III

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Definitivamente bem

Fecho a porta do meu quarto jogando minha mochila em um canto qualquer, ainda escutando Olga falar sobre me alimentar e blá blá o que só concordo para fazê-la me deixar em paz.

Me jogo de costas para o colchão pensando que fogueira só me remete a queimar corpos, as pessoas fazem festa para isso agora? Emmy falou como se uma festa de fogueira fosse muito comum e claro que eu fingi saber muito bem o que era, mesmo não fazendo a minima ideia, o que agora está me enlouquecendo. Cubro meu rosto com os braços sabendo que ir é a maneira mais fácil e rápida de acabar logo com isso.

Me sento tão rápido que fico um pouco tonta e começo a praguejar por ter cochilado, forço meus olhos no relógio em cima da cômoda e vejo que faltam trinta minutos para o horário que combinei de encontrar Emmy na praça. Resmungando mais me levanto tirando minhas roupas enquanto vou em direção do banheiro.

Com a única iluminação sendo a luz do luar entrando pela janela, meus pés se embolam em uma blusa me fazendo quase cair de cara no chão, engulo minha vontade de rasga-lá em pedacinhos entrando no banheiro deixando a porta aberta mesmo e tomo banho super rápido na água gelada. Saio enrolada em uma toalha preta felpuda, acendo a luz e abro meu guarda-roupa, puxo a perna de uma calça jeans preta, tendo que dar alguns passos para trás, pois com ela vem um monte de outras roupas.

Chuto algumas peças e pego uma blusa de alcinha que não está amassada, apanho também minha jaqueta preta de couro, sendo ela a única peça em um cabide. Depois de pegar uma lingerie limpa troco de roupa rapidamente e calço o meu coturno colocando uma adaga bem escondida entre ele e a barra da calça, solto meus cabelos que caem em ondas por minhas costas. Olga me vê assim que desço as escadas, com o olhar de sermão em seu rosto me observa o que me faz pensar se ela estava me esperando e antes que possa dizer alguma coisa estou abrindo a porta e saindo.

Dirijo ultrapassando os limites de velocidade, me sentindo atrasada mesmo que ainda falte vinte minutos para as onze horas. As árvores envolvidas na noite se estendem por toda estrada me causando desconforto, acho que por saber o que elas escondem.

Não demoro muito a chegar, estaciono em frente de uma loja e desço atravessando a rua até a praça. Não foi preciso esforço para encontrar Emmy, um cara bem alto em pé com as mãos agitadas e uma garota sentada em um banco balançando os pés olhando em direção contrária a ele, chamam toda a atenção ainda que sejam os únicos ali.

Ela me vê primeiro e se levanta acenando ficando de costas para o rapaz que agora também me olha, os dois em extremos opostos, enquanto ela me espera com um enorme sorriso, ele me olha com uma grande carranca. Mantenho minha expressão neutra ao dar mais alguns passos até me aproximar deles, noto que possuem algumas características físicas semelhantes, o que me deixa mais em alerta.

De supetão Emmy se aproxima me dando um abraço rápido fazendo meu corpo rígido, dou um meio sorriso sem graça quando me solta pensando que se eu não tivesse percebido meio segundo antes que não me atacaria, ela estaria morta, levando tudo a perder.
Olhos acinzentados me observam como um falcão, levanto uma sobrancelha para ele que de algum modo consegue fechar mais ainda a cara.

-Oh, quase esqueci de você. -Emmy fala indo em direção do rapaz que bufa. -Clarissa, esse daqui tentando fazer cara de mau é meu irmão Aaron, mas não liga que é só fachada, você percebe ao olhar a cara de prisão de ventre dele. -fala sorrindo cutucando seu braço que a olha estupefato sendo ignorado, observo com interesse a interação deles.

Com Aaron ainda em pé, Emmy me chamou para sentar no banco com ela, dizendo que seu irmão havia lhe dito que iriamos muito cedo e como ela não tinha meu número não deu para marcar mais tarde. Aceno com a cabeça achando estranho, cedo? Estou ficando é com sono. Então começa a narrar seu dia, que leu um livro de fantasia depois que sai da biblioteca, conta sobre suas duas horas se arrumando, em como ela ficou uma hora para decidir entre uma jardineira jeans cumprida e outra não, optando por um vestido rodado azul porque combinava mais com seu óculos e sandália de pedrinhas da mesma cor, eu digo que foi uma boa escolha e ela continua.

