ATUALMENTE
O corpo de Carla tremia todo por causa da chuva que tinha acabado de pegar. Seu rosto estava molhado e era impossível saber se era apenas a chuva ou ali também havia lágrimas escorrendo. As pessoas que a viam na rua mal sabiam que aquele rosto molhado estava daquele jeito por causa de 2 anos de sofrimento constante.
Chegando na porta a moça tentou arrumar seu cabelo encharcado, só que em vão. Ele grudou no seu rosto assim como sua blusa rosa grudou em seu corpo magro. Bateu na porta sem força pela primeira vez e notando que ninguém tinha ouvido, Carla bateu mais forte em seguida.
A senhora que abriu a porta tentou dar seu melhor sorriso para alegrar a garota pálida que estava a sua frente. Qualquer pessoa que abrisse a porta e a visse parada ali daquele jeito, poderia jurar que era apenas um espírito por causa do rosto da menina. Dona Luzia então abriu mais a porta e deu espaço para a filha entrar, logo em seguida lhe entregando uma toalha e roupas secas.
Carla se trocou em silêncio no banheiro, chorando baixinho para que a mãe não ouvisse nada, só que a mãe não precisava ouvir para sentir que sua filha estava sofrendo.
Assim que saiu do banheiro, logo sentiu um cheiro de café se instalar pela pequena casa onde ela já viveu por muito tempo antes. Seguia para a cozinha onde sentou- se na mesa, perto de sua mãe.
Lá fora os pingos de chuva batiam na janela da sala com força, querendo entrar. O clima estava frio e estranho. A casa estava silenciosa. A TV desligada. A cozinha carregava um cheiro forte de comida. Carla segurava sua xícara de café com força entre os dedos fracos, fazendo eles queimarem por causa do calor da bebida. De tempos em tempos ela tirava as mãos da xícara para arranhar as pernas e voltava a segurar a xícara com força. Dona Luzia observa a filha fazer isso, com o coração apertado.
— Foi minha culpa, eu sei — disse ela sem levantar o rosto para encarar a mãe que estava pálida a sua frente. — Eu sei que foi.
— Tire isso da sua cabeça, é claro que não foi, você não fez nada de errado. — Carla negou com a cabeça e segurou as lágrimas que queriam descer pelo seu rosto. Puxou para trás uma mexa de seu cabelo que estava em seu rosto e levantou o olhar.
— Todo mundo sabe que foi minha culpa... ele sempre dizia que tudo era minha culpa e isso foi minha culpa.
— Você tem que parar de se culpar por essa situação toda, pois você nem estava lá pra ficar se culpando por isso — respondeu Dona Luzia, respirando fundo. — Por 2 anos você só aparecia na minha frente para dizer que estava tudo bem, mal visitava sua própria mãe e agora aparece aqui por causa do acidente se culpando e falando que já tinha errado antes. Não diga isso. Meu coração dói tanto de ver você assim se culpando por algo do que ninguém tem culpa. Pare com isso minha filha!
Carla levantou o olhar e não conseguiu mais conter as lágrimas. Chorou e chorou, junto com a chuva que caia lá fora. Era como se estivesse chovendo dentro de casa também. Seu peito doía, era como se houvesse um buraco negro la dentro que sugasse toda energia do seu corpo. Ela sentiu sua mãe lhe envolver em um abraço quente, tentando segurar toda a fraqueza da filha e a ergue- la de novo, só que era difícil. A filha já estava no poço há muito tempo para ser erguida por apenas um abraço de mãe. Dona Luzia também se sentia culpada, por nunca ter notado que tinha algo de errado e por não ter estado com a filha durante muitos momentos nos últimos 2 anos, do qual ela nem sabia direito o que tinha acontecido. Não conseguia compreender por que ela se culpava tanto pelo ocorrido. Não fazia sentido.
Finalmente Carla conseguiu respirar fundo para poder falar
— Você nunca vai poder entender mãe, nunca.... — seu rosto estava encharcado e ela sentia um gosto salgado na boca das lágrimas que caíram.
Dona Luzia queria mais do que tudo entender o ocorrido nesses 2 anos. Nunca soube direito o que tinha acontecido. Sua filha havia emagrecido tanto e as vezes aparecia com marcas estranhas no rosto, só que nunca quis conversar sobre. E agora estava ali, chorando tanto e tanto. E se culpando por algo da natureza, por algo impossível de ter acontecido por culpa de alguém. A mãe gostaria de saber a saber a história toda.
— Então me conte minha filha: o que aconteceu?
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Marcas
General FictionCarla tenta viver o presente mas sua mente continua presa às memórias do passado. Todos os dias, memórias de coisas que já viveu voltam para atormentar os seus pensamentos e mostrar que ela é a culpada de toda a situação que aconteceu. Ela precisa e...