Capítulo 4 - Aprendizado

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em, se eu quisesse passar por tudo aquilo e alcançar o meu objetivo de encontrar aquele buraco de minhoca, deveria estar preparada para uma coisa. A única coisa sem a qual meu plano nunca daria certo – aprender. Aprender tudo. Mesmo os assuntos mais triviais poderiam ajudar em algum momento.

Na Bíblia tem um provérbio que diz que o homem sábio é forte e o homem de conhecimento consolida a força. Scientia potentia est. O conhecimento e a força estão umbilicalmente conectados. Eu tinha a força. Eu sabia disso. Só faltava o conhecimento.

Fiz uma lista do que tinha de fazer e anotei num caderninho que roubei da minha cuidadora.

1. Aprender a língua;

2. Aprender como viver entre eles;

3. Aprender como funciona a política social;

4. Aprender o mapa-múndi e os caminhos, principalmente onde está a água.

Eu havia chegado pela água, logo, isso era uma pista. Pela lógica, e o universo era lógico sim (não era Stephen Hawking quem procurava pela teoria de tudo?), o outro lado da ponte devia desembocar na água também. Mesmo que estivesse no oceano deles, provavelmente haveria lendas, rumores. Era só me misturar e começar a busca. Os primeiros a revelar alguma pista seriam os meus salvadores, e era por ali que eu iria começar.

Os dias foram passando e, em todos eles, eu sempre começava com meu ritual, alongava-me, recitava meu mantra "ache aquele buraco de minhoca" e começava a observar como poderia me misturar entre eles. Comecei com pequenas tarefas, praticamente apenas auxiliando a minha enfermeira.

Com o decorrer do tempo, eu ajudava qualquer um com quem conseguisse contato. Apesar da vontade desesperada de usar o caderninho furtado para desenhar, não fiz isso, preferi guardá-lo para anotar cada palavra, cada uma possível de discernir os sons e os transcrevia no meu idioma do jeito que ouvia.

Enquanto apontava para os objetos, animais e plantas, minha cuidadora dizia seus nomes, com toda paciência do mundo. Gradativamente, aprendi uma palavra aqui e outra ali, para depois juntá-las e formar frases simples. Por mais que meu consciente lutasse, não pude deixar de lembrar de Dáian, da época em que ele aprendia minha língua. Agora sabia como era ser estrangeira, e, pelo jeito, seria estrangeira até o fim da vida.

A primeira coisa em meu aprendizado sobre família que me salvara, foi sua estrutura, a qual era composta de avô, neta (minha enfermeira) e um filho adotivo, cujos pais eram muito amigos da família de minha salvadora e haviam morrido há algum tempo. Outra coisa foi que os criados da família eram todos parecidos fisicamente. Não iguais, apenas parecidos. Estar entre eles causava um sentimento estranho, como quem chega a uma tribo indígena e se torna o único diferente dentre uma multidão de gente semelhante.

Eles não lembravam nenhuma etnia que havia visto na Terra. Tinham estatura mediana, cabelo e olhos pretos intensos, e pele morena. Somente os membros da família de minha enfermeira possuíam feições diferentes. Era como se só nós quatro tivéssemos ido a um país europeu isolado, e fôssemos os únicos bronzeados num mar de brancura.

Eles eram o que se pode chamar de nômades e, por isso, viviam em tendas. Estávamos numa planície, em campo aberto, e o único caminho para outro grupo humano era uma trilha, com rastros de carroças ou carruagens, ou sei lá. A vegetação era escassa, apesar de o lugar não ser totalmente deserto. Não me lembro de ter visto uma paisagem assim na Terra.

Alguns animais eram iguaizinhos aos nossos enquanto outros apresentavam uma leve diferença. E havia, também, o grupo das espécies bem diferentes, as quais despertavam em mim o interesse em aprender suas fisiologias. Entretanto era preciso dedicar todo o tempo disponível ao meu propósito, pois não havia um segundo a perder. Com o transcorrer dos dias, eu já conseguia expressar alguma coisa, compreender o que diziam foi mais rápido.

A Esposa do ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora