Eu te perdoo. Sim. Em minha grandiosidade, eu me faço te perdoar. E me perdoo também. Por ser tão assim, sentir demais. Parece-me que a geração que se faz lá fora resiste à intensidade e tem banalizado sentimentos e sensações. Mas eu, eu não quero ser assim, dura como uma pedra. Não quero deixar de lado a minha essência para que eu possa me passar a ser a compreendida; jamais quero participar desse sistema e dessa convenção. E é por isso que te perdoo - porque respeito quem sou. E, por respeitar quem eu sou, respeito quem tu és. Seja. Porque sou tão assim, intensa, a ponto de não odiar ninguém, nem mesmo quem tanto me fez mal. Quem tanto me destruiu por dentro. Tudo sozinha. Porque creio eu que às vezes sinto tudo assim, sozinha. É que preciso encontrar o equilíbrio dessa intensidade, mas não sei em quê ou em quem. E isso me machuca às vezes, rompe o fel.

Não quero ser só, na medida em que sei ser só. E tenho sido. Muda, intensa e às vezes severa. É que falta o que me prende diante de uma liberdade sem nome e que não sei se sinto pela raiz. Quero me infiltrar no mais fundo da terra. Tudo o que sou fez quem tu és e isso foi uma idealização minha a partir do meu platonismo. E isso levou um pedaço que me faz querer recomeçar do zero até eu me curar disso tudo. Ou acordar um dia desses esquecida, sem lembranças. Porque a alma é uma coisa magnífica. Cedo ou tarde, repele o que faz mal para o inconsciente e vive-se tudo em sonhos. Às vezes é melhor sofrer com os pesadelos.

Estou captando a minha essência no sentindo em que reconheço meus possíveis erros e particularidades. Isso é coisa de quem é intenso, que não vive a vida por viver. Mas é que a vida lá fora é assim. Vive-se por viver. Por metas, nunca por planos. Nada a dois, só a um. E eu me recluo numa bolha minha. Não fure esta bolha - por enquanto. É que sei que a raiz é meu ponto final, meu aconchego. Preciso chegar na raiz da raiz do mais profundo de mim para só então poder dizer de verdade sobre o equilíbrio do vai-permanece que fica. Sentir como me sinto é a real verdade? Não é isso que quero. Quem pergunta tem dúvidas - e eu, eu quero ter a certeza, como nunca. Ter a certeza de todas as coisas é a melhor forma de considerar a validez da vida. Nunca duas opções, somente uma. A certeza.

Pensando, o melhor que tenho a fazer é viver. Mas como viver com o fato de que tudo o que quis há anos deu tanto errado? Preciso eu me dar um tempo e esperar sarar de novo? Depois de um longo período reconstruindo-me, reconhecendo-me e isso me acontece? O mundo real dói. Viver tem doído. Expec- e perspectivas derrubam a força de qualquer homem forte. Como Sansão ao ter seus cabelos cortados por Dalila - a vida é uma eterna Dalila. A vida lá fora é uma mulher ingrata e hipócrita.

Tudo tem um princípio, assim como tudo parece ter um fim. O que complica é que não se sabe quando se começa ou quando se termina. O que temos são algumas provas que às vezes se provam no de repente da vida, ou que às vezes estavam ali o tempo inteiro e ninguém viu. A vida me parece um eterno exame, aliás. Um exame de resistência.

O tempo todo se quer provar alguma coisa e, no cansaço do provar, o corpo padece e passa a vegetar em um determinado momento. Tudo começa a se esgotar e a mesmice, a rasidade e a brevidade da liquidez das coisas cansam! Maldito Bauman...

A vida adulta me parece uma permanência. E vai, permanece, ficando, de um jeito que nada muda. É como um ser amorfo, sem vida. O tempo todo sem deslocamento e sem força. É a mesma rotina de sempre. O mesmo trabalho ou a ausência dele, o mesmo trajeto, o mesmo surgir de problemas ontem e hoje, o mesmo almoço, o mesmo jantar. É que eu já conheço tudo. Há algo de novo ao meu alcance? Ou tenho que fazer de minhas tripas o coração para que eu possa ter novidades?

Não gosto do repouso. Não gosto da estagnação. É um período difícil em que nada de relevante acontece. E a gente fica esperando por coisas que não vem. E há quem diga que o melhor do momento é refletir até que coisas novas surgem... Não sou um buda. Ou vou me tornar um? É que sempre fui e me acostumei de viver uma coisa após a outra. Mas é que parece que isso parou ou se cansou de alguma forma e o que tenho mantido está indo embora. E só consigo ver meu eu em mim mesmo, completamente completo na incompletude do viver. Será que me tornei tão suficiente a ponto da minha vida tolerar a mim mesmo? O mundo me parece às vezes tão pouco, mesmo eu tendo a noção de toda sua complexidade. Disseram-me que viver é perigoso. Agora, parece-me que é apenas entediante. O mundo mudou ou eu mudei demais? Questionando-me, só consigo ver além do meu redor. É como se eu estivesse presa em mim mesma e jamais pudesse ser libertada de novo. E o que vejo é uma utopia - distante, impossível de ser sentida e apalpada. Confuso.

Bastou-me choques diversos além de minha pessoa para que eu me sentisse assim. Levantar da cama e sentir o mundo é impossível. Vivo na dormência e nada mais faz sentido. Não há aqui palavras mágicas que possam mudar o formato do que se é. Tudo o que se foi me parecia bem menos complexo. Mas por que se foi? É que o estado neutro de tudo é a dormência? O amor próprio é isso mesmo, a ponto de não haver mais ninguém? Complicado. É como se eu tivesse com saudade do sofrer. Tudo parecia tão claro a ponto de eu só saber lidar com a obscuridade, nunca com o abstrato. Agora, nenhum dos dois. Dormência e repouso.

Não sei como ainda consigo redigir em linhas brancas o que sinto. Porque não sinto nada. Não sinto sair. E o sentir era algo complexo e me completava. Perdi minha essência.

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