas pernas e ela me contava sobre sua semana. Com as costas encostadas na parede, a ouvia atento enquanto fumava um cigarro.

- Eu não aguento mais essa rotina de trabalho, faculdade, casa e de final de semana ter que ficar saindo, ver meus amigos, sair com a família. – Bruna me disse enquanto se ajeitava para sentar do meu lado. – Às vezes eu só quero ficar em casa, de perna pro ar o mês todo, sem ter que me preocupar com muita coisa.

Eu fumava um cigarro. Tínhamos deixado a janela aberta para a fumaça sair. O dia lá fora estava cinza e frio e a pouca luz que entrava pela janela tocava a pele branca de Bruna fazendo-a brilhar.

- Eu perdi a vontade das coisas, me sinto meio para baixo essa semana. – Ela seguiu dizendo. – Antes eu amava ir pra balada e voltar no dia seguinte, gostava de ler meus livros, passear com a Lora [a cachorra] pelo bairro. Agora eu só vejo tudo pelo Instagram: o pessoal se divertindo, meus amigos na balada, minha família almoçando junto, minha afilhada dançando e essas coisas. Quando participo, sinto que sou obrigada a estar ali, mas eu não queria.

Tirou o cigarro da minha mão, levantou da cama e seguiu em direção a janela. Fiquei encarando seu corpo nu de costas para mim. Bruna era completamente linda. Continuou falando.

- Você não é mais o mesmo. Antes você não fumava, dava mais risada, contava piadas a todo instante. Estamos aqui há quanto tempo, quatro horas!? Não ouvi uma piada sua sequer. – Parou de falar para dar um longo trago no cigarro. – Mas eu entendo, essa tristeza toma conta mesmo. Outro dia cheguei em casa e vim direto para meu quarto, estava sem fome, não sai de lá para nada, só para ir ao banheiro. Essa rotina ainda vai nos matar.

Lembrei que tinha que tomar meus remédios. Levantei da cama, abri o zíper pequeno da mochila, tirei as caixas do remédios, coloquei um de cada na mão, depois na boca e engoli, sem precisar de um copo d'água. Fui até a janela, abracei Bruna, coloquei a cabeça em seu ombro e olhei o movimento da rua. No fim das contas, ela estava certa, eu não era mais o mesmo.

Partes: qualquer porção de um todoWhere stories live. Discover now