3: Kurozu

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Embora a resposta de Tio Zam tivesse sido basicamente imediata, o retorno levou boas horas, o suficiente para que Rowlet tivesse se perdido em tamanho marasmo. Revistas ficavam na sala de espera para outros clientes em busca de assuntos com a guilda, mas ver tudo de usual em sua vida trocado por Pokémon era um choque demasiado grande, ainda.

Criaturas iam e vinham, oferecendo comidas prontas e até mesmo fazendo perguntas a Zam; inclusive a dupla da caverna de antes chegou, exaustos e doloridos; almejando por descanso. Mal olharam à coruja sequer.

-Com licença. -diz uma voz questionável- o Senhor Zam está?

Um figura alta, muito alta, parava bem em frente à grande entrada, ocupando todo o portal. A sombra que misturava ao laranja do fim de tarde se estendia até o fim do corredor, cobrindo o Rowlet por ser tão pequeno também. Na silhueta, brilhavam olhos amarelo como ouro que perfuravam a ave com sua inexpressividade, cujo terror era intensificado pela espera de algum ataque, mas nenhum vem.

-Olá, Kurozu. Agradeço por ter respondido ao nosso apelo. -pela naturalidade que responde, parece que outrora foram conhecidos.

-É este o tal Rowlet? -aquele gigante rochoso move abaixa seu corpo para poder entrar sem bater sua cabeça.

-Sim. Pedirei que cuide dele enquanto resolvo assuntos pertinentes à guilda. Mantenha-o seguro.

-Certo.

E ele vira o rosto a Rowlet depois de responder de forma tão morta e macabra. Era um golem intimidador demais para ser confiado, mesmo tendo sido por alguém responsável.

Sua mão grande e rochosa, que podia fechar inteira sobre o corpo da ave, estende ao parceiro de uma forma suspeita e de certo modo, amigável.

-Venha cá. Vai te poupar energias.

-Como? -ele questiona timidamente, sequer podendo o encarar.

-Irei te carregar até o Slak-inn-g, para que ninguém o machuque.

Com medo e ainda relutante em alcançar a mão, ele pergunta:

-Você... É da guilda? Que vai proteger mesmo?

-Sim. -sua voz etérea solta um riso- É meu dever, afinal. Eu lhe garanto.

Sem o que dizer em resposta, a ave coloca uma pata e depois outra na palma da mão do tal gigante de rocha que parecia sólido como o piso. Ele ergue e sai da base tão grande da guilda, carregando Rowlet como se nenhum peso tivesse. A cidade dominada pelo crescente anoitecer mostra uma forma diferente vista por uma outra perspectiva: lamparinas acendiam sob as estradas de tijolos com chamas vindas de Chandelures dedicados, espalhando o brilho alaranjado pelo escuro.

-É diferente de noite... -o Rowlet dá seu palpite, boquiaberto.

-Sim. A cidadela de Autumme é uma das poucas que não dormem cedo. Tem gente que chega aqui na madrugada em busca de algum abrigo.

-E o que fazem com elas? -Rowlet diz.

-Ajudamos pelo preço certo. Sabe, não somos o melhor lugar para comércio, mas somos a base da maior guilda da região, então já sabe, não é?

Rowlet assente com a cabeça enquanto torna a olhar o brilho hipnotizante. Esse novo mundo que simplesmente escolheu lhe jogar sem razões consegue ser parecido com o seu anterior. Lojas, comércio, luzes de noite e civilizações surpreendentemente avançadas para Pokémon; espécies que até então eram apenas imaginário humano.

Ao chegarem naquela fachada noturna da estadia, um aroma lhe traz conforto instantâneo. A sensação de paz e abraços quentes vinham com o cheiro suave de lavanda pelo chão de madeira bem arrumado. A coruja estava sonolenta demais para olhar ao redor os degraus que levavam a áreas novas que pouco lhe interessavam, no fim.

-Boa noite, Kurozu. -uma boina bege recebe o gigante com uma voz bem infantil.

-Olá, Vann. Ainda não arranjou um banco? -diz com uma risada.

-Não, não achei. -com esforço, o tal Smeargle se apoia na borda do balcão com muito esforço em seus bracinhos listrados- O Seu Zam me chamou e falou de alguém. É ele?

O Rowlet sem graça olha para o outro lado para se distrair e deixar que a resolução do caso ficasse nas mãos gigantes de Kurozu, afinal, tinha medo de fazer algo com equívoco em um lugar novo e com guias justamente pra lhe ajudar com sua iniciação.

-Sim, é ele. -Kurozu explica.

-Aqui, é no quarto seis. O Seu Zam falou sobre as despesas, pra depois.

-Certo. Mande meus agradecimentos a ele por mim. Que receba luz! -Kurozu se despede.

-Que receba luz! -responde Vann.

Instigado com curiosidade, Rowlet pergunta:

-O que foi isso? -diz enquanto aceita a chave e a segura em seu bico.

-O quarto? É logo à direita, no primeiro andar.

-Não. -Rowlet se impõe- É sobre aquela frase... a despedida.

Seus olhos inexpressivos por um momento indicaram algum tipo de compreensão e entendimento. A figura enorme parecia ter um coração bondoso condizente com seu tamanho e isso fazia Rowlet repensar. Eram tão humano quanto os que conversava antes, talvez até mais.

-É uma despedida bem comum em Geniamau. Ela deseja luz ao próximo, de forma que ele nunca fique escondido, perdido e desamparado. Faz sentido, não faz?

Rowlet faz que sim com o bico novamente enquanto entra em seu cômodo tão pequeno mas ainda tão gostoso de estar. Em um canto, uma pequena cama de palha junto de um gaveteiro, um cesto e um poleiro no canto oposto do quarto. Era nessas horas que se dava conta que era uma ave agora.

A decoração abarrotada de verde musgo do tapete circular ao teto lhe fazia sentir em casa mais do que sua antiga casa. O mundo novo era agradável após o choque inicial.

-Zam escolheu bem pra você, pelo visto. -diz Kurozu, espiando pela porta com sua cabeça pequena.

-É bonito... -diz Rowlet. Demasiado conforto lhe fazia repensar em alguns assuntos.

-Bem, então irei voltar. Foi dito que Fir e sua equipe irão vir amanhã para lhe buscar. -explica.

-Certo. -ele confirma enquanto deixa a chave no gaveteiro.

-Bem, até um dia. Que receba luz, Rowlet!

-Que receba -porém, ele se interrompe- Kurozu, espera!

O Golurk não fecha a porta delicada por completo.

-O que foi?

-Pode falar pra eles que... -era difícil encontrar palavras para este momento. Tinha aceito uma decisão difícil e marcante demais para algo que lhe definiria de vez- Eu arranjei um nome. Pode falar isso para o Zam e Fir?

-Oh, certo. Tudo bem. -seu tom compreensivo completa- E qual seria este?

Depois de tanto tempo de silêncio, de ver o mundo novo que o cercava que era tão semelhante e também tão diferente do que vivia, Rowlet enfim decide seu caminho com uma palavra que mudaria sua identidade por definitivo:

-Tori. -responde- Me chame de Tori.

Pokémon Mystery Dungeon: O Resgate da EsperançaOnde histórias criam vida. Descubra agora