Capítulo 4 (Gabriela)

10 0 0
                                    



Eu estou extremamente atrasada e eu não estou afim de dar de cara com a minha superior logo de manhã.

Fui dormir tarde ontem e agora eu estou aqui parecendo um zumbi. Mas o que a maquiagem não faz né? Passei muito reboco na cara e agora eu estou parecendo uma Monster High.

Eloisa até agora não levantou,eu estou preocupada com ela. Escutei ela chegando sem falar com ninguém ontem e ela nunca faz isso, só quando ela está bem mal.

Se eu não estivesse 5 minutos atrasada, eu acordava ela e certificaria se ela está bem.

Eloisa é uma irmã que eu nunca tive, eu sou a única mulher de 6  irmãos. Pois é, minha mãe gostou de ter filho e teve logo 7. Brincadeirinha, minha mãe teve uma gravidez de quintuplos, o último homem foi o meu irmão 2 anos mais velho e eu fui o fechamento da fábrica. Família Italiana grande. 

Eu nunca tive com quem brincar de boneca ou compartilhar coisas de garota, minha mãe até tentava, mas ela era muito ocupada tentando resolver os problemas que os meus irmãos causavam sempre.

Os gêmeos são a cópia fiel do meu pai, eu e meu irmão somos igual a nossa mãe. Era estranho chegar na escola com 6 garotos e só eu de menina. Os gêmeos são 5 anos mais velho que eu e o do meio é 2 anos mais velho, mesmo com grandes brigas entre a gente, eu os amo mais que tudo.

Antonella e Eloisa foram as melhores coisas que aconteceram na minha vida. Minhas duas irmãs cabeças duras.

>>>

Cheguei no hospital e minha superior estava parada na porta da minha sala.

- Atrasada de novo? - Ela diz me olhando com aquela cara de cínica. Raiva dessa mulher!

- Bom dia, Soraya. Acordou de bom humor? Para estar 06h da manhã na minha porta. Em que posso te ajudar? - Dou meu melhor sorriso debochado.

- Você não tem receio de perder seu emprego não? - Sinto uma pontada de raiva na voz dela.

- Vou trabalhar agora, tenho um plantão de 26 horas pela frente. Tenha um bom dia flor! -  Digo e passo por ela entrando na minha sala.

- Que mulher... - Digo logo após que eu entro na minha sala e fecho a porta.

Começo a analisar os exames que estão em cima da minha mesa. Eu amo o meu trabalho,mas quando se trata de paciente infantil,meu coração fica extremamente apertado. São cada situações que devemos passar,que as vezes me pergunto "como eu escolhi essa profissão?".

Escuto baterem na minha porta e eu peço para entrar.

- Oi gatinha. - Kaleb entra na minha sala com o melhor sorriso. Ele é o enfermeiro que atua comigo na emergência.

- Oi Kaleb,posso ajudar em alguma coisa? - Olho diretamente para sua face.

- Não seja assim comigo,você sabe que eu gosto de você. - Ele diz aparentemente desapontado e se senta na cadeira a minha frente.

- Assim como? - Faço questão de ignorar a fala dele. Como assim gosta de mim?

- Durona,sei que você não é assim. Quando você irá aceitar sair comigo?

- Olha Kaleb,eu não posso fazer isso e muito menos te iludir com situações que não vão acontecer. Você é um cara legal,um bom amigo e um ótimo profissional. Não quero que você fique se alimentando de uma ilusão. - Sua face entristece,mas ele acaba percebendo e muda rapidamente.

- Tudo bem,não vou mais te importunar com isso. Vim para falar sobre a situação de um paciente. -  Ele se torna sério e profissional. Admiro o jeito dele,gosto dele. Mas não com desejo amoroso,amizade apenas.

- Pode dizer. - Digo suavemente.

- Angeline,nossa paciente de 26 anos veio a óbito essa madrugada. - Deixo a caneta cair da minha mão em total surpresa. Levanto rapidamente e apoio as mãos na mesa.

- Como assim? Por que não tinham me passado isso? Vocês tinham o direito de me ligar em casa,a qualquer momento.

- Ela teve duas paradas cardíacas e veio a óbito por hemorragia interna. Pedi para auxiliar de enfermagem vir deixar o documento aqui na sua mesa,para a liberação do corpo. - Olho rapidamente para baixo e meu olho foca diretamente no nome dela,no último papel na pilha de mais de vinte outros documentos. Atestado de óbito: Angeline Acosta Guimarães.

- Por que vocês não me ligaram? Eu estava responsável por ela. - Olho diretamente para ele.

- Soraya impediu todo mundo de te ligar e atendeu ela mesma a paciente. Disse que você tinha acabado de sair de um plantão e merecia descanso. - Respiro o mais fundo que consigo e saio da minha sala.

Caminho com passos rápidos pelo corredor e acabo passando por Soraya feito um furacão. Ela me acompanha com o olhar e eu viro a direita,pegando um elevador até a parte abaixo do hospital,necrotério.

Kaleb me segue em total silêncio.

Saio do elevador e vou caminhando até a segunda porta. Entro na sala ampla e enorme,sinto o ar gélido e a tristeza que emana no ambiente. Procuro a gaveta AB-21 e a puxo.

Muitos nesse hospital ficavam intrigados porque eu era super apegada a ela,mas ninguém sabia que essa mulher que está gelada aqui na minha frente agora é a mulher que me fez sentir o amor de novo. Não,ela não era minha namorada e não estávamos ficando antes de tudo isso acontecer. Angeline vinha enfrentando o câncer faz 3 anos, eu vi ela lutando dia após dia, em cada quimioterapia ela não chorava ou ficava triste, sempre estava sorrindo e com ótimo humor.

Um dia me peguei perguntando para ela: "Como você pode ser tão feliz depois de tudo isso que vem lhe acontecendo?"

Ela sorrindo como sempre,me respondeu com a sua voz suave.

"A vida nos traz propósitos,situações e motivos para ser feliz,triste ou forte. Eu escolhi ser feliz e forte por mim e pelo meu filho. Escolhi também ser feliz e forte por todos aqueles que eu amo. Quando a vida ou alguém te disser que você não é capaz,não acredite! Somos capazes de tudo que confiamos fielmente."    

Sempre que eu quisesse desabafar ou conversar, ela me dava ouvidos. É difícil não se apegar a um paciente ou não conseguir se abalar quando acontece algo com quem nos apegados, sou humana. 

Ela deixou um filho de 6 anos.                                       

>>>


Até o próximo capítulo,meus amores!!

Villat - Angel Of The NightOnde histórias criam vida. Descubra agora