O orfanato:

64 6 0
                                    

   Eles se encontraram com a madre superiora que dirigia o orfanato. Seu nome era irmã Regina e ela era muito calma, paciente. Um doce de pessoa.
   Mas ela também era incisiva e pôs o dedo na ferida deles,perguntando porque eles decidiram adotar. E eles contaram toda a história deles pra ela desde o começo. Tudo o que Julian fez e a perda drástica do bebê deles.
   Disseram então que tendo perdido um bebê,pensaram nas crianças que perderam os pais e que independente de terem outros filhos ou não, eles queriam prover uma criancinha órfã que passou pela perda,assim como eles.
   Ela perguntou se eles eram casados e eles mostraram o documento que comprova o agendamento do casamento deles pra breve e,eles disseram que queriam dar entrada na papelada de adoção,caso houvesse uma criança, porque sabiam que essas coisas demoram demais.
-- Vocês estão procurando um bebê necessariamente?
-- Não tenho isso em mente. Gostaria de ver as crianças e ver se nos identificamos com alguma.Não me importo se ela ou ele for maiorzinho.
   Eles falaram de suas profissões e de seus rendimentos. Precisaram comprovar renda e isso não foi um problema. Ambos tinham bons salários.
   Ally ficou surpresa com um pedido que a madre lhe fez.
-- Minha filha,como você é dentista, não consideraria prestar uma caridade ao orfanato?
-- Claro,madre. Do que vocês precisam?
-- Filha, nós cuidamos de cem crianças aqui.Você não consideraria vir aqui um dia e dar uma examinada nos dentes dos nossos pequenos? Não temos condições de levar todos ao dentista. Temos crianças precisando de cuidados. Você também teria contato e as veria.Seu marido poderia vir junto e quem sabe você não gosta de alguma?
-- Farei melhor do que isso!Sou dona de uma clínica.Há outros dentistas trabalhando comigo. Vou conversar com eles e ver se eles topam fazer um mutirão aqui. Podemos vir,examinar as crianças,aplicar flúor em todas,fazer uma triagem,ver quem precisa de tratamento e marcar consulta para elas na clínica.
-- Você trataria dos meus pequenos,minha filha?
-- Sim,estou disposta a ajudar.
-- Deus te abençoe! Você vai conseguir o que almeja!Vou pôr você e seu marido em minhas orações. Conheça as crianças e veja se alguma toca o coração de vocês. Se esta conexão acontecer,damos entrada na papelada.
-- Tudo bem. Vou conversar com meus colegas e ligo para cá mais tarde ou amanhã no máximo.Viremos aqui no sábado ou no domingo. De acordo?
    Estando tudo combinado,eles se despediram e foram embora. No caminho para casa,Ally disse ao Sam:
-- Tive uma ideia melhor ainda: Vou conversar com a Bianca. Quem sabe ela não topa se juntar a nós e não examina estas crianças também? Seria bom,hein?
-- Sabe,Ally, você me surpreende. Gosto de ver como você é proativa e rapidamente põe as coisas em andamento.
-- Vou marcar uma reunião amanhã mesmo com o pessoal da clínica.
   E no dia seguinte as coisas se definiram.Dos outros cinco dentistas da clínica, três poderiam participar do mutirão. Dois tinham compromisso e não poderiam ir ao orfanato,mas depois de feita a triagem,eles  disseram que ficariam felizes em ajudar a tratar os pequenos que precisassem de tratamento. Paula iria também. Ela e Sam cuidariam da organização e de preencher as fichas dos pequenos.(Ally mandou imprimir os papéis na clínica.Eles anotariam o nome de cada criança,se ela precisava de tratamento e qual.)Depois eles fariam a triagem e marcariam as consultas. Bianca concordou em ir e chamou Ricardo(marido dela)-pra ajudar a organizar o atendimento e a Amanda,a plantonista do Hospital Geral que tratou do Sam depois do seu espancamento.O mutirão estava formado e eles combinaram de atender de 8 às 12 HS, sair para almoçar num restaurante italiano lá perto e atender das 14 às 18 HS. Depois eles combinaram de ir a uma churrascaria.
    Se encontraram todos às 7:30 HS na clínica e foram em comitiva para o orfanato. Sam e Ally levaram a Paula,os três dentistas- David,Pedro e Marcela- foram em outro carro e Bianca, Amanda(as médicas) e Ricardo(marido de Bianca) em outro.
   Chegando lá,eles pegaram uma sala para a Bianca e a Amanda trabalharem,ajudadas pelo Ricardo.
   David e Pedro ficaram em outra sala,auxiliados pela Paula e,Ally e Marcela foram auxiliadas pelo Sam.
    Foram examinando as crianças.Tinham muito trabalho pra fazer. Eram muitas crianças e eles precisavam ver todas. No caso da Bianca e da Amanda,iam consultar todos os pequenos doentes e,elas levaram muitas amostras de antibióticos, anti-inflamatórios, analgésicos,xaropes e corticóides pra cuidar deles. Assim como os dentistas,elas concordaram em acompanhar os casos que precisassem de cuidados mais extensivos. Eles eram um grupo de pessoas boas, inteligentes,focadas e bem-intencionadas. No início todos ficaram um pouco perdidos,mas depois eles entraram no ritmo e conseguiram trabalhar com eficiência. Ficaram satisfeitos com o andamento dos atendimentos. E quando pararam no horário combinado para irem almoçar,a madre Regina veio conversar com eles:
