I - Brasil.

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– Como assim vocês não vão? – Eu ouvi as palavras saírem da minha boca de uma vez só, um tom acima do normal, como se o meu cérebro não tivesse autorizado tal ação e mesmo assim as palavras acharam um jeito de sair. Encarei a minha mala, que ainda estava pela metade, algumas roupas já enroladas, daquele jeito que a Marie Kondo ensina em um dos seus livros, pra conseguir enfiar mais coisas que eu tinha certeza que eram itens indispensáveis para a minha sobrevivência, enquanto me encostava na cama, desacreditada.

– A gente vai encontrar vocês alguns dias depois, a gente vai perder a Islândia, mas o Aaron já conseguiu trocar os voos pra encontrar vocês em Helsinque. – Eu ouvi a voz de Nana pelo telefone, meu cérebro ainda tentando se ajustar com todas as notícias que ela tinha acabado de me falar. Durante alguns segundos, ok, durante alguns minutos, tudo o que a Nana falava parecia ta em outra língua que eu não sabia falar e não conseguia compreender nem um ai.

– Eu posso tentar reagendar meu voo, ir com vocês, sem problema. Eu vou ligar amanhã de manhãzinha tentar falar com a companhia. – Eu falei, quando meu cérebro voltou a funcionar, tudo de uma vez, tentando colocar em ordem todos os pensamentos e todas as calamidades que passavam pela minha cabeça. Na minha mente a probabilidade de ficar presa em um carro atolado na neve em uma estrada x no meio da Islândia aumentou para 101%, me fazendo uma vítima bem fácil como presa de hipotermia.

– Claro que não. – Nana respondeu firme. – Você vai com o Bjorn, no mesmo plano de ir conhecer a Islândia primeiro, a gente encontra vocês em Helsinque. È só o tempo que a gente precisa para ir ver a família do Aaron.

– Nana... Eu mal conheço esse tal de Bjorn. – Eu resolvi lembrar Nana o pequeno detalhe que ela parecia ter esquecido. O plano não era esse.

O plano já tinha vários anos de elaboração detalhadas, várias versões, cada uma mais aprimorada que a anterior, e eu tenho certeza que nenhuma delas incluía esse tal de Bjorn. Eu poderia até checar em todos os caderninhos gastos com todas as versões da nossa viagem só pra ter certeza que nenhum plano, nem os de achar ovelhas na Islândia incluiria ele.

O planejamento, feito para encaixar a maioria dos países em um tempo de três meses foi feito aos longos de quase cinco longos anos. Nana e eu tivemos a belíssima ideia de cancelar toda a ideia de ir pra Disney aos quinze anos, ao invés disso nós íamos tentar juntar o máximo de dinheiro possível nos três anos de ensino médio, o que ocasionou um declínio de livros novos ao mês. Os PDF's se tornaram os meus melhores amigos, mesmo com todos os problemas de vista.

Planejamento esse que deu errado. A realidade dos preços europeus se tornaram mais reais assim que fizemos dezoito anos, e mesmo com alguma ajuda familiar, aquela que deveria ter ido pra Disney, os números da nossa conta bancária não chegava nem perto do que a gente tinha planejado, e olhe que não tínhamos nem sonhado em hotéis, hosteis e albergues sempre foram as primeiras opções.

Junto com essa realidade, veio também a faculdade e trabalhos para custear a viagem. O que atrapalhou o nosso segundo plano genial, dividir um apartamento pequeno durante a faculdade. Mas entre o stress da faculdade, os empregos, e um calendário que nunca batia, a gente finalmente decidiu que após o nosso quinto período nós iriamos trancar a faculdade por seis meses.

Três meses para a Europa, três meses pra voltar e procurar todos os trabalhos possíveis para voltar a juntar um pouco de grana para o nosso apartamento. A minha vida parecia um grande plano de poupança. A última coisa que eu tinha comprado pra mim eram os casacos mais grossos possíveis, e isso eu também encaixava como gastos de viagens, que mesmo sendo uma viagem em pleno verão a Islândia ainda estaria com temperaturas absurdas para alguém acostumado com mínimas de vinte graus.

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