terceiro

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Dahyun revirava-se de um lado para o outro na cadeira, diversos pensamentos passando-se em sua cabeça, cada um com seu próprio motivo, necessidade e causa. Era uma diversidade tão grande, que a deixava tensa. Precisava concentrar-se na aula, mas antes, precisava organizar-se. Como faria aquilo, em tão pouco tempo e habilidade?

Cada palavra que escapava-lhe na voz interna, misturada aos barulhos do mundo fora de seu universo estranho, lhe faziam dores de cabeça piores que as que tinha no serviço após a escola. Reconhecer seus instintos não era seu forte, principalmente quando sua mente lhe pregava a pior peça de todas: misturar seus sentimentos com a razão.

Por exemplo: após ter tido a péssima descoberta de qual destino a sua tão sonhada camiseta acabara tendo, e acabado discutido com a nova dona dela – de acordo com o capitalismo –, Dahyun não conseguia relacionar mais nenhuma lembrança à sua dor do dia anterior, do que a beleza exuberante da loira, em como cada palavra que saía de sua boca soava adorável e inocente.

Ela não aparentava alguma culpa naquele incidente. Tudo foi causa de um surto consumista de Dahyun. Isso é fato. Os olhos da loira não poderiam enganar. Ela era inocente. Bela e inocente. O típico clichê de garota privilegiada neste mundo injusto e cheio de lamúrias. Qual seria o seu papel na sociedade além disto? Teria ela algum propósito em sua miséria de vida? Saberia dizer os sentidos e separar o certo do errado? Tudo em seu olhar dizia futuro. Um futuro bom. Algo leve, compreendedor...

Dahyun não deveria ter a empurrado. Tampouco cair fora sem pedir seu telefone.

"Oh! Céus! O que eu estou pensando?" Lamentou Dahyun. "Nem a droga de um telefone eu tenho."

Quando as aulas acabaram, os passos seguiram-se vagarosos, exigindo a paciência pela parte de quem os movia, e quem a esperava no fim do túnel. Foram quantos dias desperdiçados no meio da correria? Os passos estariam mais longos agora, ou apenas feitos de maneira direita? Ao longe, a garota desejava que ninguém a estivesse esperando. Seria tão fácil acabar o dia sem preocupações naquela vez.

O trabalho ficava no centro da cidade. Uma loja de roupas e brechó, conhecida por suas vendas de roupas elegantes, clientes populares e atendentes nem um pouco educados. O único que salvava-se era o gerente. Coitados, Dahyun pensava, eles nem sabiam metade dos podres que aquele gerente era por dentro, debaixo do bigodinho fino e comprido.

Quando procurava por um emprego, após ter visto a causa que a levaria à escravidão concreta, Dahyun achou a loja elegante em primeira vista. Chamou-lhe a atenção um boné vermelho na vitrine, na coleção da estação do verão. Era um dia quente. Quente como todos os outros que se seguiam. A temporada matava sem piedade, ajudando a escorrer o suor dos trabalhadores, todos focados no seu objetivo. Dahyun não quisera entrar na loja, mas foi mais forte que seus sentidos. Culpa do boné.

Perguntaram se desejava alguma coisa. Respondeu: "Um emprego." Pediram que esperasse. O gerente a avaliou. "Bonita e educada... Está contratada." Tão fácil, mal imaginava a dificuldade que enfrentaria.

Não era a toa que os atendentes fossem mal educados. Eram todos tratados com escória. Carregavam igualmente trabalho demais e pesado. O tempo de almoço era curto e não se podia levar comida, tinha de se comprar. O salário que ganhavam era uma miséria, e só não pediam demissão porque o chefe os bajulava, ou sujava seu currículo com mentiras. Era um jogo de trocas. Garanto sua carreira se você me servir por dois anos. Com Dahyun, foi pura exploração. A tratavam com nojo. Apelidaram-na de nomes feios e os funcionários xingavam-na por pequenos erros. Fortemente resistia, por objetivo à sua camiseta e a comida dentro de casa. Mesmo o tóxico prendendo sua respiração.

Nunca entendera a lógica de governo em seu país injusto. Diziam que o mundo evoluía constantemente, que nele, seguia-se uma linha de melhora para cada cidadão, de acordo com o que ele merecia graças sua parte na sociedade. Cada um alimentava-se pelo outro para obter a mesma coisa: dignidade. Sua avó a aconselhava sobre, mas Dahyun não queria essa dignidade. Ela queria comida fresca, saúde e uma camiseta do Queen, agora sendo vestida por uma garota bonita e... Uau!

Não acreditaria se dissesse, mas achava estar apaixonada.

Olhou o horizonte. Faltava pouco para chegar no trabalho. Valeria a pena, agora que sua camiseta fora comprada? Caberia resistir os maus tratos à sua pessoa, por apenas diferença profissional? Ela queria um futuro melhor?

Levantou a cabeça para o céu. Sentiu um calor invadir-lhe o rosto, com um carinho do vento. Era seu porto seguro. Ela é uma campeã.

Deu passos decididos até a loja, entrando cheia de força, batendo no caixa e chamando o gerente. Quando o velho apareceu, irritado pelo atraso de dez segundos, Dahyun bateu o pé, gritando:

— Eu me demito!

Todos olharam-na perplexa na loja, alguns clientes sem compreender a situação. Dahyun sorriu, aliviada em seu espírito, e repetiu, mais baixo e calmo desta vez:

— Eu me demito, senhor gerente! — Deu um pulinho, correndo fora da loja. — Até nunca mais! — Despediu-se, e correu para longe. Queria sua casa, seus discos do Queen, sua verdadeira natureza e sua vida de volta. Do jeito que estava, e do jeito que ela gostava.

vitrine de uma rainha ☆ twiceOnde histórias criam vida. Descubra agora