𝓚𝓲𝓼𝓼 𝓴𝓲𝓼𝓼, 𝓯𝓪𝓵𝓵 𝓲𝓷 𝓵𝓸𝓿𝓮

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Você roubou Haruhi de Tamaki naquela dança, a guiou e rodopiou por modestos segundos, Kyouya, e, de verdade, não se viu culpado, porque em algum lugar dentro de si também se sentiu roubado pelo loiro.
Para os de fora parecia uma pequena provocação entre amigos, mas você sabia — e se perguntava se Tamaki também sabia, afinal, ele não é realmente tão idiota quanto você mesmo diz — que aquilo era uma demonstração de um desejo internalizado que nunca se tornaria realidade. Então você a jogou nos braços de Tamaki, abrindo mão — literalmente — daquela única garota que o fez sentir-se como algo além do terceiro filho, trancafiando assim o sentimento mais puro que seu coração calculista já sentiu.
Kyouya, você fez o certo, sabia disso, assim como os membros que tiveram a infelicidade de reparar. A verdade era que Haruhi amava Tamaki, mesmo que não percebesse agora, mas estava lá, e logo ela entenderia o que o loiro descobrira há pouco: que existia muito mais do que a relação protetora do suposto “pai e filha”.
Você não saberia dizer ao certo quando aquela moleca despertou a sua curiosidade, afinal, você raramente dividia sua atenção dos trabalhos do clube com outra coisa — alguém, no caso — Mas o que importa é que aconteceu, talvez seja por Haruhi ser de uma classe social tão diferente da sua, talvez pela beleza que você aprendera a admirar por baixo daquele terno, quem sabe ainda a coragem e determinação que irradiavam daqueles olhos castanhos que você precisava admitir ser o que mais gostava naquele rosto delicado, porém, tinha quase certeza ser seu hábito observador — este que tanto lembrava você mesmo — Ela realmente tinha a capacidade de desatar couraças e ver através do manto de luxo e poder que todos naquele clube mantinham, e fazia isso sem o menor esforço.
No começo a considerou um meio termo entre estorvo, mascote do clube de anfitriões e figura inusitadamente promissora. Não eram apenas os lucros que sua personalidade natural carregava, era ela como um todo. Haruhi era impressionante, e o fato de a própria não se dar conta só tornava tudo melhor. Mas não a julgue, Kyouya, naquela época ela ainda era muito inocente para reparar que seu charme era justamente a simplicidade que nunca seria encontrada em qualquer outro lugar na escola.
Então você também percebeu Tamaki, mais que isso, notou que — de um jeito muito menos discreto e delicado — seu amigo também reparara neste conjunto inédito que era Haruhi. Era como se pudesse ler o futuro, porque mesmo no início, com toda a arrogância e reflexos automáticos de flerte do líder para com todo ser do sexo oposto, você sabia que ali iniciava um sentimento diferente. Antes mesmo dos outros membros, você sabia que algo maior e mais bonito não demoraria a surgir nele. E sim, você acertou. Só que suas previsões não incluíam você mesmo, Kyouya-kun. É claro que você se sentia atraído pela menina, afinal, ela era única de um jeito bem peculiar, e você precisava de algo que agitasse sua vida, mais especificamente alguém que o fizesse reconsiderar ideias tão internalizadas em você.
E ela era, é, até agora, a única capaz de fazê-lo rever projetos e perspectivas sólidas em sua mente. E, com um pouco de indelicadeza de sua parte, precisa admitir que qualquer que consiga o fazer ponderar algo já estabelecido merece o mínimo de crédito.
Você foi tomando gosto em participar como mero espectador, ver desde os mimos dela por Honey-sempai até os bons problemas que ela trazia aos gêmeos, e, é claro, você se divertia com os inconstantes excessos de humor do líder e suas ainda piores recaídas de ciúmes. Essa última parte era divertida até você constatar, antes mesmo que os dois envolvidos, que havia mesmo a possibilidade de Haruhi desenvolver um tipo diferente de afeto pelo instável emocional loiro. E a ideia o incomodou, incomodou mais ainda ver isso se tornando realidade, né, Kyouya? Os surtos de raiva de um para o outro quando um fazia algo imprudente, as lágrimas de desespero de Tamaki toda vez que alguém suspeitava do verdadeiro sexo de Haruhi e ainda todas as vezes que a garota o afastava de um abraço apertado e dramático dizendo “Está tudo sob controle”. Em cada demonstração de carinho e medo de perder, demonstrações que vinham ficando mais frequentes e você já sabia que não era apenas o vaso quebrado que a mantinha ali. 
