Prólogo

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Ester Veron

Todas as nossas ações acrescentam pesos e medidas à nossa vida.

E todas as decisões que eu havia tomado, durante toda a vida, e especialmente nos últimos meses, pareciam ter caído sobre mim todas de uma vez.

Havíamos acabado de sair do lugar onde Sarah havia sido mantida refém, onde tínhamos sidos alvejados numa chuva de balas, onde um cara tentou me matar diretamente. Mas por incrível que pareça, estávamos vivos, todos, e dentro do carro de Vinícius, indo de volta para a cidade.

E era engraçado como aquele carro, com tanta gente em volta, fazia eu me sentir vazia.

Me sentia suja. Meu corpo parecia sujo, impregnado de alguma forma suja de contato.

Todos pareciam assim, sujos de alguma forma. Marcados.

Ian estava encostado em mim, com o uma cara séria, olhando os hematomas no rosto adormecido de Sarah em seu colo.

E eu não conseguia nem olhar pra ele. Nem para Sarah.

Muito menos encarar os olhos focados de Rafael, no espelho do carro.

Me limitava a encarar a janela, sem enxergar verdadeiramente nada que a paisagem borrada tentava mostrar.

Quando o carro parou, e Ian desceu em frente seu apartamento, com Sarah no colo, eu me senti melhor, parecia que eu respirava melhor.

Me acomodei com calma no banco trazeiro do carro, enquanto Rafael dirigia para a casa de Vinícius, e quando Vinícius desceu, meu corpo relaxou de tal forma no banco, que pensei não poder sequer mexer meus dedos.

Estava anestesiada, mas minha cabeça era um emaranhado de loucura.

Flashs vinham , mas tudo parecia confuso ainda. As imagens se colidiam, os sentimentos eram duros e confusos.

O homem agarrando Sarah.

Uma coragem crescendo dentro de mim. Uma vontade de ajudar.

E o homem se voltando para mim, tentando tirar minha roupa, o cheiro de sua pele quando o mordi, a arma apontada para mim.

"Meu Deus, o que eu fiz com a minha vida?" O desespero inundava meu corpo de novo.

-Para o Carro. - minha voz era engasgada, quase um sussurro,suplicante.

E Rafael, como se estivesse apenas esperando atento que eu dissesse algo, parou o carro no canto da rua quase imediatamente.

Abri a porta correndo, com o gosto amargo na boca parecendo ter tomado um soco no estômago, a tempo de vomitar na calçada.

Num instante depois senti as mãos de Rafael segurando todo meu cabelo para trás da minha cabeça, enqunto eu respirava fundo, em meio a soluços engasgados, encarando a calçada, com os olhos embaçados pelas lágrimas.

Havia um zumbido na minha cabeça, me tirava o ar. A angustia e a ansiedade eram alucinantes.

Eu podia ter sido estuprada.

Podia ter morrido.

Sarah podia ter morrido.

Ian podia ter morrido.

Rafael...

E com esses pensamentos, senti uma nova onda de nausea apertando o estômago, logo em seguida vomitando pura bile e água de novo na calçada.

Cuspi tentando me livrar do gosto amargo na boca, enquanto levantava o corpo e me sentava melhor na beirada do carro, puxando o ar com força, tanto para acalmar minha respiração quanto meus pensamentos.

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