Capítulo 1

889 71 17
                                    

Ester Veron (meses depois)

Senti minha cabeça doer antes mesmo de abrir os olhos.
- Mas que porra.. - resmunguei com a boca amarga, tentando não mexer muito, enquanto espreguiçava meio dura na cama, até os dedos do pé começarem a dar câimbra.
"Mas que PUTA MERDA."
O sol entrava pela porta da sacada, atravessando todo o quarto e indo diretamente na cama. A sensação do calorzinho tocando a minha pele era muito gostosa até, mas a porra da luz queimando minha retina, fazendo com que doesse sem eu nem abrir os olhos, era o que havia me acordado.
Me sentei, sentindo o quarto dar uma volta completa, enquanto a ressaca caia como um tijolo na minha cara.

- Que inferno. - havia acordado de ressaca, e com uma incrível capacidade de resmungar.

"Parabéns Ester."

Levantei com preguiça,ficando alguns segundo parada igual uma idiota na beirada da cama, até encontrar as cortinas do quarto abertas, me encaminhando para fechá-las.
Tentar manter meu equilíbrio, era a atividade mais digna que eu podia fazer naquele momento, já que minhas coxas e joelhos doíam pra um caralho, me dando leves fisgadas conforme eu me mexia.

"Porquê eu tive que dançar tanto ontem? " , me reprimia por ter passado da conta na noite passada, tanto na dança, quanto na bebida.

Havia começado a beber não eram nem 22h ainda.. e me lembro vagamente de Vinícius me mandando não exagerar. Depois me lembro de dançar com ele, e dançar com um monte de gente, e de subir na mesa.

"Puta merda.."

Estava ali agora, com uma ressaca mega grande, com dores, e umas memórias muito alteradas pela álcool, de uma noite divertida, com risos, dança e muita gente...todas desconhecidas.

Nessa hora me veio a saudade. Ela sempre vem... Começava com uma dorzinha no meio do peito, como se fosse algo físico, algo que eu pudesse até tocar com as mãos.
Sentia saudade da minha família, de estar com eles, dos abraços, de dormir junto, de comer junto, até das broncas deles eu tinha saudade.

Também havia saudade de mim mesma, de como as coisas eram comigo, como eu costumava ser muito confiante e determinada, e como eu sabia exatamente quem eu era.

E existia uma saudade velada, dolorida demais , e pesada, mas que eu mal me permitia sentir. Saudade do Rafa..

Era assim todos os dias.
Todas as manhãs quando eu abria meus olhos.
Na verdade, a qualquer hora do dia eu sentia aquilo.
Uma saudade sufocante, que as vezes eu mal notava, mas me mantinha numa nuvem densa.
Depois de todos os ocorridos no cativeiro onde mantinham Sarah , eu não tive muitas opções.
Aquele dia havia quebrado algo dentro de mim. Não tinha como continuar com aquela vida com aquela EU, depois de tudo.
Então, se eu me permitisse vaguear demais por esses pensamentos, me lembrando daquele dia, do lugar, do homem em cima de mim, lembranças doloridas, eu acabaria com o resto que havia sobrado de mim .
Não chegava a me lembrar mais da voz do homem que me agarrou, nem muito de seu rosto, mas o cheiro da pele dele, o cheiro em MIM...

Respirei fundo. " Vamos lá, Ester... nada de pensar nisso." , outra respirada fundo. "Não pensa nele.. "

Peguei meu celular, com o rostinho rosado de Laura como papel de parede, e então mais uma facada no meu peito.
Eram sete da manhã, e eu estava tão fundo no poço, encarando minha sobrinha que eu só conhecia por fotos. Como podia a gente amar tanto alguém que não conhecia?

Voltei a me aconchegar nas cobertas, com o celular na mão, olhando bem os olhinhos azuis dela me encarando.

Ian me mandava fotos e vídeos dela todos os dias, junto de um monte de mensagens de texto e áudio pedindo que eu - pelo amor de Deus - fosse conhecer ela, e conversar com ele.

RedescobrirOnde histórias criam vida. Descubra agora