"Posso tocar nela?" perguntei para Ed. Ele deu de ombros, então eu estendi a mão e segurei os dedos da sua mão esquerda.
Eles já estavam frios como gelo.
Ela não apertou de volta.
"Nós podemos continuar?"Ed perguntou. Ele chacoalhou um grande colírio em sua mão.
Eu e papai demos um passo para trás, mas não ficamos muito longe de mamãe de modo que ela pensasse que nós a deixaríamos naquele caixão gelado sozinha.
Ed manteve os olhos de mamãe abertos. Seus dedos eram grandes, calejados e pareciam troncos ásperos se comparados às pálpebras finas como papel de mamãe. Uma gota de um líquido amarelo caiu dentro de cada olho verde.
Ed fez tudo rapidamente - gota, gota - depois fechou os olhos dela. Ela não os abriu mais.
Acho que eu parecia chocada, porque, nessa hora, quando Ed olhou para mim, ele realmente parou o seu trabalho tempo suficiente para me dar um sorriso confortador.
"Impede que ela fique cega", ele disse."Está tudo bem", mamãe disse de seu caixão caixa-de-sapatos. Mesmo os seus olhos estando completamente fechados, eu podia ouvir as lágrimas em sua voz.
"Tubos", Ed disse, e Hassan deu para ele três tubos plásticos transparentes."Ok, olhe", Ed se inclinou próximo ao rosto de mamãe. "Eu vou passá-los pela sua garganta. Isso não vai ser agradável. Tente agir como se você estive os engolindo."
Mamãe assentiu e abriu sua boca. Ed enfiou os tubos na garganta dela. Mamãe teve uma ânsia de vômito, um movimento violento que começou em seu abdômen e fez todo o caminho até seus lábios ressecados e rachados.
Eu olhei para o papai. Seus olhos estavam frios e rígidos.
Demorou um longo tempo até que ela ficasse imóvel e silenciosa. Ela continuou tentando engolir, os músculos do seu pescoço se rearranjando para acomodar os tubos. Ed passou os tubos através de um buraco na parte de cima do caixão caixa-de-sapatos, próximo à cabeça de mamãe. Hassan abriu uma gaveta e pegou um emaranhado de fios elétricos. Ele ligou um feixe de fios coloridos na extremidade do primeiro tubo, depois um longo cabo preto com uma pequena caixa acoplada no segundo e finalmente um pequeno pedaço de plástico retangular preto que parecia com um painel solar unido a cabos de fibra óptica no último tubo. Hassan ligou todos os fios em uma pequena caixa branca que Ed colocou bem embaixo do buraco, em cima do qual eu percebi que não havia nada mais do que uma caixa de embalagem elaborada."Diga adeus." Eu olhei para cima, surpresa com a voz gentil. Ed estava de costas para nós, digitando algo no computador; era Hassan quem tinha falado. Ele assentiu para mim, me encorajando.
Papai teve que empurrar meu braço para que eu me aproximasse de mamãe.
Aquela... aquela não era a última imagem dela que eu queria. Um amarelo incrustado em seus olhos, tubos ligados a fios enfiados em sua garganta, um brilho azul celeste suave pulsando em suas veias. Papai a beijou, e mamãe sorriu um pouco apesar dos tubos. Eu afaguei o ombro dela. Estava frio também.
Ela murmurou algo para mim, e eu cheguei mais perto. Três sons. Na verdade, três grunhidos embaralhados. Eu apertei o braço da mamãe. Eu sabia as palavras que ela estava tentando passar pelos tubos, "Eu amo você".
"Mãe", eu sussurrei, acariciando sua pele de papel. Eu não a chamava de nada além de mamãe desde que eu tinha sete anos.
"Ok, é isso aí", Ed disse. A mão do papai alcançou a dobra do meu cotovelo, e ele me puxou gentilmente. Eu o empurrei. Ele mudou de tática e segurou meu ombro com firmeza, me virando contra seu peito duro e musculoso em um abraço apertado, e eu não resisti dessa vez. Ed e Hassan levantaram o que parecia ser uma versão hospitalar de uma mangueira de incêndio, e água salpicada com faíscas azul-celeste encheu o caixão caixade-sapatos. Mamãe fez um barulho quando a água atingiu seu nariz.
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Através do Universo
RandomSinopse: Amy, de dezessete anos, se junta a seus pais como carga congelada a bordo da vasta nave espacial Godspeed e espera acordar em um novo planeta, trezentos anos no futuro. Nunca ela poderia ter sabido que seu torpor congelado terminaria cinqu...