Capítulo 2

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 Em outras manhãs, quem sabe, Alfonso despertaria com boa parte do peso do corpo dela em cima do seu, era uma das manias que Anahí tinha de arranjar um jeito de tomar para si a maior parte do espaço daquela cama e ainda assim aconchegar-se ao seu peito, tratando de manter-se ainda mais colada nele sem que nenhuma distância pudesse existir.

E ele gostava, ainda que uma parte de seu braço permanecesse dormente por um tempo, gostava do cheiro adocicado dos cabelos dela impregnados em si, da forma que a observava sorrir assim que conseguia despertá-la – o que não era tarefa fácil, Anahí tinha um sono pesado, custava fazê-la levantar da cama, especialmente em manhãs nubladas como aquela. Normalmente ele a ouviria resmungar, o bom humor matinal não cobria sua irritação por ter que despertar tão cedo, mas a certeza de que no final do dia eles estariam unidos ali novamente era o que valia, no fim das contas.

Mas aquela não era uma simples manhã como as outras. O estranhamento de Alfonso veio logo depois de sua confirmação ao notar o seu lado na cama vazio, os lençóis ainda permaneciam aquecidos mas Anahí já não estava mais lá. Ele sempre despertava e levantava primeiro que ela, principalmente nos últimos meses devido o aumento com sua carga de trabalho, um engano para quem pensava que por advogar em um dos escritórios do pai tinha livre escolha para chegar como bem quisesse no horário em que lhe fosse mais conveniente, muito pelo contrário, por ser um dos herdeiros, as responsabilidades caiam três vezes mais em cima de si, e não era como se não gostasse da profissão que exercia, cursar direito fora uma escolha, apesar da forte pressão que o pai descarregou em cima dos filhos, tinha sido uma escolha, e as consequências, como tudo na vida, vinham carregadas, especificamente nas discussões infindáveis que vinha travando com Anahí.

A última na noite passada tinha terminado, como quase todas as vezes, naquela cama. E era na cama que muitas vezes eles recomeçavam. Ele, cheio de promessas de que seria a última vez, de que poderiam continuar jogando no esquecimento qualquer desavença, porque o que tinham significava mais. E ela, cansada, decidia tentar. Tentar por eles. Alfonso reconhecia que não fora uma ou duas discussões como aquela. A última ainda bastante clara era avaliada naquela manhã, e o lugar vazio ao seu lado na cama só confirmava muita coisa.

Alfonso não pensou duas vezes antes de levantar e sair do quarto as pressas, caminhando pelo corredor extenso e descendo as escadas de dois em dois degraus até chegar na sala e encontrar as malas prontas próximas a porta. Ele limitou-se a caminhar até elas e olhou para onde os saltos do sapato dela em contato com o piso faziam barulho para encontrá-la saindo da cozinha com uma xícara de café entre as mãos, o contato olho no olho durou o suficiente até que ele tivesse a coragem para dizer algo.

Alfonso: O que isso significa?

Anahí: Significa que eu estou lhe deixando, e que estou indo embora. Esperei você acordar para não soar irresponsável da minha parte, e não para que você tentasse me convencer do contrário.

Porque nada do que ele dissesse convenceria Anahí do contrário. Olhando-o nos olhos, enquanto levava a xícara até os lábios solvendo um gole do líquido fumegante, foi como ter ainda mais certeza do que faria.

Alfonso: Você está de cabeça quente... Amor... – Vacilou entre as palavras, tomado por um arrepio súbito. – É uma crise, casais passam por isso, nós vamos superar isso juntos. – Ele falou, tentando convencer a si próprio, talvez sem querer acreditar que a noite anterior fora apenas uma despedida.

Anahí: Não há o que ser superado, você diz que me ama, mas nem sabe realmente o que eu sou. Olha o que me tornei. – Repousou a xícara sobre o aparador. – Olhe nos meus olhos, tente buscar algum resquício daquela garota que vomitou no seu carro, aquela Anahí que adorava tequila e te puxava para transar no primeiro banheiro vazio. – Ela falou com uma calma assustadora, cansada demais para expressar qualquer tipo de emoção. – Olhe nos meus olhos e veja o quão infeliz estou dentro dessa casa, dessa prisão social que seu pai criou e você aceitou.

Ventos de OutonoOnde histórias criam vida. Descubra agora