-- Deus os abençoe,meus filhos pelo serviço que estão prestando hoje. Deus é testemunha de que nós fazemos o possível para cuidar da saúde dos pequenos,mas vivemos de doação e são muitas crianças. Nem sempre conseguimos levá-las ao médico e, principalmente ao dentista. A ajuda de vocês aqui no dia de hoje é inestimável!
   Eles estavam conversando quando repararam que enquanto as crianças brincavam perto deles,havia um menino sentado quieto, sozinho,num canto.
-- Madre,quem é aquele menininho?O maior, sentado num canto,sozinho?
-- Então,meus filhos. Aquele é o Enzo. Ele e a irmã,Elis, estão em período de adaptação. Eles chegaram aqui há menos de duas semanas.Perderam os pais num acidente de carro e eles não têm parentes próximos para ficar com eles. Enzo tem quatro anos e a irmã tem dois. A menina parece não entender o que aconteceu,mas estou preocupada com ele,por ser maior e entender. Creio que ele possa desenvolver uma depressão,já que não fala,nem chora. O estado quer tentar ver se acha uma família disposta a adotar ambos. Eles são muito apegados e não gostaríamos de separá-los... Mas não será fácil achar uma alma caridosa que queira as duas crianças de uma vez.
   Ally e Sam se compadeceram do menino e quiseram tentar conversar com ele.
-- Enzo,tudo bem?Eu sou o Sam.
-- Oi,Enzo,eu sou a Ally. Você é um menino muito bonito. Não quer brincar com os outros coleguinhas?
-- Não.
-- Por que? Tem alguma coisa te incomodando?
-- Minha boca dói muito.
-- Sua boca? Eu posso ver onde dói? Você mostra pra tia?
Ally falou o pegando no colo. Senta aqui no colo do tio Sam e abre sua boquinha. Deixa a tia olhar se tem algum bichinho no seu dente?
Ele era muito bonzinho,abriu a boquinha e deixou ela olhar.
-- Enzo,tem um bichinho feio no seu dente. Mas a tia vai tirar ele daí e sua boquinha vai parar de doer.
-- Obrigado,tia.
   Ele deu um abraço tão apertado na Ally e no Sam que eles já derreteram ali.
  -- Sam, dá um analgésico pra ele por favor. Anota o nome dele,e eu quero atendê-lo amanhã cedo. Ele será meu primeiro paciente do dia,antes do expediente começar.
-- Ele tem uma cárie,Ally?
-- Não.O dente dele está quebrado.Isto deve ter acontecido no acidente.Vamos falar com a madre.
-- Nossa! Quando ele foi socorrido no hospital após o acidente,eles certamente não examinaram os dentes dele. Será que ele está sentindo dor todo este tempo,sem dizer nada? Por isso está tão quieto.
-- E a irmã dele? Onde está?
-- Está ali,brincando de boneca com a amiguinha.
-- Deixa eu ver os dentinhos dela.
A menina também era muito boazinha. Ally e Sam se apresentaram,Ally brincou um pouco com ela e Sam a pegou no colo. Ally pediu para ver os dentinhos dela e ela deixou.Ah,se toda criança fosse tão boazinha assim.
-- Sam,anota o nome dela e pode pôr que está tudo bem com ela. Felizmente.Vamos almoçar?
   Eles comeram calzones no restaurante italiano e tiveram tempo de relaxar,comer com calma e bater papo.Eles não disseram um pro outro,mas estavam muito condoídos com a situação dos irmãos.Não estava no plano deles adotar duas crianças,mas eles não teriam coragem de separar os dois irmãos. A verdade era que eles estavam considerando a situação em silêncio.
   Depois do almoço,voltaram ao orfanato e viram que Enzo estava mais bem disposto devido a medicação.
-- Tia,tio,eu tô melhor!- Ele os abraçou.
-- Que bom,Enzo.Amanhã eu vou te ver de novo. Você vai gostar?
-- Vou,tia.
-- Vamos tirar o bichinho do seu dente.Combinado?
-- Combinado.
Eles combinaram de a madre providenciar para que o menino fosse ao consultório cedo e eles  voltaram aos atendimentos.
   O dia foi muito produtivo e eles conseguiram ver todas as crianças.
Haviam 15 crianças precisando de tratamento dentário e 10 de acompanhamento médico.Os casos médicos eram de alergias respiratórias (rinite, bronquite, sinusite),gripes,viroses e diarréia. Mas não havia nada grave.Doenças típicas de crianças.Elas estavam bem.Foi constatado que elas não eram maltratadas, felizmente.
   As pessoas envolvidas no tratamento gostaram tanto da experiência,que combinaram de repetir o processo. As médicas concordaram em visitar o orfanato mensalmente e os dentistas,de 6 em 6 meses.Eles queriam ajudar a cuidar dos pequenos e concordaram em ser acessíveis e tratar as emergências que surgissem no percurso. Com a ajuda da Ally,o orfanato teve assegurada assistência médica e odontológica para as crianças.
   A madre,que era muito astuta,percebeu a interação da Ally e do Sam com o Enzo. E começou a torcer intimamente para que eles se apaixonassem pelo menino o suficiente para adotar a ele e a irmã. Ela sabia o quanto era difícil isso acontecer,mas quem poderia culpá- la por desejar?
O pessoal foi para a churrascaria e os companheiros do David,do Pedro,da Paula,da Marcela e da Amanda se dirigiram para lá e todos confraternizaram,participaram do rodízio de churrasco,tomaram cerveja. Quando foram pra casa eram mais de 21 HS. O mutirão foi um sucesso total.E na próxima rodada,eles queriam levar mais gente. Ally e Bianca ficaram incumbidas de tentar envolver mais profissionais no atendimento. Leigos também seriam bem-vindos para ajudar na organização.Elas trabalhariam nisso para a próxima vez. Mas só de ter conseguido atender a todos, já valeu demais.

EsperançaOnde histórias criam vida. Descubra agora