Capítulo único

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Katsuki rodopiou a caneta entre os dedos enquanto o professor explicava a matéria. Não chegava a estar distraído quanto os alunos mais burros, mas também não era o poço de concentração como os estudantes que ocupavam o topo da lista dos melhores.

Da qual ele não constava. Afinal, que diferença fazia?

Podia apostar que se ele estivesse ali, estaria anotando freneticamente cada palavra dita por Aizawa. Conseguia até imaginá-lo em uma daquelas carteiras novas em folha, com o olhar atento e as sobrancelhas franzidas. Ele sempre tivera esse hábito e, provavelmente, nem dava-se conta da maneira com que o rosto parecia quando exigia mais de sua atenção.

Passou tanto tempo mergulhado nessas hipóteses que mal notou que a aula terminara e todos os adolescentes caminhavam ansiosos para a saída e para aproveitar o resto do dia de clima alegre e festivo da primavera. Para Katsuki, no entanto, o calendário parara de avançar ainda no inverno.

— Bakugo! — Ouviu o ruivo de cabelo estranho chamar, acompanhado de dois amigos. — Todo mundo marcou de sair hoje depois da aula pra ir ao shopping. Não quer ir junto?

Katsuki recolheu suas coisas bem apressado antes de respondê-lo com um resmungo:

— Não tô a fim de andar por aí com perdedores como vocês.

— Nossa, isso foi rude — comentou o mais alto deles que, a falta de melhor expressão, tinha um rosto bem comum.

— Foi essa a intenção. — Quando chegou à porta, disse alto o bastante para que ouvissem. — Morram.

Andou a passos apressados até em casa e nem mesmo sabia o motivo. Para que voltar tão cedo para casa se não suportava aquele lugar? Afinal, ali era impossível não se lembrar dele.

Os dias passavam-se no mais puro tédio, quando não em uma passividade agressiva. Seu eu de alguns meses atrás cansaria-se fácil daquela rotina preguiçosa, ainda que não soubesse como voltar ao ritmo de antes. O que ele fazia antes daquilo acontecer?

Até porque não passara o tempo todo com ele — mas que droga, nos piores anos eles passavam semanas sem conversar depois das brigas! No entanto, estava errado ao insistir em algo que já acabara e nunca mais voltaria a ser como era. Devia apagar tudo aquilo da memória, manter a mente em branco e simplesmente esquecer, até que não o afetasse mais.

O mês de abril arrastou-se até aquele bendito dia. Katsuki estava prestes a levantar-se para comer, bem longe de todos, quando o idiota da versão humana do Pikachu pôs um embrulho mal feito em sua mesa.

— O que é isso?

— Um presente — respondeu, com um sorriso largo.

— Parabéns, Sherlock. Quero saber por que tá me dando isso.

— Eu e os caras resolvemos te dar de aniversário. — Apontou para os outros dois, que acenaram de suas próprias carteiras. Aproveitou para ironizar: — Ou você mesmo esqueceu?

Sua reação foi muito longe da gratidão, contudo.

— Vocês estão me espionando? — vociferou, empurrando o pacote contra o peito de Denki. — Me deixem em paz, porra!

Foi embora e não voltou mais para para a escola naquele dia. Justamente quando decidira esquecer de tudo, os idiotas fizeram com que se lembrasse, mesmo que não fosse essa a intenção deles.

Além dos pais, só uma pessoa deu presentes para ele todos os anos. Katsuki até mesmo podia dizer a partir de que ano a mãe do garoto deixou de escolher os presentes para que ele mesmo pensasse na maneira mais especial de comemorar seu aniversário. Desde muito novo, ele sabia muito bem como agradá-lo e sempre dedicou-se para isso.

Quando você não estava mais lá | BakuDekuOnde histórias criam vida. Descubra agora