Uma visita

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A noite não me acolhe, é como se qualquer um que passasse na rua, pudesse me descobrir. O pacote era bem disfarçado, mas qualquer policial perceberia.
Eu morava perto dele, mas não tanto, ninguém normal poderia morar perto de tal personalidade.
Uma visitinha chamaria muita atenção. Abri um largo sorriso.
Era estranho como a casa se comportava, era moderna mas havia uma melancolia clássica pairando sobre todo o ambiente. Era o destino me chamando.
Como se fosse o meu propósito.
Deixo a arma nos arbustos, e tento entrar pela frente. Nada.
Corro para os fundos, onde havia a cozinha, e tento abrir a porta.
Ela abre com um rangido tagarela, e me deixa entrar.
A princípio tudo estava apagado. Era quase madrugada e havia uma pouca iluminação natural.
Chego na sala, encontro alguém no chão.
Impossível! Alguém fez o que eu devia fazer! Eu começo a girar, e a quase gritar.
Mas a crise passa, e eu checo se ele respirava.
Ele respirava, quase morto. Tentativa de overdose.
O momento tão esperado chegou. Só eu e ele, pela primeira vez.
Cambaleei pelos fundos e fui até os arbustos para buscar a arma. Ela servia bem, completava meu ser.
Sem muita cerimônia, procurei o homem pela sala parcialmente escura.
Senti pisar em algo.
Era sua mão.
Olhei para baixo, e com satisfação apontei para a cabeça do homem com o rifle.
Era uma cabeleira diferente das da televisão. Ele era diferente. Patético. Decepcionante.
Ele não reagia, e isso era estranhamente engraçado de ver. Um dia ele cantava, falava e bebia. No outro, estava apenas inanimado.
Eu virei ele. Vi seu rosto.
Uma expressão ridícula enrijecida estava impregnada nele.
Apontei novamente o rifle.
O sol ia nascendo.
"Quando as luzes se apagam."
Aproximei.
"Nos entretenha."
Apertei o cano na cabeça.
Era hora de dizer adeus.
Minhas mãos suadas reajustaram na arma.
Coloquei meu dedo no gatilho.
Apertei.
Fechei os olhos.
Quando abri, vi rapidamente algo grotesco. Fechei os olhos. Abri novamente.
Nada tinha acontecido. Ele ainda estava ali.
Maldita arma do papai.
Me sentei com a arma nas mãos. Eu precisava sair dali, era hora de desistir.
Que absurdo. Eu estava quase matando alguém.
Me levantei rapidamente com o rifle, e olhei para baixo pra desviar de Cobain.
Foi quando eu vi. Uma luz no fim do túnel.
Uma espingarda. Pareceu um presente dos deuses.
Eu soltei o rifle que não funcionava. Joguei para um canto qualquer.
Peguei a espingarda como uma criança ganhando um presente de natal.
Estava com munição.
Coloquei o dedo no gatilho.
Fiquei olhando para aquele ser patético mais uma vez.
Eu seria famoso. Eu seria o sucessor.
Apertei o gatilho, um pouco sem pretensão.
Não ouvi o barulho, foi muito rápido. Mas alguém ouviu. Eu esperava que sim.
Olhei para baixo.
Não havia mais um ser humano ali.
Era só uma coisa. Uma coisa que me fez sentir muito mal.
Ele estava irreconhecível. Aquilo estava irreconhecível.
Caí para trás, e desmaiei.
Alguém chegaria. E logo.

Acordei em quase um segundo.

Era tudo um sonho. Eu estava em casa.

Era bom estar em casa...

O cômodo foi se dissolvendo...

Eu fui parar novamente na casa de Kurt. Olhei pras minhas mãos. Havia sangue.

O corpo estava muito perto de mim. Ele estava quase me abraçando.
Decidi retribuir. Eu levantei ele e dei um abraço caloroso.
Não me importava com o sangue.
Comecei a chorar. Era a única chance de fazer aquilo.
Ele era pesado, mas eu também não me importava com isso.
Eu só queria abraçar ele e falar que estava tudo bem agora.
Segurei sua mão esquerda e dancei com ele.
Olhei ele de cima até embaixo.
Estava mais lindo do que nunca.
Quem diria que eu teria um show particular.
Era tudo mágico. Emocionante.
Eu chorava, mas ele não ligava.
Ele foi compreensivo. Amável.
Dancei por horas. Eu não me importava se alguém viesse.
Depois que cansamos, nos sentamos para conversar.

"Você dança bem"

Ele não respondeu.

"Sabe... Eu sempre quis te perguntar uma coisa... Eu posso perguntar um negócio?"

Ele não disse nada, mas eu entendi o seu silêncio.

"Em seu último show... Você me viu? Eu digo... Você lembra de mim?"

Eu comecei a chorar e abracei ele novamente. Ele aceitou.

Então eu percebi o que eu tinha feito.
Eu chorei mais ainda e cobri meus olhos com as mãos ensanguentadas.
Uma mão pairou sobre o meu ombro. Era ele. Kurt queria falar alguma coisa.

"Eu não me importava com você"

Eu fiquei muito triste quando ele disse isso... Mas ele logo completou:

"Mas você me livrou dessa dor. Muito obrigado. Espero um dia podermos nos encontrar novamente.

"Eu também. Vai ser logo... Eu juro!"

"Você jura?"

"Sim! Eu juro!"

Eu abracei ele de novo, me afastei e olhei para seu rosto. Dei um beijo de despedida.

"Adeus Kurt"

Alguém bate na porta. Deixo Kurt sozinho e saio pelos fundos. Eu estava muito sujo... E carregava a espingarda em um saco.
Havia muito sangue. Mas não havia ninguém na rua. Segui o caminho até chegar a uma estrada.
Achei uma árvore.
Eu precisava encontrá-lo.
Era hora de viver feliz.
Era hora de voar.
Peguei a espingarda, coloquei entre meus joelhos.

"Quando as luzes se apagam".

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⏰ Última atualização: Jul 21, 2019 ⏰

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Sou Kurt CobainOnde histórias criam vida. Descubra agora