SIRVAT
- Escuridão... Solidão... Paz...
- Escuridão... Solidã-- Você merece queimar! Paz...
- Escuridão... Solidão... Paz-- Papai, por que eu não posso sair?
- Escurid-- A chave! Pega a chave, Michael! Solidão... Paz... - Respiração ofegante.
- CALEM-SE!! - sussurro baixo enquanto ajeito minha postura.
Abro meu olhos lentamente, ainda estou no mesmo lugar, minha prisão física que chamam de quarto. Direciono meu olhar para todas as paredes, tentando encontrar algo que me faça lembrar de algum momento bom na minha vida, algo só meu, mas sempre me frustro, as paredes brancas arranhadas só me lembram da dor.
Quantos anos já devem ter se passado? Talvez milênios, em que este quarto é meu mundo, que esta cama macia é meu refúgio, que estes lençóis azuis-- (sons de risada infantil) Me empurra no balanço? - coloco minhas mão sobre minha cabeça tentando inutilmente abafar o som que vem de dentro dela.
- Não!! Não me deixe, me perdoe, me perdoe, eu... - Deito no chão gelado do quarto, ainda com as mão sobre a cabeça, tento trazer a minha mente o mantra, mas todas as minhas tentativas são em vão, meus olhos queimam como brasas, meu coração bate aceleradamente e sinto como se tudo estivesse girando.
- Não quero ver, não... - digo, mesmo sabendo que não tenho escolha.
Abro meus olhos, no mesmo instante não estou mais em meu quarto, vejo areia, mar e muitas árvores, quase consigo sentir o cheiro da maresia, meus cabelos se movimentam junto ao vento, o som do mar é inebriante, sons tilintantes começam a ficar cada vez mais altos, vozes ao fundo gritando, urrando. Caminho por entre as pedras cinzas cobertas de musgo, a aspereza machuca meus pés, olho para onde o som está vindo, mas não consigo ver as pessoas, só ouvir o som de suas respirações.
Meus olhos se arregalam, imagens confusas aparecem, desço das pedras, estou em uma espécie de clareira, com muitas árvores, vejo diversas pessoas lutando, mas suas imagens não estão nítidas ou constantes, tento me aproximar mais, me esgueirando por detrás dos arbustos, os sons dos gritos estão cada vez mais altos, há dor e euforia em suas vozes. Sinto algo molhado tocar meus pés, baixo meu olhar lentamente até chegar ao chão, e me deparo com um corpo virado de bruços, seus cabelos são grisalhos como sua barba, que está completamente molhada por um líquido que escorre de seus lábios até a terra formando uma pequena poça em meus pés. Olhando para ele, sinto familiaridade com seu rosto, parece só um velho, mas, ao mesmo tempo, não parece completamente humano. O líquido que escorre de seus lábios tem uma cor dourada viva como ouro, misturada com vermelho, parece sangue, sangue de Deus.
Decido tocar em seu corpo, virá-lo para ver seu rosto, mas quando meus dedos tocam sua pele sou transportada para outro lugar.
Escuto passos rápidos de pés descalços, som de risadas ao fundo, e uma criança, consigo ver seus olhos, são âmbar, seus cabelos são castanho-claro bem enrolados e curtos.
- Senhor, posso brincar lá fora? - a garotinha questiona o homem jovem à sua frente, de cabelos pretos.
- Não, você sabe que não pode, quero te proteger, tem que ficar aqui - meus olhos se enchem de lágrimas.
- Eu quero sair, não quero mais ser uma garotinha especial, quero a minha mã... - antes que pudesse terminar sua frase seus globos oculares ficaram totalmente brancos, seus pernas fraquejam e ela cai, o jovem se abaixando para pegá-la, mas não consegue.
A garotinha começa a falar coisas desconexas, palavras soltas, parece cada vez mais assustada, se arrastando para trás em uma forma de fugir lentamente do que não estava lá, rapidamente suas mãos vão ao rosto, suas unhas cravam na pele, o jovem se aproxima e consegue segurá-la pelo braço. Caminho sem tirar meus olhos da cena, a cada passo que me aproximo, meu coração acelera. Quando estou a um braço de distância, a garotinha, já calma, levanta o olhar, encontrando meus olhos, seus globos oculares estão brancos, enevoados, seus cabelos estão grudados no suor do rosto, lágrimas escorrem de seus olhos.