Não dava mais para negar, eles não eram tão opostos assim quanto você declarou no inicio. Porque a água se tornaria vinho se precisasse, e o vinho mais ia rendendo-se a transformação em simples água. Era perceptível o quanto você via dele nela, e o quanto ele se misturava ao mundo “plebeu” não para aprender a suposta cultura, mas sim porque queria saber mais sobre ela. Mais, mais e mais. E Haruhi, bom, ela se simpatizou por aquelas crescentes manifestações que destoavam do fútil comportamento do loiro quando estava servindo. Ela foi se apaixonando — inconscientemente.
E a você, Kyouya, não era mais uma opção observar — era tudo que lhe restara.
Você não procurou isso, mas começou a entender na própria pele porque Tamaki passara a amar Haruhi.
Muito provavelmente foi naquele passeio ao shopping de vocês, uma espécie de encontro?
Você sabia que estava sendo desagradável e rude, mas o que fazer? Era sua criação. Você esperava que pelo menos ali ela fosse agir como qualquer garota e se chatear por seu comportamento, mas então não seria Haruhi. Ela reagiu a sua explicação de “Porque não tenho ninguém a quem impressionar” como se já esperasse.
Todavia, naquela noite, quando foi dormir, você entendeu que mostrara aquela garota sua verdadeira personalidade. Alguém frio e que a inteligência estava voltada apenas para os próprios interesses, bem diferente da aura intelectualmente nobre que mostra no clube de anfitriões. E ela o aceitou, sem julgamentos. Mais que isso, Haruhi o fez perceber que existe bondade em você. Bondade genuína, sem interesse.
Você gosta de estar com ela, sem personalidade forçada, sem fingimentos. E isso, Kyouya, é refrescante. Ela o faz afrouxar os nós e ir mais devagar.
Então, podemos dizer que você passou a encontrar a si mesmo nela, todas as suas resposta estavam em um corpo magro e bem feminino. 
Kyouya, você nunca invejou tanto Tamaki quanto quando percebeu isso. Queria ter nascido com os privilégios do loiro e suas vantagens, mas descobriu que trocaria todo o status e fortuna para ter só um pouco da crescente paixão que Haruhi cultivava pelo dono dos olhos arroxeados.
Poderíamos terminar a história dizendo que você decidiu lutar pela garota que descobriu amar, mas essa não seria a verdade. Porque você é incapaz de ferir um amigo, e não importa o quão arrogante, ingênuo e mimado Tamaki seja, ele ainda é aquele que lhe estendeu a mão primeiro, sim, não foi Haruhi.
Conhece de trás para frente o histórico do loiro, por isso sabe que por baixo de todo esse amor próprio existe uma criança insegura que sente falta da mãe. Alguém que mesmo tendo viajado o mundo todo recém descobriu que sua vida não se limita a um destino. Ele precisava de Haruhi em sua jornada, assim como ela ainda não percebeu que precisa dele.
Por isso você abriu mão de lutar por sua felicidade para que Tamaki criasse coragem de oficializar a sua.
Você é nobre, Kyouya, e pensa mais nos outros do que acha.
Haruhi sabe disso.
E, naqueles breves segundos de dança, você relembrou da viagem à praia, mais especificamente o momento em que estiveram no quarto a sós. Aquele foi o primeiro momento em que quis beijá-la, o primeiro de muitos. Mas não o fez, porque não queria que fosse assim, com os pensamentos dela em outro. Você também lembra dos olhos femininos implacáveis, ela o conhecia o suficiente para saber que não faria nada que não quisesse.
Haruhi o desarmava por completo, de um jeito que até o assustava, Kyouya.
Então você a jogou para Tamaki, tanto na praia quanto na dança, segurando-se para não eternizá-la em seus braços. Queria ser aquele em quem ela também descobriria muitas de suas questões, queria ser o seu alguém especial. Mas esse papel não cabe a você, Kyouya.
Até porque não é uma escolha, você é inteligente demais para negar que é inútil lutar. A verdade é que mesmo que não existam almas gêmeas algumas pessoas simplesmente se completam. E você não é capaz de se intrometer em algo tão belo quanto o amor dos dois. 
Você não espera encontrar em outra garota o que viu nela, pelo menos não na Ouran. Mas tudo bem, você vai superar, mesmo que doa — doa muito — ser a parte descartada do triângulo amoroso.
Ajeite os óculos e feche-se em si mesmo, tomando cuidado para não se permitir ser desvendado novamente.

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ᴇᴍ sᴇᴜ ᴄᴏʀᴀçãᴏ, ᴋʏᴏᴜʏᴀOnde histórias criam vida. Descubra agora