Com certeza não era um cachorro

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A viagem foi longa para um caralho.

O tempo todo Lincoln parecia nervoso e ficava olhando pela janela, às vezes remexendo em algo em seu bolso. Acho que ele estava fazendo isso desde que partimos, mas não era novidade. Ele sempre ficava assim quando saíamos de casa.

Gwen e eu acreditávamos que ele tinha medo de viagens de carro, e que usava aquelas muletas porque havia se envolvido em um acidente quando era mais novo ou algo assim, mas sempre tivemos uma certa vergonha e medo de perguntar sobre isso, então simplesmente acreditávamos em nossas teorias.

Meus pensamentos logo foram cortados quando ouvi o som do meu celular vibrando no guarda moedas do carro. Lincoln se virou assustado.

—Eu deveria ter colocado no mudo — Falei, sinalizando para indicar que o barulho vinha do celular.

—V-você trouxe o celular?... — Ele perguntou um pouco receoso.

— É — Respondi e logo expliquei — Vou ligar para a minha mãe quando estivermos voltando. Ignora ele vibrando, são as mensagens da Gwen. A propósito, a mãe disse que depois da cidade íamos viajar para algum lugar. Para onde vamos? Algum tipo de museu ou coisa parecida?

Ele ficou um tempo em silêncio antes de responder a minha pergunta, parecendo estar em outro mundo.

—...Hã? Ah, b-bem, na verdade... Está mais pra um acampamento de verão... Ela quer que você fique lá por um tempo.

Um acampamento de verão? Isso me fez rir. A última vez que ouvi sobre um acampamento de verão foi lá pelos meus 13 anos, quando minha mãe disse que estava planejando possivelmente me mandar para um. Na época eu me animei, mas agora parecia mais uma piada.

—Um acampamento? Acho que já estou um pouco velho pra isso, mas tudo bem — Respondi rindo.

Lincoln titubeava, a boca se abria, parecendo que ia falar algo, mas então se fechava. Ele ficou nisso por alguns segundos.

—Peter... Tem... Uma coisa que eu preciso dizer — Disse de uma maneira estranha, mas acreditei que não fosse nada fora do normal, talvez fosse dizer que era um acampamento militar ou algo do tipo.

—Tudo bem… Só... Só um segundo.

Percebi que estávamos chegando no shopping e que eu precisava estacionar. Tentei me concentrar para que nenhum de meus problemas, que até agora não me fizeram errar, fizessem eu bater logo agora. Por sorte, consegui estacionar numa boa.

—Ok — respondi assim que desliguei o carro — Ah, espera, vou te ajudar — Lembrei que precisava ajudar Lincoln a sair do carro com as suas muletas, por isso dei a volta no carro, peguei as muletas dele no banco de trás e abri a porta para ele — Vem, se segura em mim — falei enquanto estendia meu braço para ele se apoiar e levantar, e assim ele fez, até conseguir ficar de pé e se equilibrar com as muletas.

Então, ele olhou fundo dos meus olhos com um ar sério. Eu nunca o tinha visto tão sombrio.

Ele respirou fundo.

—Não tem jeito mais delicado de dizer isso mas... É sobre o seu pai.

Senti uma ponta de curiosidade crescer em mim, junto com as lembranças que tinha de "meu pai" e dos sentimentos que guardava dele.

Mas tudo foi interrompido quando vi Gwen correndo em minha direção enquanto gritava o meu nome. Rla pulou em cima de mim e nós dois fomos ao chão.

Lincoln ficou nos olhando agarrados no chão, rindo como duas criançad, enquanto o pai de Gwen chegava correndo ofegante e pedindo desculpas por não ter conseguido "segurar a filha".

Entramos juntos no shopping. Tudo ocorreu como eu imaginava: Gwen entrando em cada loja que via e me arrastando junto, Adam tentando não estourar o cartão com as compras, e eu levando as sacolas dela. Paramos para lanchar tempo depois, fomos nos jogos e eu também comprei algumas coisas. 

Lincoln nos seguia, mas sempre preocupado e olhando para os lados, como se estivesse com medo de que alguém estivesse nos seguindo. Às vezes tentava me puxar para algum lugar vazio para conversarmos, mas não durava muito, pois logo Gwen aparecia e se grudava ao meu braço.

De maneira geral, aproveitamos bem o shopping.

Quando saímos, já era noite. Pegamos o carro e fomos para o hotel. Dessa vez, Gwen insistiu em ir no carro junto comigo, então Lincoln foi junto com Adam. Ao chegar no hotel, o Sr. Adam foi acertar a nossa reserva.

Justo quando pensei que iria poder me sentar, Gwen agarrou o meu braço mais uma vez e saiu me puxando para fora. Lincoln me olhou como se perguntasse onde eu estava indo, mas a única coisa que deu tempo de eu falar foi que voltaria logo.

Gwen me levou para passear nas ruas da grande NY durante a noite.

—A noite está tão bonita — Comentou Gwen.

Eu forcei minha visão em direção ao céu, tentando enxergar algo, mas não vi nada além das luzes da cidade.

—Não consigo ver as estrelas — Comentei de volta.

Isso fez a fez rir. Ela tinha uma risada fofa.

Decidimos seguir em linha reta para não nos perdermos. Com o tempo Gwen parou de ficar admirando as lojas que passávamos na frente e começou a fazer piadas com os nomes delas, eu ria de algumas e zoava com outras. 

Começamos a conversar sobre coisas aleatórias enquanto ríamos alto no meio da calçada, sem ligar para o que os outros pensavam de nós.

Logo chegamos em uma parte mais escura da rua, todas as lojas estavam fechadas naquela parte. Quando passamos ao lado de um beco escuro, senti Gwen esbarrar rapidamente ao meu braço e apertá-lo, recuando alguns passos.

Ouvimos um som que parecia um rosnado baixo, mas não dava para ver nada no escuro.

—Você ouviu isso? — Perguntou Gwen, com a voz trêmula.

—Sim, mas não deve ser nada demais — Respondi dando de ombros e me virando, pronto para ir embora.

—Hum... — Ela se encolheu contra mim — Eu acho que tem algo ali...

—Deve ser apenas um cachorro, não se preocupe — Respondi, tentando confortá-la.

Enquanto conversávamos, algo se moveu no meio da escuridão, uma grande sombra humanoide, carregando o que parecie ser uma lança.

—Peter… Peter... PETER! — Ela começou a apertar meu braço mais forte, assustada — Peter… Aquilo não é um cachorro, Peter...

Comecei a recuar, tentando trazer Gwen junto comigo, mas ela estava começando a ficar paralisada de medo.

—Gwen... Corre… — Eu disse, então percebi o como minha própria voz estava trêmula.

—O quê?!

— Corre, Gwen, corre!

— Mas-

Antes que ela pudesse intervir eu a empurrei na direção pra onde ficava o hotel, para onde ela devia correr.

SAI DAQUI, GWEN! CORRE!

Ela seguiu o impulso e saiu correndo. Quando fui correr logo atrás dela a criatura percebeu que foi vista e começou a se aproximar rapidamente com passos pesados que fizeram o chão tremer e eu caí. 

Quando me virei para ver o que era aquilo, ele saiu das sombras e se tornou visível. Um gigante de pelo menos 4 metros, gordo e ao mesmo tempo musculoso, vestindo nada além de uma espécie de tanga. Mas o mais intrigante eram os olhos do montro.

Não, olhos não.

Um olho.

Bem no meio da testa.

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