demônios solitários

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Por Malu Souza

Já era de tarde,nuvens pesadas
cobriam o céu negro de meados de Dezembro,época fria e sem cores.O relógio de pêndulo,disposto a frente da lareira gótica fazia seu tique taque familiar,tudo naquela casa sombria me lembrava ela.

Respirando rápido,a cada batida daquele maldito pêndulo,um pássaro infeliz soltava grunhidos fantasmagóricos na planície caótica que se estendia além da minha moradia.Levanto-me,não suporto nada disso,só de olhar para a imensidão do lar,me passa um fio de medo pela espinha,um lugar outrora tão cheio de vida,hoje repleto de filhos da morte.Sou o único habitante dessa mansão pútrida,minha esposa não suportou as trevas que aqui pairam e se matou,deixando-me de bandeija para o banquete das criaturas que fazem pousada nesse lugar infernal.A cada batida do relógio mais rápido ficam as passadas do meu coração..."Tique taque",não acho outra saída se não ir embora,confesso-lhes que isso se passa a cada instante em minha cabeça,porém falta-me coragem de sair as pressas dessa casa maldita,corro o risco de carregar o infortúnio comigo.Penso também em fazer como minha finada esposa,amarrar um lençol no lustre da sala e por um basta nessa tormenta incessante...mais uma vez me falta coragem de faze-lo.

O velho relógio bate outra vez,meia noite,levanto-me do pesadelo porém tenho a sensação de ainda estar sonhando,enquanto caminho pelos corredores gelados e escuros sinto mais que nunca a presença de algo inexplicável,o medo invade minha alma e toma controle de meu corpo,num gesto desesperado entro no banheiro e me tranco...tamanho foi o susto ao me deparar com aquele rosto magro e extremamente pálido,cujo as olheiras eram de um roxo quase ameixa...não se assustem,essa imagem torpe e desfigurada não faz parte do acervo grotesco das trevas dessa casa,esse rosto inumano é meu,minha face,corroída por noites e dias pesarosos nesse maldito inferno.Não acho outra solução,não exitem mais esperanças,vou morrer...mais antes levo tudo quanto que for mal comigo,quaisquer que sejam os demônios desse lugar,vão ficar comigo,fechados numa cripta,envoltos de terra.

Saio do banheiro,vou a passos arrastados até a cozinha,pego a imagem de nossa senhora,sem reparar que desta mesma brotam lágrimas de sangue de seus olhos negros.Procuro furiosamente a garrafa de querosene embaixo da pia.Passados alguns minutos,arranco do bolso de uma paletó um isqueiro...

Embebedo todo o terreno,mesmo sendo de madrugada consigo ver brilhar o líquido inflamável em cada móvel fino.Em seguida me banho com o mesmo líquido,ainda segurando a imagem de nossa senhora,peço perdão pela covardia...acendo o isqueiro,de uma vez por todas levo comigo de volta para o inferno todas as bestas.Em meio as chamas juro ouvir  gritos e lamentos,nada me soou tão gratificante.Espero lentamente a morte.

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