Capítulo 3

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Uma ardência percorre minhas bochechas, braços e pernas, quando galhos e outras plantas na mata se choca em meu corpo, enquanto nos movimentamos floresta adenttro. Minha perna dificulta minha movimentação, e somos obrigados a nos abrigar em uma pequena fenda, que se assemelha como toca de algum animal. Eu ainda me sinto tonta, e o homem examina minha face, meus braços e logo minha perna esquerda. Ele me dá um pouco de água de seu cantil pra beber, e percebe o quanto estou febril. Ficamos em silêncio quando ouvimos passos, e vozes a nossa procura. A expectativa de que eles não sejam observadores o suficiente, é o que nos resta pra permanecermos vivos.

A arma que o homem conduzia, perdeu-se assim que entramos na mata e agora não tínhamos nada com o que nos defender. Enquanto esperamos o perigo passar, eu olho para o seu rosto. Muitos sentimentos se misturam em meu peito, mas além da desconfiança, me sinto assustada e anestesiada ao fitar os olhos daquele que eu nem imaginava existir até o chinês mostrar sua foto mais cedo. Após alguns minutos, o silêncio volta a tomar conta da floresta e o homem me olha nos olhos pela primeira vez, desde que me tirou do carro.

— Você! — eu sussurro ofegante, com surpresa em minha voz. Ele se retrai do meu olhar e tenta se focar em cuidar do meu ferimento, pra que eu seja útil mais tarde.

— Se não cuidarmos logo desse ferimento, você vai morrer em um dia. — ele diz, enquanto o sangue escorre ainda mais. A adrenalina que antes se fazia presente não me deixando sentir mais do que um leve formigamento na perna se vai, deixando em seu lugar uma queimação que parece rasgar minhas veias lentamente. Ele varre o ambiente ao redor, e ao encontrar uma lasca de madeira, usa como um torniquete em minha perna, junto de um pedaço de sua camisa pra estancar o sangue. Eu me sinto tão fraca, que ao invés de gritar, eu solto um suspiro de alívio quase inaudível.

— Isso deve agüentar até encontrarmos um lugar seguro. — ele diz me fitando sem jeito por alguns segundos. A noite não demora a chegar e meu corpo parece estar entrando em colapso, pois é possível ouvir o tilintar dos meus dentes devido ao frio que aumentou incessantemente nas últimas horas. A fogueira que ele fez há alguns minutos dá sinal de que logo irá se extinguir e que não durará até o amanhecer, então ele se aproxima e me abraça, sabendo que preciso ficar aquecida. Meu corpo relaxa e em minutos adormeço em seus braços, esperando que o amanhã traga algumas respostas a tudo que tem acontecido em minha vida, desde que Martin me deu aquele bendito telefonema.

Meus olhos ardem quando os abro, e levo dois segundos pra focar o ambiente ao meu redor. Posso observar o homem que me salvara a vida, sentado na entrada do refúgio em que nos encontramos, e é difícil acreditar que ele seja meu pai. Um pai que eu só conhecia de histórias contadas por meu padrinho Tom. As mesmas histórias que as crianças costumavam ouvir antes de dormir. Só que eu não era mais uma criança, e as histórias já não me bastava pra entender o passado da minha família. Movimento-me com cuidado, embora minha perna esteja dormente devido a posição durante a noite. Mas não consigo passar despercebida, no entanto. Sento-me ao seu lado e não digo uma palavra, embora milhões de perguntas atravessem a minha mente em questão de segundos. Eu o fito apreensiva por um pouco.

— Quando eu conheci a sua mãe, nós estávamos em lados totalmente opostos. Espiões americanos. Espiões russos. Ambos possuíamos informações que não podiam ser compartilhadas. — ele pausou brevemente com cansaço, e depois continuou. — Nós nunca deveríamos ter nos envolvido. Mas eu a amava demais.

— O que aconteceu? — eu pergunto agora interessada na história da qual também me pertence.

— Fomos descobertos, e ela foi acusada de repassar informações confidenciais pra mim.

— E ela passou? — minha voz saiu fracamente, enquanto observei um sorriso triste cruzar seus lábios rapidamente.

— Sim. Mas eu nunca usei as informações que ela tinha. No entanto, pro governo isso não bastava. Eu fiquei sabendo alguns dias depois que existia um plano pra matar nós dois. Depois disso eu resolvi forjar a minha morte, e dei um fim em qualquer indício que pudesse colocá-la como alvo. — ele pausou na expectativa de que eu estivesse acompanhando seu raciocínio.

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