- Anda logo, que demora - Ella reclama mais uma vez e finalmente Victor aparece na porta da cozinha, com um pote cheio de pipoca e um copo gigante de refrigerante em mãos.
Rocky está animado, respira profundamente deitado no tapete bem ao lado do sofá onde Ella se encontra debaixo de uma coberta fofinha. A gata de Ella, por mais arisca que seja, sempre gostou de Rocky e por isso substituiu o braço do sofá pelas costas macias e peludas de Rocky, que adorava a presença da gata.
Victor se sentou junto à Ella no sofá e a mesma o cobriu, ele pôs o copo no chão no canto do sofá e encaixou o pote de pipoca entre seu corpo e o de Ella, que segurava um prato de brigadeiro e duas colheres. Pegaram o controle, sorriram um para o outro e deram play no filme, que por tantas vezes se repetiu em cenas tão semelhantes.- Estou com sono, pelo visto Rocky também. Temos que ir - comentou Victor após o término do filme.
- Mas...- começou Ella - Não podem ficar essa noite? Ainda está chovendo - como se fosse feitiçaria de Ella, o barulho da chuva aumenta, indicando que a potência havia aumentado.
- Ella, de novo? Sempre briga comigo e me convida pra dormir aqui?
- Quer saber? Faça o que quiser. Você nunca me escuta mesmo.
- Como é? EU nunca te escuto? Eu? - que engraçado, porque eu já comentei várias coisas com você e tu nem ligou.
- Ah é? Tipo o quê? - questiona Ella, a fim de deixar Victor sem argumentos.
- Quando eu digo que gosto de você, Ella, e você acha engraçado. Quando eu venho te fazer companhia numa sexta-feira chuvosa, quando brigo com caras que vêm de gracinha para o seu lado, e você se sente incomodada, quando eu saio do outro lado da cidade, rodo todos os mercados só pra comprar algo que deu vontade em você. Quando eu desenho você distraída e você nem percebe. Tudo isso eu já comentei com você, Ella, e você não percebe. Eu estou apaixonado, e ainda assim você não percebe. O máximo que eu recebo ao final de cada coisa feita é uma resposta mal educada ou uma piada irônica. Nenhuma demonstração de afeto. Mas você sempre foi assim não é? Ja me acostumei mesmo.
- Não, Victor. Eu não fui sempre assim. Pena que você não sabe. E alem do mais, eu não te obrigo a fazer isso. Nunca obriguei você a nada disso
- Você não me obrigou, Ella, mas caso nao saiba, quando uma pessoa está apaixonada, ela faz de tudo para ver a outra pessoa bem e feliz. E de novo, você não sabe.
- Ah Victor. Eu sei bem. Você não se lembra? Eu fui assim com Daniel, dei atenção, carinho... amor! E foi isso que me deixou assim. Demonstrar sentimentos faz com que você se machuque Victor, mas você não sabe da história.
-Não sei? Ah, deve ser por quê você não me contou. De novo. Muitas vezes parece que você não te confiança em mim. E isto é ridículo. Quer saber Ella? Cansei de fazer de tudo e ainda assim você não reconhecer. Obrigada pela noite, mas eu e Rocky temos que ir. Se cuida - Victor pegou seu casaco e se aproximou da porta -Rocky, vem.
O belo Pittbul responde ao chamado levantando e indo até o lado de seu dono, que abre a porta do apartamento e pega sua mochila.
- Espero que fique bem.
- Victor, espera... - antes de qualquer resposta, a porta se fecha de forma grosseira.
Victor, do lado de fora, abaixa a cabeça e respira fundo. No fundo, seu coração doía por ter dito aquilo e sua mente estava mais leve, por finalmente ter dito. Dentro do apartamento, ainda no sofá, estava Ella, com a cabeça baixa e lágrimas rolando, com o coração doído pela briga e pelo medo, e a mente confusa por um turbilhão de pensamentos. Como se prevesse a necessidade, Mia se aproxima e deita sobre sua dona, e dentro do cativeiro, Lua se agita. Lembranças assolam a mente de Ella, cada momento de dor do passado, os traumas que passou com Daniel, tudo.
- Victor não é Daniel, Ella. Você tem que entender - disse para sim mesma.
Se adiantaria alguma coisa, não sabia, apenas se enrolou no cobertor e deitou no sofá, adormecendo em meio às lágrimas.
