Mathias

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Existe muitos motivos para se cometer um crime. Dependendo da ocasião você pode matar, esquartejar, roubar ou ser um serial killer, mas essa não é a questão.  Aqui quero contar como um garoto branco e magricela foi parar num centro socioeducativo por ser um tremendo bebê chorão. Ele pode parecer inofensivo a primeira vista, mas o caminho que esse idiota resolveu traçar foi perigoso a ponto de passar do limite aceitável. Mas não o leve a mal, com essa história também quero mostrar como circunstâncias fazem nosso destino se entrelaçar a pessoas que jamais imaginamos encontrar. Essa história é longa demais e provavelmente vai fazer você passar raiva, então você pode pular para o último capítulo, mas qual a graça de terminar uma história sem saber os "porquês"? Agora se for um bom leitor, apenas aguarde o desenrolar de tudo você não ira se arrepender. Essa história é minha e ela começa com uma grande mudança, as melhores começam assim, então boa leitura e toma a porra de um calmante porque essa merda vai ficar bem irritante.

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Eu nasci meio que inesperadamente. Eu não fui planejado, eu simplesmente apareci fecundado no útero da minha mãe e depois de nove, longos, meses estava no apartamento de casados dos meus pais. Eu não estava nos planos deles, mesmo assim eles acharam que estavam prontos pra mim. Tudo ia bem até a morte da minha avó. Logo depois disso minha vida se tornou uma bola de frustrações e perdas. Isso porque a filha da puta da minha tia afundou o negócio da família, ela gastava todo o dinheiro das vendas das farmácias em jogos de azar e cachaça. Então, meus pais foram forçados a decretar falência e vender tudo o que tínhamos como patrimônio, o que incluiu nosso apartamento em Curitiba, para quitar todas as dívidas e com isso nos mudar para antiga casa da minha avó em São Bernardo do Campo, São Paulo. Me lembrarei de mandar um Feliz natal pra ela e um obrigado por foder com toda a porra da minha vida perfeita.
- Não culpe tanto a sua tia. Ela tem sérios problemas com álcool. Disse minha mãe tentando se localizar no mapa da cidade de São Bernardo. Não era como se eu culpasse a minha tia por tudo o que aconteceu. Grande parte da culpa também é da minha mãe, Marta, que sempre aceitou tudo o que minha avó decidia sem nunca questionar. Ela apenas concordava com a cabeça e dizia: sim, senhora!
Um exemplo perfeito de boa filha e de uma mulher totalmente sonsa e sem nenhuma atitude. Quando a minha avó decidiu que os negócios seriam administrados pela tia Zelda todos sabiam que ia dar merda, mas a minha mãe como sempre apenas acatou mais uma decisão da minha avó. Eu sei que pode parecer errado o que vou falar, mas...
- Vai se foder!
- Mathias! - Meu pai me repreendeu.
O fato é que eu to completamente fodido. Eu não queria estar indo pra São Paulo e deixar pra trás toda a minha vida.
- Vai achar novos amigos. Uma nova escola é um novo recomeço e um novo ciclo.
- Queria que esse ciclo se fechasse no meio do meu pescoço e me matasse.
- Mathias! não fale besteiras -
Disse mamãe furiosa com minha fala.
- Mãe, eu fiz três anos de terapia para a timidez e olha só, eu tenho um amigo. Bati algumas fotos dos prédios cinzas e feios da minha nova cidade para mandar para meu melhor amigo.
- Seus amiguinhos da antiga escola gostavam de você. Até foram na sua festinha de onze anos.
Respondeu ela relembrando um fato que aconteceu há quatro anos atrás.
- Eu sei que vocês pediram para os pais deles forçarem eles a irem na minha festa com a história de que eu era um menino triste e solitário que precisava de amigos.
Meus pais bancaram os desentendidos, fizeram aquelas vozes finas e irritantes e me deram milhões de motivos para as crianças terem ido por vontade própria na minha festa, mas a verdade foi essa:
- Oi, obrigado por vir.
- Cala a boca! Meu pai me forçou a vir. Tá aqui teu presente! -
Eu ouvi isso a noite toda.
Eu tinha apenas um único amigo o Antonny, somos amigos desde o fundamental I nos conhecemos porque ele me forçou a dar cola pra ele.
- Você fez a atividade?
- sim!
- me dá cola?
- Não!
- e se eu acertar a tua cara com a minha mochila de rodinhas?
Eu dei meu caderno imediatamente, mas eu não dei apenas porquê não queria minha cara amassada por uma mochila,o seu material escolar me chamou a atenção porque eram do Dragon Ball. Eu sou simplesmente apaixonado por Dragon Ball desde que me entendo por gente e o Antonny também e foi por isso que nos tornamos tão próximos.
Eu não vou nem morar na capital de São Paulo, pelo contrário fui parar em São Bernardo do Campo, no ABC paulista. Seja lá o que isso signifique.
- Parece nome de raça de cachorro. Olha, esse é o meu cachorro. Ele é da raça são Bernardo do campo. - disse debochando do nome.
- Mathias não seja tão pessimista. Talvez você goste - disse minha mãe.
- Eu já não gosto e não vou gostar! - digo com convicção.
- Por que você nunca gosta de nada?
- Por que a senhora sempre tem que gostar de tudo? Parece até que tá cagando pro fato da gente tá rolando na merda agora.
- Não fale desse jeito! Estamos passando por dificuldades, é verdade...- A caralho. Não estamos passando por dificuldades, olha pra nós, estamos indo pra merda de uma casa que tá caindo aos pedaços no cu do mundo e a senhora só consegue ficar aí com cara de paisagem. -
- O fato da sua mãe não surtar por qualquer coisinha, não significa que ela não se importe. É um momento difícil para todos. - diz meu pai a defendendo - e comece a moderar no palavreado! - Ordena ele.
Um silêncio enorme se instala no carro enquanto seguimos em direção a casa.
O bairro onde a antiga casa da minha vó fica se chama Ferrazópolis. Isso mesmo, pode rir, até a porra do nome do bairro me faz lembrar o quanto eu to fodido. A casa fica em uma rua chamada regente lima e silva.
-É, ela é bem pior do que imaginei. - Digo deixando ainda mais claro minha indignação com tudo isso.
- Chega Mathias. Não quero mais ouvir suas reclamações, ok? Vá pegar suas malas e põe pra dentro, anda! - Ordena minha mãe. Vejam agora ela tem autoridade.
A casa tem uma grande garagem, tem dois andares, uma sala de estar razoavelmente grande, um corredor comprido, um quarto no primeiro piso, um banheiro, a cozinha, sala de jantar, o quintal; no segundo piso temos a varanda que fica dentro do quarto onde vou ficar, a área de serviço na parte dos fundos e um quartinho de entulhos.
Se não fossem pelas rachaduras nas paredes, os portões com limo e musgo verde, as infiltrações, a tinta descascada e a má instalação dos fios de energia essa casa não seria tão ruim. Nada comparado ao apartamento em que vivíamos, mas seria menos desagradável viver aqui. Mas enfim, essa é a minha nova vida. Cheia de problemas, paredes rachadas e musgo verde. Valeu mesmo tia zelda!

(Pre) Juízo Onde histórias criam vida. Descubra agora