Erick tem estado, simultaneamente, em dois vagões de trem.
Em um deles ele mantém os olhos muito bem abertos, ele decora as numerações dos bancos, em ordem crescente e em decrescente, as vertentes dos números alternados e as somas dos bancos em grupos de quatro. Conhece as manchas dos carpetes, e ferrugens das janelas. O horário exato em que o carrinho com doces entra e o segundo exato em que ele saí.
No outro ele está com a cabeça encostada ao vidro, e na grande maioria das vezes, chove. Ele não se interessa por quem sentou ao seu lado, e mal sabe em que vagão está. Nem mesmo para onde o trem vai. É naquele vagão onde ele se sente exausto e sozinho.
E há as estações, aonde Erick sempre para, independente de em qual vagão esteja.
Cody é todas essas estações. Um garoto de 11 anos, mais esperto do que a maiores dos meninos dessa idade, e o único que consegue tirar Erick de sua correria ferroviária.
Hoje, no café da manhã, com cereal e leite integral, a coisa nova era "E.T.".
-E se os planetas do nosso sistema solar precisam interagir entre eles para funcionar , a nossa galáxia precisa de outras para interagir e não explodir... Como não haveriam outras pessoas em outros planetas terras?
-É uma boa pergunta. -Erick estava mesmo pensando sobre aquilo, enquanto enchia o copo com café, com cuidado para não derrubar nenhuma gota. -Mas eu, sinceramente, não tenho uma resposta para ela, Cody.
O garoto despencou os ombros e se encostou.
Tudo bem seu pai não saber aquela resposta, afinal de contas, ele não poderia saber de todas as questões do mundo.
Mas era frustrante de maneira indisfarçável.
Ele levou aos mãos aos olhos e as escorreu pela bochecha, soprando o ar que prendeu.
E no segundo seguinte parecia conformado.
-Essa é uma daquelas perguntas que a gente nunca vai saber a resposta. -Disse, e então comeu.
Erick estava sendo pai há onze anos, e já havia passado por muitas coisas desde que a mãe de Cody foi embora para outro país, há nove anos atrás. Mas as coisas que surgiam de repente de Cody ainda, depois de todo esse tempo, lhe causavam certo espanto, mesmo que, em sua maioria, soasse como leves espasmos, seguindo de um sorriso divertido, antes de voltar a se concentrar em alguma coisa.
Nesta vez a coisa era encarar o cereal enquanto mexia com uma colher.
Cody observou um pouco antes de falar.
-A reunião é hoje, não é?
Erick se surpreendeu com a questão.
-Sim... É hoje...
-Relaaaxa. -Cody tomou o leite com a boca na jarra. E limpou a boca com a mão. -vai ficar tudo bem. -E sorriu.
Erick desmontava toda vez que aquele sorriso aparecia. Era, definitivamente, a coisa mais bonito no mundo inteiro.
Ele sorriu de volta.
-Sim... Vai. -E voltou para o Erick que dá as ordens. -Bom, já são quase oito horas, é melhor subir logo, escovar os dentes, e calçar os sapatos, ou vamos nos atrasar.
-Sim, senhor, capitão! -Cody disse zombeteiro, fazendo reverência militar com a mão. Erick riu e então o garoto subiu.
E foi nessa hora que Erick partiu da estação, e voltou, simultaneamente para os dois vagões do trem.
Terminou de comer, rapidamente, limpou a boca com o guardanapo. Retirou os pratos e os pôs na lavadoura.
Limpou a mesa e ajeitou as cadeiras. Olhou em volta, nada fora do lugar. Uma cozinha espaçosa, com uma ilha no centro, inteira prata escuro e preta.Da janela grande depois da mesa, no décimos terceiro andar, ele podia ver a cidade, as árvores de cimento, gigantes, e a correria dos carros.
O dia estava nublado.
E era uma droga sair de casa e ter que encarar aquele frio todo.
O celular apitou.
Erick se aproximou da ilha e o pegou. "Sair", leu a mensagem.
-Vamos, Cody! -Gritou, indo para a sala, direto para o cabide com o paletó.
-Estou indo! -O garoto gritou.

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Computar
Lãng mạn[Logo faço uma capa melhor] Erick é um pai solteiro humanamente metódico e sério. Aos 37 anos descobre um diagnóstico de ansiedade e depressão. Depois de um conselho resolve descobrir o mundo dos games em busca de uma fuga dos problemas. Em um RPG...