Eram por volta de 4:30 da madrugada quando Victor acordou, com dor de cabeça e o celular tocando. Olhou no visor e o apelido de Ella se encontrava. Pensou uma, duas, três vezes se atenderia. Optou por deixar chamar até cair. Deitou-se novamente e em pouco tempo o toque retornou. Ignorou mais duas vezes até que impaciente atendeu.
- O que foi, Ella? - perguntou com a voz rouca.
- Eu acordei agora e não estou conseguindo dormir de novo.
- E?
- Por favor, me desculpa por ter dito aquilo, Victor. Eu preciso falar com você.
- Ella, são quatro e meia da madrugada. Não pode deixar isso para mais tarde? Eu preciso descansar e tenho assuntos para resolver às oito. Depois do meu compromisso eu passo aí.
- Não precisa vir até aqui. Marcamos na sorveteria, pode ser?
- Tudo bem. Olha, va dormir. Esquente uma xicara de leite, misture duas colheres de açúcar e canela e beba. Vai ajudar em oitenta por cento do seu sono.
- Tudo bem, Victor. Obrigada - ele desliga e põe o celular sobre a cômoda de cabeceira, vira para o outro lado da cama e adormece rapidamente, ao contrário de Ella, que se encontra do outro lado da cidade revirando em sua cama.
Victor se levanta às sete e meia, toma uma ducha rápida e coloca praticamente a primeira roupa que encontra espalhada pelo quarto. Passa na cozinha, pega um suco de caixinha, um iogurte de fruta e um pacotinho de biscoito integral. Senta na mesa, confere o horário e rapidamente se levanta para colocar ração para Rocky. Pega os alimentos do seu suposto café da manhã, joga na mochila e pega as chaves do carro, saindo do apartamento apressado, obviamente atrasado.
Ella se levanta às oito e dez, havia conseguido dormir depois das cinco e quinze. Teve um sonho estranho, no momento não se lembrava. Sentou na cama, olhou para o canto da parede e fitou por volta de dez minutos, esperando o resto do corpo e da mente despertar. Levantou da cama, foi ao banheiro e sentou na privada, apoiando os cotovelos nos joelhos e a cabeça nas mãos, demorando mais algum tempo para recobrar a noção. Levantou, terminou de se despir e rapidamente entrou debaixo do chuveiro num banho quente, lavando seu cabelo. Saiu vinte minutos depois, revigorada e enrolada nas toalhas, indo para seu armário conferir o look do dia. Se encontraria com Victor para explicar e pedir desculpa por tudo, seria especial. Pegou a calça jeans escura rasgada e uma regata preta, um cinto largo, um tênis branco e um colar de cordão preto. Argolas pratas, passou rímel, delineador e lápis de olho.
Fazia muito tempo que não passava mais de dois minutos pensando em uma roupa. Normalmente pegava as peças pretas menos amassadas das pilhas de roupa e passava um pente rápido em se cabelo, para amarra-lo em um coque logo depois. Foi à cozinha, fez um omelete com queijo, presunto e bacon, fez uma limonada com os limões empacados desde semana passada e se sentou à mesa, comendo de forma calma e tranquila. Terminou, lavou as louças e escovei os dentes, esperando a ligação de Victor. Vinte minutos depois, ela aconteceu.
- Oi, Ella? Acabei meu compromisso. Pode me encontrar na Ice Loved em vinte minutos?
- Claro. Te encontro lá.
Victor chegou primeiro, escolheu a mesa de sempre e sentou para esperar. Menos de dois minutos se passaram e Ella chegou, com um sorriso e vários olhares sobre ela. Victor ergueu o olhar e, de forma disfarçada, sorriu.
- Então - Ella se sentou - posso começar?
- Claro. Estou esperando - Victor se recostou na cadeira.
Ella contou sobre o que realmente aconteceu com Daniel, aos mínimos detalhes. Contou sobre as primeiras declarações, que foram sendo substituídas por humilhações e desinteresse, crises de ansiedade e consequentemente, tal coração de pedra. E mais uma coisa que Victor não sabia, nem nunca imaginou saber, o abuso sofrido de Ella, causado pelo ex companheiro, agora jurado de morte.
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A Musa Do Desenho
FanfictionElla Novaes, ama ler, desenhar e cantar. É totalmente introvertida e trocaria qualquer rolê por um filme com sorvete em casa, acompanhada de seus dois animais de estimação, uma gata e uma cobra. Ama preto, odeia clichês e renega (quase) tudo que lem...