Capítulo I

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Sangue.

Havia sangue por todos os lados; paredes, teto, chão, até mesmo em mim. Encarava minhas mãos sem conseguir desviar os olhos do que eu havia feito. Ainda estava quente, havia acabado de acontecer.

Sabia que você faria o que era preciso.

Me virei desesperadamente, mas não havia ninguém, ao invés disso, apenas o teto do meu quarto estava lá, quieto assim como estava quando havia ido dormir.

Relaxei minhas feições deixando escapar um suspiro, sentando-me no monte de tecidos felpudos que chamava de cama. Pensando bem, faziam alguns anos que não conseguia ter sonhos ou pesadelos, porém em compensação, este havia sido bem real, quase como se já tivesse vivido aquele sentimento em algum momento em minhas centenas de anos de existência, mas não conseguia lembrar. Minha janela redonda mostrava nada mais que o infinito estrelado de todos os dias, silencioso.

— Preciso de comida. – declarei por fim, levantando e caminhando em passos preguiçosos até meu estoque. No meio do caminho, acabei por tropeçar, me agarrando à parede com os olhos arregalados pelo susto. — Me desculpa!

— ...Ein? Ah, Trívia... – Essa era minha coruja gato, Luka, preguiçosa como sempre, esparramada no chão da cozinha. Dei um leve sorriso pelo seu bocejo. — O que houve, vai descer hoje?

— Infelizmente sim – suspirei, dando uma última checada na dispensa. — Precisamos fazer compras de novo.

Se tinha uma coisa exaustiva sobre morar no espaço era que conseguir suprimentos era sempre exaustivo. Pousar em planetas era complicado além de estritamente proibido pra minha pessoa.
Sem muita coragem, por ter acabado de acordar, amarrei meus cabelos desgrenhados no topo da cabeça, escovando os dentes enquanto procurava uma vestimenta apropriada pra fazer compras. 

— Posso ir dessa vez? Não aguento mais ficar presa nesse chalé flutuante! – choramingou Luka, agora pousando sobre a tampa do vaso sanitário e me olhando com aqueles olhinhos fofos de derreter sua alma pra fora. Me dei por vencida mesmo contrariada, ouvindo seu gritinho de felicidade.

— Mas vamos ser muito cuidadosas. Sabe que a Patrulha Armada está por quase todas as galáxias hoje em dia. – ela pulou de onde estava, agora esfregando sua cabeça na minha canela, ronronando. — Argh, não consigo encontrar meu manto!

— Por que não vai assim do jeito que está?

— Alguns planetas não apreciam nudismo em locais públicos. Não queremos chamar atenção, lembra? – ela bufou. Luka nunca gostou de regras sociais e, admito que nem eu.

Depois de ter encontrado meu manto de cada dia, minha companheira pulou em meus braços e logo minha casa estava vazia.

Abrimos os olhos e lá estávamos, no centro comercial de Chiaki 12, o planeta comercial.

— Você tinha razão quanto às patrulhas, Trívia – sussurrou Luka descendo dos meus braços, parecendo ampliar sua visão pelo território. Podia-se mesmo perceber que haviam muitos soldados da Patrulha rondando por entre o tanto de civis naquela área. 

Tratei de tocar o topo da cabeça da minha amiguinha, fazendo-a disfarçar-se de uma criança humana.

— Fique de olho, pode falar comigo se algo acontecer, vou estar escutando. – Ela concordou, dando pulinhos de alegria e correndo pra longe com aquele corpinho robusto. Ri com sua empolgação e me pus a procurar o que precisava para a dispensa.
Após um tempo andando e com os braços já cheio de cestas – por não poder utilizar simples magia de levitação –, já estava procurando Luka com os olhos naquela área movimentada.

— Promoção de arlimos, moça bonita! Cinco por apenas dois kaus – uma grande pata de galgariano pôs-se a minha frente, chamando atenção para sua barraca no meio da multidão. Caminhei até o mesmo, observando a mercadoria. – Se não for desrespeitoso, devo dizer que é bem raro encontrar humanos por Chiaki 12, fora os soldados da P.A, claro.

— Imagino o porquê – ironizei, pegando um arlimo vermelho, o analisando. — Quanto está o quil-

Fui interrompida por uma de suas seis patas que agarrou meu pulso ocupado com a fruta, me fazendo encarar sua cara de lagarto espacial.

— A senhorita por um acaso não seria uma bruxa, seria? Esse cheiro… – grunhi baixo por sua cara chegar perto ao meu pescoço, fungando — Cheiro de magia ancestral… huhuhu.

Ri nasalmente, puxando meu pulso de suas garras escamosas, pondo a fruta calmamente no local novamente em meio às outras.

— Está acusando uma humana comum de algo assim justamente quando soldados da P.A estão à espreita? Que falta de noção, senhor vendedor. – Ele finalmente afastou-se, parecendo agora preocupado. — Deveria te reportar para um deles?

— N-Não precisa!

— COM LICENÇA! – Acenei para um soldado qualquer que veio caminhando em nossa direção passando pelos civis. O vendedor galgariano agora suava frio, acompanhando o capacete negro brilhoso e a metralhadora laser do guarda a sua frente.

— Está tudo bem por aqui? – Virou seu capacete pra mim. Fiz minha melhor cara de decepcionada enquanto chamava atenção de toda a rua de mercadorias.

— N-Nada, seu guarda – disse trêmulo o lagartão, ao ver outros soldados distantes ao redor da cena. — N-Não quis assediar e nem ser preconceituoso com a senhorita, eu juro! – Cruzei os braços, enquanto o soldado se aproximava do comerciante fazendo-o suar frio.

— Você sairá com uma advertência, galgariano. E disponibilizará alguns arlimos pra essa moça – sorri radiante, apesar de ter chamado atenção de todo o mercado. 

Agradeci ao soldado que se retirou sem mais uma palavra, dispensando os seus outros amigos e fazendo todos voltarem a cuidar de suas vidas. Voltei a olhar o vendedor que se encolheu um tanto, porém semicerrava os olhos como se me dissesse que sabia bem o que eu estava fazendo. Bufei, lhe entregando três kaus.

— Quero dois quilos de arlimos. Pra ontem. – o lagarto ficou chocado por eu ainda ter lhe dado dinheiro por isso, tratando de encher cestas.

Ao menos com toda essa confusão, teria ao menos um pouco de paz quando viesse comprar aqui outras vezes. 
Pegando as duas cestas com as frutas, peguei meu rumo, andando em direção à um pequeno beco, na intenção de chamar Luka de volta, as compras já estavam pesadas demais pra carregar sozinha e sem magia. Pus dois dedos nas têmporas fechando os olhos.

— O que está fazendo? Precisa de ajuda?

Me assustei, encostando na parede. 

Era o soldado de antes.

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Olá, boa noite senhoras e senhores amantes de fantasia ou curiosos ~hehe
Cá estou eu, postando esse livro original. O que vocês acharam? Meio confuso? Espero que todos tenham gostado e semana que vem tem mais :3

Beijos de luz~

TríviaOnde histórias criam vida. Descubra agora