Todos os dias quando Camila acorda, implora para não ver o mesmo teto de telha mofada de sua casa, mas naquele dia não teve como fingir que não iria ver o de sempre, uma gota gelada de chuva caiu bem no meio de seus olhos, mostrando que a realidade era aquela e ela teria que aturar.
Finalmente abriu os olhos e encarou a mancha de água na telha, franziu o cenho e se sentou.- Mas um dia nesse “pulgueiro”.
Camila andou até o espelho rachado no canto da sala e se olhou. Achou imperfeições em seu rosto e espremeu a espinha no queixo. O relógio ao lado do espelho mostrava que já passava das 5h da manhã e se ela não começasse a se arrumar perderia o café da manhã no colégio.
No único quarto da casa dormia seus pais e seus dois irmãos gêmeos de três anos. Ela passou pela cama improvisada no chão e abriu o armário da família toda, pegou seu moletom escolar e a roupa íntima que sua família nunca poderia comprar e foi tomar banho. Camila dormia no sofá desde que completou 12 anos, porque estava velha demais para dormir no meio de seus pais. Ela não brigou, queria mesmo ter seu próprio canto, mas com o passar dos anos se tornou um pesadelo, sofria de dores nas costas e passava frio quando chovia a casa não tinha janelas e apenas um pano velho impedia olhares indesejados.
Camila saiu do banho, guardou um balde que usava para tomar seu banho quente e foi se trocar. Já pronta, saiu de casa sem ao menos se importar em arrumar onde dormia.
Seguiu pelo caminho de sempre e olhou para todos os lados com medo de ser reconhecida. Pegou o ônibus que a deixava na porta do colégio e seguiu encostada na janela pensando em quanto tempo mais teria que aguentar essa vida medíocre que tinha.Ela chegou ao colégio, tomou o café da manhã antes que seus amigos chegassem e os esperou sentada no banco ao lado do portão. Assim que eles chegaram, foram para a sala e, como sempre, perturbaram todas as aulas e na hora do intervalo fizeram bullying com uma garota que usava óculos e tirava as melhores notas.
Após as aulas ela se despedia de todos e ia para uma praça perto do colégio e esperava um homem de terno, eles conversavam, almoçavam e depois iam para um hotel onde ficavam 2 horas exatas. Depois ele jogava notas de cem na cama e ia embora deixando Camila sozinha.
Ela voltava para casa e encontrava seus irmãos almoçados e sua mãe pronta para pegar o segundo turno de gari.
Apesar de Camila odiar sua vida ela amava os irmãos, para ela foi à única coisa boa em sua vida durante todo esse tempo, ela fazia gosto em cuidar deles e sempre fazia de tudo para que nunca faltasse nada para eles. Dizia aos seus pais que olhava uma senhora por duas horas depois do colégio e o dinheiro que trazia era a diária que ganhava claro que Camila não dava tudo aos seus pais, ela dava apenas uma nota de cem e guardava as outras dentro de um saco plástico dentro do sofá.No fim do dia, quando seu pai chegava, a casa estava limpa, a janta pronta e os gêmeos dormindo. Camila já estava acostumada com esse roteiro diário e sempre ia dormir com a certeza que o dia seguinte seria igual.
Mal sabia ela que depois de se despedir de seus amigos e fosse seguir para seu compromisso, duas de suas amigas a seguiriam querendo fazer uma brincadeira. Surpresas observaram ela conversar e almoçar com o homem de terno e depois ir até o hotel, onde incrédulas esperaram às duas horas exatas até Camila seguir para sua casa, onde suas, até então, amigas a flagraram entrando em casa. E, para piorar, fotografaram cada passo dela naquele dia e postando na rede social a verdade sobre Camila.