"Se você não puder consertar o que está quebrado, você enlouquece.", Max Rockantasky.
Segunda-feira, 21 de Agosto de 2017; 5:30 da manhã.
Era algo além de chamas laranjas e destroços. Havia alguém lá também, alguém que chama seu nome - que incentive a abraçar o fogo.
Jonatham acordou com o seu relógio biológico cinco minutos antes do despertador digital. Viu que seus olhos estavam cheios de lágrimas, e que seu peito ardia em febre. Sentou-se na cama e respirou fundo.
Fez sua rotina padrão pela manhã. Deixou o café quente no bule para sua mãe que não havia despertado, até ele dar um beijo em sua testa.
- Bom trabalho, filho. - Sua feição continuou rígida e fria.
Entrou no seu carro quadrado, que tinha o nome de quando um time de futebol marca ponto. Conferiu sua pasta; papéis e canetas estavam ali, calculadora, projéteis e um .38. Passou meia hora transitando da sua casa até o trabalho, pegou ruas curtas para evitar o trânsito matutino. O sol brilhava entre as nuvens brancas no horizonte, em contraste com o azulado, ainda se via a lua no lado leste. Parou em um semáforo e viu o mini-show de artistas de rua. Ele juntou um punhado pequeno de moedas, e deu para o rapaz que passava de carro em carro pedindo contribuição.
Quando adentrou ao trabalho, foi direto ao bule onde Júlia, a estagiária, deixava o café feito por ela. Jonatham apreciou o aroma doce, e experimentou o gosto amargo e forte da bebida negra.
- Ei - disse Douglas, colega da redação. -, o boss quer falar contigo. Pelo seu ânimo não é coisa boa, então se prepara.
- Por favor, diz que já irei lá, só vou deixar os relatórios na mesa.
- Cara, vai logo, deixa que eu coloco sua pasta. - Douglas ia pegar a bolsa marrom, mas Jonatham segurou-a firme.
- Não precisa, obrigado. - Saiu reto em direção a sala do chefe. O prédio não era tão grande ao ponto de precisar de elevador, na realidade, nem ao ponto de ser conceituado como prédio. Subiu algumas escadas e tocou três vezes na porta, abriu a maçaneta. - Bom dia, o senhor me chamou ? -
- Sim, sim, entre por favor. - Por mais que não estivesse visível, era de se sentir a tensão na sala.
- O maldito do Marco não veio, preciso que você vá lá e faça. Sei que já gravou algumas vezes para TV local, mas desta vez é ao vivo e não tem ninguém na sede que tenha algum tipo de experiência.
Jonatham não ficou surpreso.
- Por que Marco não veio.
- Não responde as mensagens, não atende as ligações, e a abertura está instruída para daqui três horas. Então eu preciso que você vá lá, cubra ao vivo.
Era um evento grande para a cidade, e a única sede jornalística queria impressionar.
Jonatham segurou o riso.
- Eu irei.
- Ótimo, sabia que podia contar com você, agora pode ir.
---
Um dia antes.
- Eu tô te falando, Jhon, ela era desse jeito toda safadinha.
Estavam em um daqueles bares, em que sua maioria, toca rock no karaokê. Uma das clássicas do Nirvana era cantarolada por um coral, de pelo menos, quatro pessoas. A estante atrás do barman tinha, desde as mais caras do Daniels, até as vodkas dentro de garrafas plásticas, que servem de inspiração para piadas dos comediantes nacionais.
- Comeu ? - Ele odiava tudo isso, mas sabia dissimular para diversas ocasiões, era bom nisso.
- Lógico, porra, cê acha que eu sou quem - Marco estava imbuído no álcool, não tinha mais discernimento sobre os assuntos, enrolava a língua e as palavras saiam atropeladas. Todos ali no bar já achavam Marco uma peça rara, pois tinha dado um show no palco e virado doses além da conta em uma pífia competição contra algumas adolescente, logicamente, menores de idade.
Jonatham não achava Marco uma peça rara, tão pouco algo que merecia aplausos, ele o considerava uma piada, uma piada sem graça onde o último a perceber era o próprio Marco.
- Olha, no tempo de escola eu te achava um porre, mas olha só, cê tá aqui bebendo comigo. A gente devia fazer isso mais vezes. - O típico bêbado que abraça e faz declaração de amizade, seja lá com quem estiver com ele.
- Todos nós mudamos ao longo da vida, Marco, mas eu acho que não mudei tanto assim.
- Mas é claro que você mudou, cacete. Cê tá aqui, bebendo comigo, porra, isso é magnífico. - Tomou um tempo para beber mais um gole da sua décima caipirinha, isso na contagem do próprio Marco. - Escuta, quando você começou a trabalhar no Jornal de Bárbara, eu nem acreditei, como assim o "Jhon Esquisito" se formou em jornalismo ?
Jonatham abriu um sorriso largo.
- Nunca pensei que você fosse tão gente fina assim, cara. - "A bebida entra, e as palavras saem. Por mais distorcidas que sejam, elas saem.", Pensou consigo mesmo.
- Vou ao banheiro. - Marco se levantou cambaleando.
- Precisa de ajuda ai, parça ?
- Na, tô de boa.
Jonatham mal havia falado depois que o colega tinha ficado bêbado. Ele colocou a mão no bolso, e tirou um comprimido branco. Despejou dentro do drink consumido mais da metade pelo bêbado.
Ao fundo, no karaokê, tocava uma clássica do Frank Sinatra na versão do Shawn James;
"Some people get their kicks, Stompin' on a dream"
Havia jovens em volta dele, tacando a comida do intervalo. "Jhon Esquisito", era cantado em coro.
- Ei, cara, eu só vou beber mais essa e é melhor a gente ir.
Jonatham havia se perdido nos pensamentos. Concordou com a cabeça e sorriu. Viu Marco tomar o resto da bebida, e ouviu;
"Oh, and you know I can't deny it
Many times I thought of quitting, baby
But my heart won't buy it"
- That's Life. - disse, Jonatham, com um sorriso largo.
Marco estava sendo apoiado pelo ombro do colega. Jonatham deixou ele escorado no capô do carro, quando viu que ele estava quase desmaiando.
- Aguenta, já vamos chegar em casa. - Ele balbuciou algumas coisas e desmaiou.
Abriu o carro e pôs o desfalecido no banco de trás. Deu partida e saiu do bar.
---
Uma dor de cabeça inunda a cabeça do recém acordado, vê que o ambiente está sendo iluminado por uma única televisão à frente dele. Tenta se mexer, mas seus braços e pernas se encontram amarrados a uma cadeira, esta que tem as pernas de aço concretadas no chão. O ato falho de grito é abafado por uma toalha em sua boca.
- Não vai funcionar.
Percebe que a voz vem atrás dele.
- Espero que goste do que vai ver.
Passos começam a vir em sua direção, Marco ve Jonatham passando por ele e o vê saindo por uma porta.