Dia estranho.

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Aesop Carl acordou naquela manhã com um raio de sol batendo em seu rosto. Ele não havia dormido bem na noite passada, pois fora atordoado por mil e um pesadelos, cada um mais estranho e bizarro que o outro. Nunca agradeceu tanto aos céus por ter acordado.

Sentou-se na cama, e parou para refletir sobre oque houvera sonhado. Basicamente, pétalas de rosas vermelhas caindo, e quando encostavam no chão, se tornavam pingos de sangue e de fundo podia se escutar aplausos. Esse foi o pesadelo mais frequente de todos que teve. Sim, essa rotina com sonhos ruins já estavam durando cerca de quase um mês, atordoando o pobre garoto. O que diabos aquilo significaria? Que sentido teria? Carl sequer podia taxar como a explicação e culpa de todos esses pesadelos os filmes, pois ele odiava mais que tudo ver filmes.

O alarme despertou alegando ser sete da manhã, horário esse que Carl se levanta para se arrumar e ir trabalhar na agência funerária. Logo a rotina começou a fluir: fazer o café, se arrumar com o uniforme cinza, e se apresentar na agência até no máximo às oito da manhã.

Antes de sair de casa, Carl notou que estava péssimo. As olheiras estavam visíveis, seus olhos estavam caídos, e ele realmente estava com a aparência de quem iria desmaiar a qualquer instante. Nem sequer aquela mudança de última hora no cabelo que muitas vezes salva o rosto com cara de morto ajudou. A situação ali estava péssima. Aesop suspirou, e saiu de casa.

As ruas que ele caminhava, continuavam as mesmas- monótonas, com pessoas apressadas e ignorantes. Faltando apenas dobrar mais uma rua para chegar na agência funerária que trabalhava, totalmente perdido em seus pensamentos, Carl deu de cara em um poste. Ótimo, seu dia já havia começado perfeito. Um panfleto que estava colado caiu aos pés do garoto, que murmurava xingamentos de forma inaudível enquanto se rocompunha do choque causado pelo impacto. Ao conseguir voltar com o equilíbrio, se levantou segurando o panfleto o lendo.

"O maestro, tenor e ator Joseph Desaulniers se apresentará a semana inteira no teatro de nossa cidade. Venham apreciar esse momento!"

Carl revirou os olhos, esperando que fosse algo mais importante. Amassou o papel até virar uma bolinha, e jogou no lixo mais próximo. Finalmente virou a rua, e entrou na agência funerária, logo sendo abordado por uma funcionária encarregada com os papéis de óbitos e de pedidos da família do falecido.

- Aesop, bom dia! Já começamos cedo aqui hoje! - Ela o recebeu com um sorriso caloroso. As vezes, Carl tinha vontade de perguntar à ela de onde ela tirava tanto entusiasmo e energia para falar de gente morta. - Era uma mulher, se chamava Margaretha Zelle. Só por informação adicional, ela era uma das dançarinas que trabalhava nesse teatro de frente a nossa agência funerária. Inclusive, já ficou sabendo que Joseph Desaulniers vai vir mostrar seus dons maravilhosos nesse teatro? Maravilhoso! - A funcionária fez olhos encantadores enquanto provavelmente pensava em Joseph.

- Vamos focar no trabalho, por favor. Qual foi a causa da morte?

- Ela foi perfurada várias vezes na garganta, por um objeto que até agora a perícia não identificou, mesmo após a autópsia. O técnico em necropsia mostrou todas as perfurações, e mesmo assim, a médica legista não conseguiu encontrar a arma que se encaixasse nessas perfurações. Ela disse que lembra muito o formato de um espeto de churrasco, mas a polícia repassou que a mulher sequer tinha ido em alguma churrascaria ou na casa de um amigo que poderia talvez ter feito um churrasco. Talvez o assassino queria sair um pouco do clichê da faca ou do revólver.

- Mais uma coisa... Aonde o corpo foi encontrado? - Carl estava começando a ficar interessado. Eram poucos os casos de vítimas na qual ele se interessava, e esse era um desses casos.

- Na casa dela, dentro do closet. Também é dito aí nos papéis que foi feito exame sexológico para saber se houve algum estupro antes, mas não, ela não foi estuprada também. Quem a matou realmente estava com sede de sangue. Enfim, tenha um bom dia, Carl. - A funcionária entregou os papéis ao mais novo, e se virou saindo, mas logo parou no meio do caminho, e se virou olhando para Carl de novo. - Quase me esqueci: a família quer um caixão branco, e formol para que evite a rápida decomposição do corpo. - E saiu.

Aesop se dirigiu até a sua sala, deixou a maleta na mesa de apoio ao lado da maca que estava o corpo morto, e tirou o pano vagarosamente de cima do corpo. Estava pálida, e sua garganta podia ter por volta uns quinze furos. Logo começou seu trabalho, aplicando os líquidos necessários, e fez uma maquiagem na mulher para que ela não parecesse tão macabra. Ao verificar suas roupas,  tirou de dentro do bolso de seu short um papel, e o abriu.

"C'est cette femme qui a choisi de continuer sa vie pour l'art de la danse. De nombreux pétales rouges sont tombés au sol."
(Foi essa mulher que escolheu continuar sua vida pela arte da dança. Muitas pétalas vermelhas caíram no chão.)

Aquele dia estava batendo o recorde de ser estranho. Carl lembrou de seu sonho com as pétalas vermelhas indo de encontro ao chão e virando pingos sangue. Não, ele estava delirando. Quantas coincidências enormes já não aconteceram em nossas vidas? Essa só é mais uma.

Atordoado, Carl jogou o papel em sua maleta, e foi atrás da secretária a avisar que já poderia ligar para a família da mulher avisando que o corpo já estava pronto para ser direcionado ao velório. Então, foi para o refeitório, pegou um copo d'água o bebendo, e se dirigiu até a janela para ver a paisagem. Olhou para o grande teatro em frente a agência, e mais uma vez seu olhar se fixou no pôster enorme no painel de entrada do teatro, mostrando o tal Joseph Desaulniers. Aesop sorriu de lado.

"Que perda de tempo." - Pensou Carl.

A morte do maestro [CarlSeph]Onde histórias criam vida. Descubra agora