Sem que eu perceba me perco em pensamentos, as coisas estão indo bem, não achei que conseguiria me aproximar dos Carter tão rápido, Emmy parece ser uma garota legal, mas muitas pessoas na superficie são, então não me deixo influenciar por isso e ter algum arrependimento por estar usando-a, o importante é que estou cada vez mais próxima dos meus objetivos.

Sorrio de canto, desvio os olhos para minha frente vendo Aaron não tão distante encostado em uma árvore com as mãos no bolsos da calça e olhos em mim com uma expressão não tão fechada como antes, meu sorriso morre rapidamente. Começando a ficar irritada com ele me encarando, olho-o de volta esperando que pare, ele não o faz, entendo como um desafio e ficamos assim por minutos. Por mais que eu tente evitar, acabo reparando detalhes de seu rosto. Seus cabelos loiros encaracolados caem em sua testa, sobrancelhas um pouco mais escuras, olhos acinzentados com grandes cílios que expressam algo desconhecido por mim, o nariz reto, lábios rosados de um tamanho médio, sua mandíbula está travada o que me faz perceber uma cicatriz bem fina no lado esquerdo do seu rosto, que vai da lateral de sua bochecha até o final do rosto. Veste uma blusa fina de manga cumprida cinza que delinea seus ombros largos e braços um pouco grossos, uma calça jeans rasgada nos joelhos e um Allstar preto.

Abro um sorriso sádico ao ver um pequeno rabo atrás do pescoço de Aaron, que franze as sobrancelhas confuso e então arregala os olhos se afastando rapidamente da árvore meio pulando enquanto chacoalha desesperado a blusa, Emmy começa a gargalhar e olho com diversão a pequena lagartixa cair da costas dele e correr para a grama. Ele vem marchando em minha direção com os olhos cheios de raiva, endireito a coluna, levanto o queixo olhando-o em desafio, ele para em minha frente e Emmy tenta dizer algo, mas é cortada por um olhar irado. Ficamos nos encarando por segundos, as mão em punhos, os lábios em uma linha reta, sua mandíbula tão travada e seus olhos ferozes com tanta raiva que me pergunto se o motivo é apenas a pequena lagartixa, por fim ainda me olhando ele respira fundo relaxando o corpo e todo aquele turbilhão some, me fazendo franzir levemente as sobrancelhas. Aaron abre a boca e pela primeira vez escuto sua voz, grave e um pouco rouca, fala para Emmy que deveríamos ir desviando finalmente seu olhar do meu.

Fiquei sem saber o que pensar e pensando muitas coisas, e por hora tudo o que acabou de acontecer foi jogado de lado em minha consciência quando ele voltou a me irritar. Primeiro o bonito queria dirigir meu carro o que neguei rudemente, depois queria que a irmã fosse com ele no monstro que chama de moto fazendo ela negar com veemência, dizendo que iria comigo. Como não sabiamos direito a localização da festa acabou com ele sendo o guia dirigindo na frente, só que ele está indo tão rápido e com as ruas pouco iluminadas mal o vejo ou então quando percebo está a centímetros de distância me fazendo não querer desacelerar.

-Ele só está chateado. -Emmy fala diminuindo o volume do rádio que toca algo que não conheço, me deixando confusa por dar justificativas ao comportamento dele, o que ela erroneamente interpreta como interesse. -Ele ainda acredita que sou uma criança e que precisa me defender de más companhias. -continua olhando para a janela.

-E a má companhia presumo que sou eu. -falo o óbvio pensando que ele não está nem um pouco errado e que talvez aquela raiva em seus olhos fosse toda por minha causa, mesmo que eu ainda não tivesse feito nada.

-Mas eu não acho isso! -fala rapidamente virando a cabeça em minha direção. -E quando ele te conhecer vai achar o mesmo. -diz com convicção me fazendo olhar rapidamente para ela que sorri, olho para as costas largas de Aaron a alguns metros em sua moto pensando em como sua irmã pode confiar tanto assim em mim e no quanto ela não poderia estar mais errada.

Em sua almaOnde histórias criam vida. Descubra agora