O Velório

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Foi um dia horrível.

Eu ouvia o tilintar das gotas de chuva caindo intensamente lá fora enquanto estava jogada naquele chão frio olhando pro teto daquela casa vazia.

Não era pra ser assim.

Geralmente velórios eram cheios de pessoas, gente que você nunca havia conhecido mas que tirava uma parte do seu tempo pra dizer adeus a alguém amado.

Mas parece que ele não foi tão amado na vida assim.

Eu sei que meu pai tinha problemas, eu vivia com medo do que o trabalho dele poderia trazer pra mim, todos os dias eu fugia de algum agiota cobrando suas dívidas ou algum mafioso o ameaçando de morte.

Meu pai havia feito escolhas erradas na vida.

E foi isso que me fez crescer com a certeza de que eu escolheria o completo oposto do que ele decidiu viver.

Não era como se ele fosse um completo idiota, meu pai cuidava de mim, pedia ajuda as vizinhas para me olhar quando tinha uma "emergência" na sala de apostas ou nos cassinos, mas nunca deixou de ser meu pai, ainda que imperfeito e complicado, ele cuidava de mim, e só de mim, ele fez o que minha mãe não teve coragem de fazer quando disse que não criaria a filha de um criminoso.

E era por isso que só havia eu ali. Apenas eu chorando pela perda dele, porque por mais que ele fosse completamente imperfeito, ele era a única pessoa e família que eu tinha na vida.

E agora ele tinha ido embora.

Pra sempre.

O pior de tudo era que aquele filho da mãe morreu por uma porcaria de parada cardíaca.

Ele fugiu tanto daqueles caras, lutou tanto, a vida dele era sobreviver, e ele conseguiu ao máximo, até que a sua merda de vida decidiu pregar uma peça nele e levá-lo por um motivo tão comum quanto qualquer outra pessoa.

Era por isso que eu chorava sozinha naquela noite fria, olhando sua foto decorada pelas flores com saudade daquele idiota que havia me criado com tanto amor em meio ao caos que era sua vida.

E foi por estar sozinha que eu estranhei a chegada daqueles dois brutamontes no velório aberto, eu conhecia bem aquela marca de espadas nos pescoços deles, eles eram dos Hwarangs...

-O que estão fazendo aqui?!-Exclamei, limpando uma lágrima que rolava em meu rosto, enquanto tentava me recompor pra xingar aquelas bestas que me importunavam até quando meu pai estava a sete palmos debaixo da terra.

-Ficamos sabendo da morte do nosso amigo lindinha, e viemos cobrar algumas dívidas pendentes de sua sucessora- dizia um deles sorrindo.

-Eu já disse que vou conseguir o dinheiro!- Eu exclamava, aquela frase já havia feito parte da minha vida por tanto tempo...ela saía fluentemente de minha boca, assim como era fácil dizer olá e adeus pra alguns, dizer que eu pagaria uma dívida era quase como bom dia no meu vocabulário.

-O chefe já desistiu de tentar extorquir dinheiro de vocês, bem, de você agora né...- ele disse para o outro e eles começaram a rir! Como se fosse engraçado perder alguém...

-Como assim?!- Eu exclamava com meu hanbok preto tradicional o arrastando no chão até eles.

Ouvi um trovão lá fora.

-Seu pai te deixou mais uma surpresinha mesmo morto fofa- o mais alto dizia, eu reprimindo minha mão de querer dar um bom soco na boca deles.

-Como assim?! Vocês não podem dar uma folga nem no dia da morte dele droga?! Eu só quero chorar em paz seus merdas!- Eu gritava descontrolada, começando a ficar mais nervosa por saber que eu não tinha ninguém pra chamar ajuda...

Não mais...

A partir de hoje se eu tivesse algum problema ou qualquer situação de dificuldade como essa, eu não teria mais ninguém pra ligar, ninguém que fosse da família, ninguém que se importasse se eu vivia ou não...

Eles riam.

-Olha só Xao, ela realmente acha que o chefe vai esperar que ela fique bem pra poder cobrar o que é dele- ele dizia com aquele sotaque chinês irritante...o chefe da máfia deles fazia isso, juntava os piores assassinos de todos os cantos do mundo pra compor o mundo perverso dele...

Se ao menos eu soubesse o nome por detrás do simples "Chefe"...se eu conhecesse o rosto que tornou minha vida um inferno desde que eu era garota...o chefe dos hwarangs...ah...que ódio eu nutria por esse nome...

-Dá pra vocês se mandarem merda?!- Gritei mais uma vez, juntando todos aqueles anos aprendendo a me defender de caras como ele e o jogando pra trás com meu empurrão.

Eles me olharam meio desacreditados, como assim uma garota franzina e indefesa como aquela tinha força pra ao menos deslocá-los de lugar?

Pois é, mais um fato pra lista de coisas que eu tive que mudar por ser filha de um agente de apostas...meu pai me ensinou desde pequena a lutar, ele sabia que eu era seu ponto fraco e não ia deixar me machucarem sem que eu fosse uma oponente à altura.

21 anos de treino e dedicação nas aulas de Karatê e Kung Fu do bairro com o Mestre Lee me deram o necessário pra saber lidar muito bem com caras como aquele, mesmo que fossem os piores assassinos ao redor do mundo.

-Parece que a lindinha tem garras Feng...- ele dizia ao amigo, tirando o pó do ombro do terno aberto que usava por cima daquela camisa branca polo, super fora de moda.

-Ou, ou, ou Xao, o chefe disse que precisa dela viva- dizia Feng a ele enquanto o impedia de vir pra cima de mim, eu estava preparada se o fizesse.

-É...você tem razão...- franzi o cenho.

-Como assim precisa de mim viva? O que vocês acham que vão fazer?- Eu perguntava com as mãos nos quadris, começando a me desesperar.

-Seu pai nos garantiu que nos daria qualquer outra coisa se não conseguisse pagar da última vez...ele até assinou um contrato...pena que o coitado não leu as entrelinhas...o chefe revistou todo o patrimônio dele, parece que ele não tinha nada que valesse a dívida que seu pai fez...então ele encontrou algo que pode não ser tão valioso quanto mas que chegue à altura...pra prestar uns serviços pros hwarangs- dizia Xao sorrindo, eu desacreditada, já constatando o que queriam dizer.

-Não...não podem fazer isso, eu não estou a venda!- Exclamei, tentando fugir, quando fui capturada por um deles enquanto o outro cuidava de meus pés, eu não tinha força o suficiente pros dois...

-Você será um ótimo preço a ser pago meu doce, o chefe vai amar cuidar de você...- Feng dizia, aproveitei que eles haviam se descuidado ao rir e consegui chutar o saco de um, ele gemeu de dor, enquanto o outro tentava ajudar, aproveitei pra dar uma cotovelada na nuca dele, os dois gemiam de dor agora enquanto eu corria como louca pra tentar salvar minha vida.

Peguei a pequena mesa de madeira que só tinha comida pra mim e arregacei as pernas dela na cara deles, achei que realmente conseguiria fugir.

Mas então eu senti o cheiro de algo muito enjoativo...havia um pano em minha boca que me trazia sonolência...

Logo eu não vi mais nada.

Até que eu acordasse na toca dos Hwarangs.

Meu Namorado é um Gumiho - Imagine Jeon JungKook Onde histórias criam vida. Descubra agora