O Lobisomem e a Matinta Perera

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As pessoas diziam que essa fera vinha roer ossos pelos quintais ou comer as galinhas. Pela manhã, você poderia encontrar no meio do mato alto uma espécie de cama, onde a fera dormia ou "desvirava". O "desvirar" é o ato de se tornar humano novamente. Desde aquele episódio, todos os pesadelos de Germano eram com lobisomens. No entanto, aquilo o fascinou tanto que todos os filmes, documentários, sobre o assunto ele assistia. Talvez o receio de Clarinda e Emilie sobre essas histórias era o fato de que muitas fazem parte do imaginário popular, mas de algumas outras Germano foi testemunha ocular.

Até sua mãe, Dila, foi testemunha ocular da Matinta-Perera. Ela contou que voltava com sua irmã à noite, por um caminho muito estreito, quando ouviram um assovio muito forte, parecido com um apito. As pessoas dizem que este apito é feito com dedo de crianças. As duas correram e, quanto mais corriam, mais aquele assovio se aproximava. Na correria, Dila ficou para trás. Foi quando ela viu se projetando por cima de sua cabeça uma sombra de asas enormes, erguidas, voando. Ela as comparou às asas de um grande morcego. Logo após sua passagem, Dila ouviu mais uma vez o apito.

Outra testemunha foi Hernani, pai de Dila, era um pescador que nas horas vagas era um exímio construtor de miniaturas feitas em miriti. O miriti é um material maleável e muito usado na fabricação de miniaturas de casas, barcos, brinquedos e outros objetos. No Círio de Nazaré, as miniaturas de miriti são usadas em sinal de graças alcançadas. Hernani, vindo de madrugada da taberna, ponto de encontro do povo, chegando próximo de sua casa viu a Matinta se "desvirando". Os cabelos negros e compridos, a frente do rosto, os dedos alongados com suas unhas pretas enormes, que mais pareciam espelhos refletindo a luz fraca da noite.

Em seu estado natural, de mulher, a Matinta disse que se o velho contasse para alguém quem era ela "até no inferno ela o perseguiria". Muitas vezes, Hernani voltava muito bêbado para casa, com sua tosse costumeira que mais parecia ser seus últimos suspiros. E, entre tosses e risadas, as três filhas de Hernani o crivavam de perguntas para saber quem era aquela mulher misteriosa. Tão certo como não falhava sua tosse, também não falhava sua memória ao lembrar da promessa que ouvira. O velho morreu décadas depois e consigo levou o segredo.

Vovô Germano guardava como relíquia uma vigilenga em miniatura, feita de miriti, dada por seu avô artesão. A vigilenga era uma espécie de barco de pesca com duas velas. Muito comum em Vigia.

A derradeira história sobre a Matinta Perera que o avô de Sarah lembra foi lá no sítio da vó Lucila. Numa noite qualquer, indo à casa de fazer carvão, ouviram ao longe o conhecido assovio. Naquele momento, já estavam no meio do caminho e não tinha como voltar. Além do mais, Miquixita, a vó Lucila, tinha um temperamento explosivo. Não era à toa que ela resolvia as brigas mostrando o terçado. Existe uma regra ao se defrontar com a Matinta: você promete tabaco, fumo, e ela lhe deixa em paz. Logo pela manhã, uma senhora vem buscar o fumo. Miquixita cortou conversa, gritou em alto e bom som: "Vai te embora, ninguém tá mexendo contigo! Passa direto!". E logo mais, se escutou o assovio ao longe: "Fiiiiiiiiii...". Mulher brava era aquela Miquixita.

CONTINUA...

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