Ímpar

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Apesar de ser inverno, o sol estava brilhante lá fora, refletindo nas calçadas e dissolvendo os corpos em pequenas gotas de suor. Aqui dentro tudo se fazia frio, inclusive a temperatura do ar condicionado da pequena sala de espera. Eu não queria estar ali, não queria estar sozinha naquele lugar e lágrimas incontidas teimavam em passear pelo meu rosto. Nesse momento, segurei minhas próprias mãos porque só havia elas e eu, ali.

Meu corpo doía, meu rosto refletia o cansaço e a angústia de uma noite mal dormida. A bílis queimava-me o estômago num misto de náuseas e fome. O jejum já mostrava seus efeitos colaterais, mas eu não estava preocupada com isso. Queria mesmo era saber a que horas eu seria vista. Queria mesmo é que todo mal fosse apenas físico. Mas, em vez disso, meu coração estava em frangalhos.

Nunca fora tão ruim ser ímpar, entretanto, cada dia se torna mais difícil ser par. Os sonhos passam pela minha cabeça como um filme que não posso protagonizar. Os fantasmas ressuscitaram em proporções que machucam sobremaneira. A vontade de chorar por tudo que se perdeu, por tudo que apenas ameaçou e não chegou a ser, corrói o peito. Eu queria gritar pelo ontem morto e pelo amanhã que não existe, mas meu coração sangra e silencia, ele sabe que é impar, que esta dor é só minha.

- Você já pode entrar...

(...)

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