- Pensei que depois de tanto tempo não sentiríamos mais tanta falta da mamãe - a garotinha fala como se olhasse dentro dos meus olhos. - Calma, já vai acabar - fala sorrindo.
- Meu oráculo de Delfos, você está aqui! - outro homem com vestes brancas fala sorrindo enquanto entra na sala.
- Ela teve outra crise, Zeus, não acho que aqui seja o lugar adequado para ela - responde o homem que mantém a garotinha nos braços, acalmando-a.
- Irmão, ela só precisa de tempo para treinar, ela é uma semideusa e foi escolhida pelo destino para ser a maior das Oráculos - retruca Zeus enquanto se abaixa para pegar a garotinha dos braços de seu irmão, trazendo-a para o seu colo.
Zeus está diferente, parece mais jovem, feliz, ele está a poucos centímetros, quase consigo tocá-lo sem precisar levantar os braços, a garotinha, agora no colo de Zeus, levanta a cabeça e o observa, seus olhos não estão mais enevoados, estão âmbar novamente, suas bochechas estão rosadas e molhadas de lágrimas.
- Sirvat, não precisa chorar, você em breve vai conseguir controlar as visões - arrebatada por esta lembrança, consigo voltar para o presente.
Tenho saudades de ser aquela garotinha, sinto saudades de antes, dos olhos verdes da minha mãe, do cheiro de bolo que vinha de suas mãos, sinto falta de viver, lágrimas escorrem por todo o meu rosto. Nunca se sabe que evento pode mudar sua vida completamente, um casamento, um nascimento ou um simples passeio turístico a Grécia. Minha vida mudou em Delfos, onde me tornei quem sou, onde fui escolhida pelo destino para receber o dom de ver o futuro, como poderia o destino estar tão enganado? Os gases do corpo de Python não me deram só este dom, como abriram todas as camadas da vida diante dos meus olhos, me tornaram una a todas as linhas temporais pela eternidade, ou enquanto eu viver, muitas vezes não sei sequer o que estou vendo, se é passado ou futuro, tudo se mistura.
- Não!!! - grito o mais alto que consigo.
Meus olhos queimam, vejo fumaça em toda parte, olho para cima vendo as nuvens carregadas escurecendo o céu.
- Sirvat?, O que está vendo? - escuto a voz de Zeus baixa, ecoando ao meu redor, meus braços doem como se estivessem sendo apertados fortemente.
- Fogo, vejo fogo por toda a parte, os céus estão escuros, tem muita fumaça - falo, mesmo sem saber se sou ouvida por Zeus.
- Sangue misturado com um líquido dourado está pelo chão, raios caem dos céus, vejo dois homens lutando, o líquido dourado está em uma das espadas... Hades! - respiro fundo tomando fôlego.
- Quatro adolescentes estão tentando chegar na fonte da fumaça - a imagem começa a mudar rapidamente - Deuses mortos por todos os lados, doença, velhice, medo, humanos, 20 - grito alto de dor, minha cabeça lateja cada vez mais forte, até que tudo desaparece.
Acordo escutando conversas ao meu redor, não abro meus olhos, permaneço imóvel ouvindo o que dizem, Zeus fala com Hera, Poseidon e Perséfone.
- Tem certeza de que esta visão está correta? Ela pode ter se confundido - diz Perséfone, em tom de dúvida.
- Por via das dúvidas, vamos marcar uma assembleia com todos os Deuses e decidir o que faremos - Zeus exclama rapidamente em resposta.
- Vamos esperar, nada vai nos afetar, somos Deuses!
Olá meus Caros, espero que tenham gostado do PRÓLOGO, deixem comentários do que estão achando e estrelinhas.🌟
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Os Elementares e as chaves do poder
FantasyGanância, sentimento esse que está abundantemente presente, onde os valores foram trocados e cada um se tornou Deus de si próprio. Em decorrência do descaso humano, o mundo está morrendo pouco a pouco, afetando não somente a vida na terra, mas també...