Prólogo

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Noites de natal são tão calorosas, famílias reunidas, amigos presentes. Comes e bebes para todos, alegria de estar lá, basta estar, já é mais que o suficiente.

Mas há aqueles que estão acorrentados à solidão, alguns procurando um pouco mais de si, um pouco mais do mundo, um pouco mais de você.

Interessante como o ar da cidade de Nova York fica um pouco mais quente na época do Natal. Este é o meu sétimo natal sozinho, o que não me impede de dar pelo menos um peru congelado a cada um dos meus empregados, eles ficam satisfeitos, e eu mais ainda.

Estou na terceira carteira de cigarros da noite, cumprindo meu ritual de natal preferido, fumar até Cristo nascer e salvar minha alma, exatamente a meia noite. Não me lembro bem quando o iniciei.

Acredito que seja uma noite bela para casais e famílias, lembro-me que John adorava a mesa farta da casa, o caçula sempre come mais. Mary era forçada a retirar os dedinhos finos dele, mais de dez vezes de dentro da salada de batatas, e do peru assado e dourado em cima da mesa. Por vezes se esforçava para subir na cadeira e pegar pedaços maiores. Mas nem sempre obtinha êxito. Algumas vezes fora seu cúmplice, lhe dando pedaços do peito macio do peru para ele, antes que nossa mãe percebesse. Jake ficava enciumado e nos delatava, a bronca de nossa mãe, Hellena, era branda, sua voz aveludada preenchia os ouvidos, tão delicada quanto uma melodia cuidadosamente trabalhada. Era como um anjo, diferente do dono da casa, o senhor Rubel Buttowski, com sua barba sempre bem feita, traços firmes que o faziam ser mais assustador quando zangado. Era um exemplo de pai, marido e empresário, tinha filiais em todos os países latino americanos, como presidente das indústrias Synv tinha atingido grandes metas e muitos lucros, e em meio a tantas ocupações, jamais deixara um de seus quatro filhos desamparados.

Eu e meus irmãos sempre fomos tratados como reis rebeldes, fugindo de Mary a todo momento, aquela mulher merecia um prêmio pelo recorde de quilômetros percorridos em apenas duas horas, nenhum maratonista conseguiria o que ela conseguiu nos perseguindo. Jessie era a princesa da casa, uma rainha em forma de criança, mas se juntava a nós quando nossa mãe não estava em casa, e por muitas vezes, era a responsável por um jarro de setecentos dólares quebrado. Claro a culpa sobrevinha ao mais velho, no caso, eu.

O frio já está tomando conta de tudo aqui, hora de voltar para o túmulo chamado casa, não que ela seja ruim, mas já teve dias mais vivos e quentes. Minhas pernas lutam a cada passo tentando manter o ritmo acelerado, até me deparar com uma larga porta branca e iluminada com luzes coloridas nos tons vermelho e azul, um ar quente emanava do lugar que se escondia atrás dela. Logo, uma mulher coberta por um sobretudo preto saiu pela porta com o olhar de uma víbora, me olhou de cima a baixo, me analisando como um lobo examina sua presa. Era morena, de olhos claros que cintilavam com a iluminação colorida, cabelos longos, exalava luxúria e delicadeza. Para minha decepção, um homem robusto, com algumas tatuagens aparentes no pescoço e vestido com um terno cinzento, veio por detrás dela e a acompanhou até seu carro, onde entraram e logo se misturaram ao trânsito da avenida.

Voltei meus olhos para a porta iluminada, e vi que acima dela reluzia o letreiro em tons de rosa escrito Freya. Já tinha ouvido aquele nome em algum lugar, o que me deixou mais curioso, tomado pelo impulso do momento, empurrei a porta e entrei.

Era repleto de mulheres, um verdadeiro harém, de uma variedade incrível, loiras, morenas, altas, baixas, algumas com olhares inocentes, outras que deixavam bem claro o que queriam. Haviam algumas vestidas apenas com saia e sutiã, outras não traziam nada mais que suas lingeries de renda, o ar espesso e quente me embriagava, tornando aquela visão mais ilusória e irreal. Também haviam homens, alguns estavam lá para comprar, outros para vender o corpo. Senti a sensação do encontro caloroso entre minha boca e lábios carnudos de uma mulher vestida apenas com sua calcinha, seus seios se apertaram a mim, e ela pareceu perder o fôlego, soltando um breve gemido, quando me soltou vi seu olhar sugestivo em meio aos cabelos ondulados e dourados, e suas mãos deslizando sobre meu peito.

Foi só então que a vi, do outro lado do corredor, vestida com uma camisa masculina, olhos inchados, a maquiagem borrada, suas lágrimas escorrendo negras por sua bochecha, estava sentada em um dos degraus da escada que dava acesso ao segundo andar. Era linda, cabelos negros distribuídos em ondas largas e pesadas, o rosto rosado, com a pele branca e alguma frase tatuada no pulso. Neste momento a loira que me beijara, já havia sumido pelos corredores do prédio, com toda certeza estava irritada por ter sido ignorada, mas não importava, tudo que eu queria era aquela garota.

30 segundos a maisWhere stories live. Discover now