cap2

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Todas as meninas se reuniram no refeitório principal, para o almoço. Não estou com fome, sinceramente não tenho fome e nem ânimo para nada. Esses sonhos e lembranças me atormentaram bastante. Havia muito tempo que eu não as tinha. Em algumas vezes quando são lembranças, elas são muito fortes, ao ponto de me causar desmaios.  Geralmente quando isso acontece eu não lembro de nada. As irmãs do orfanato, foram proibidas pela governanta irmã Meire, de me contar o que eu faço nessa espécie de transe em que eu entro. Creio que esse é um dos motivos pelos quais todos se afastam de mim.

Estou sentada em um canto do grande salão do refeitório, e claro, sozinha como sempre. No início, me sentia incomodada, mas agora tanto faz. Já estou acostumada com isso, acho até bom, assim tenho tranquilidade e posso me fechar para meus livros, algo que eu gosto muito de fazer. Eles são os meus refúgios, como um portal para um lugar longe de tudo que me atormenta.

Todas as vezes que tentei me aproximar de alguma menina daqui, elas se afastavam, corriam e algumas até choravam. Eu podia ver o medo em seus olhos. O que eu fiz a elas para deixa-las dessa forma? Era como se eu fosse uma aberração. Queria fazer as pazes com todos. Mas é difícil pedir perdão por algo que não lembro ter feito.

Percebo vários olhares em minha direção, como se elas nunca tivessem me visto, como se quisessem desvendar um segredo, ou simplesmente estivessem atentas, temendo algo. Sei que não sou bem vinda aqui, mas não tenho outro lugar para ir. Só quero que tudo isso acabe, eu quero ser normal. É pedir demais?

Estava tão pensativa, que nem percebi as lágrimas escorrendo em meu rosto,  até minha tigela, onde estava minha sopa de legumes, a qual eu não havia nem tocado. Enxuguei as lagrimas com a manga de minha blusa, e respirei bem fundo, tentando me acalmar. - Vai ficar tudo bem Gabriela- Meu subconsciente disse para mim mesma, em tentativa de me animar.

A porta se abre, e todas olham em sua direção. É a irmã Ester, a velha e rabugenta irmã Ester. Ela deixa seu olhar correr em direção a todo refeitório, até que seus olhos se encontram aos meus.

- Senhorita Gabriela, por favor me acompanhe até a sala da governanta.- Suas palavras foram curtas e grossas, em um tom ameaçador.

Meu coração gela imediatamente. O que será que fiz dessa vez. Eu vou em sua direção bem vagarosamente, enquanto todas as meninas do orfanato, cochicham entre elas e me dão olhares acusadores.  Seguimos entre os enormes corredores até a sala da irmã Meire. Quando entramos, ela pedi para que a rabugenta se retire, e nós deixe sozinhas.

- Senti-se  Gabriela. - Como sempre, ela me deu, seu sorriso maravilhosamente encantador, e dirigiu-se a mim com uma voz calorosa e alegre.

A irmã Meire, é a única pessoa do mundo, além de meus falecidos pais, que  parece realmente se importar comigo. Não sei o que seria de mim sem ela nesse lugar.

Eu me sento em uma cadeira, em frente a sua mesa, com um belo sorriso. Só seu olhar já havia me acalmado. Estou feliz por vê-la hoje. Ela é muito ocupada com suas tarefas do orfanato, e suas orações, assim infelizmente, eu só a vejo, três ou duas vezes por semana.

- Olá governanta, é tão bom te ver. - Eu estico minhas mãos até ela pedindo sua bênção. 

- Deus te abençoe querida, como tem ido essa semana? - Eu queria dizer a ela toda verdade, que não aguentava mais, que os sonhos tinham voltado, que minha vida estava um caos, que eu queria dar um fim nela.... mas eu não tinha coragem te decepcionar a única pessoal que se importava comigo. Então eu abri o melhor sorriso que eu podia e disse:  - Esta tudo bem governanta, não se preocupe comigo. - Acho que ela sabia que não era verdade, porque me deu um olhar piedoso, se levantou e começou a passar as mãos pelos meus longos cabelo ruivos. Me fazendo assim deixar cair algumas lagrimas.

- Vai ficar tudo bem minha menina, eu prometo. - Ela deu um beijo doce em minha testa, e se sentou novamente em sua cadeira.

- Tenho uma boa notícia para você. - Ela parecia anima, assim me fazendo ficar curiosa com seu entusiasmo.

- Qual? - fiquei meio apreensiva, mas não tinha nada a perder mesmo.

- Você será adotada, sua nova família se chama os Green.- O que? Meu coração parou imediatamente, eu não esperava isso. Todas as vezes que fui atotada, deram incrivelmente erradas.

- Governanta, eu.... eu..... acho que não é uma boa ideia, você se lembra do que aconteceu...... - Minhas palavras eram tremulas e um pouco embaralhadas.

- Eu sei sim querida, mas alguma coisa me diz, que dessa vez vai dar tudo certo. Se anime, você deveria estar feliz. Vamos tentar mais um vez, tudo bem?

- Eu não sei, tenho medo do que pode acontecer. - A última vez que fui adotada, eu tive uma dessas repentinas memórias e acordei com a mulher que havia me adotado sob seu marido ensanguentado no chão. Ela olhou para mim, e começou a me chamar de monstro e a gritar bem alto. Eu nunca vou esquecer esse dia, me senti muito mal, e o pior eu nem sei o que fiz de verdade até hoje, as lembranças vivem me atormentando. Será que fui eu que o machuquei, como eu fiz aquilo, eu não intendo, me sinto perdida em meio a tudo isso.

- Gabi, vai dar tudo certo. Não precisa ter medo, eu vou estar aqui sempre com você. - Sua Voz era fraca e reconfortante. Meire não era a mesma a muito tempo, ela já tinha 67 anos, e vive em repouso, com várias visitas de seu médico. Ela estava bem velhinha, e sua doença só a enfraquecia, dia após dia. Acho que eu já sabia que aquela frase não iria ser verdade por muito mais tempo. Eu tenho medo de perdê-la, ela é muito especial para mim, ela é tudo que eu tenho. Eu iria tentar mais uma vez, por ela.

- Tudo bem, eu irei tentar. - Em seu rosto surge um grande e alegre sorriso largo. Ela nunca disse, mas eu sei que ela tem medo, que eu fique sozinha quando chegar sua hora. Meu coração fica apertado só de pensar. Algumas pessoas deveriam viver para sempre. E Meire com certeza é uma delas.

- Sua nova família irá busca-la hoje a noite, então se prepare. - consenti com a cabeça, lhe deu um abraço singelo, e me retirei o mais rápido possível, para que ela não vê-se as lagrimas que estavam prestes a escorrer de meus olhos.

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