Marina

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Os pais da Marina planejaram desde sempre as coisas que aconteceriam em suas vidas. O namoro, noivado, casamento e a gravidez. Eu posso dizer que até a posição da trepada foi calculada para ter a melhor e mais rápida fecundação possível e deu certo, depois de dez meses aguentando firme aquele bebê, garantindo assim que não nascesse prematuro, a mãe da Marina deu a luz a menina que cumpriria todos os planos de seus pais.
A Marina foi criada com muita rigidez. Seus pais sempre exigiram o seu melhor e muito além dele, e apesar dos avisos de que adiantar as coisas que aconteceriam naturalmente com a Marina poderia ser prejudicial, eles continuaram com seus planos. E por incrível que pareça o corpo da Marina obedecia às ordens deles. A Marina ganhou dentes aos sete meses, começou a falar no início de seus oito meses, seus pais pagaram um profissional pra isso, e começou a andar aos sete meses, que na visão de seus pais foi um pouco tarde.
A Marina começou a estudar aos três anos e seus pais proibiram a escola de passar desenhos para pintar, quebra-cabeças ou qualquer outra brincadeira que desviasse a Marina de seu potencial. Eles queriam questões de verdade, atividades que buscassem seu esforço e acordassem seu cérebro para o pensamento racional. Então, enquanto todos pintavam e faziam cocô nas fraldas, a Marina resolvia continhas de adição e tentava enxergar sentido nas vogais e consoantes e na maneira que elas se misturam para formar palavras. E em menos de três anos ela era a melhor da escola, o que a forçou a ter que sair e ser mandada para uma escola de jovens talentos, mas seus pais acharam pouco ainda para o que ela poderia alcançar. Sendo assim eles conseguiram convencer o estado a deixar a Marina entrar no fundamental I com apenas cinco anos. Ela se deu bem, todos na escola a admiravam por ser tão jovem e tão inteligente e ela gostava de ser notada, admirada e sempre receber reconhecimento. Aqueles olhares cheios de orgulho e satisfação que ela via em seus pais fazia ela sentir orgulho de si mesma como filha. Então quando ela entrou no ensino fundamental II, nos conhecemos e só nos aproximamos porque ela foi a única que conseguiu me vencer na batalha de conhecimento da escola, como já havia dito. Ela era praticamente melhor que eu em tudo. Começamos a conversar e então apresentei a ela o mundo geek, o que irritou seus pais, mas quando eles deram uma olhada em meu histórico escolar e nas minhas notas altas, se convenceram que eu poderia ser uma boa influência pra ela. A Marina amou os animes, jogos de tiro e Minecraft. Ela dizia que dentro dos jogos ela podia ser alguém que não precisava fingir e amava essa sensação de liberdade que ela sentia ao estar sentada em uma cadeira com o controle em suas mãos.

- Amo sentir que o controle está nas minhas mãos.

- O que quer dizer com isso? Você sempre fica com o controle nas suas mãos.

- Não, Mathias. Nem sempre.

Ela nunca podia fazer o que queria. Ela tinha que seguir a risca seu cronograma de tarefas durante o dia. Mas quando sentia que estava prestes a explodir, ela fugia e ia para minha casa jogar. Jogando ela descontava todo ódio que sentia, o que foi bom porque assim ela conseguiu ser uma das melhores jogadoras de sniper elite 4.
Quando os pais dela descobriram que ela quebrava seu cronograma, eles a proibiram de me ver e como castigo a deixavam trancada em seu quarto toda vez que saíam para evitar suas fugas. O que era vontade de orgulhar seus pais estava virando raiva.
O pai da Marina morreu quando estávamos no oitavo ano e tudo o que ele pediu para ela foi para não se desviar de seu futuro. A mãe dela sofreu tanto com a perda do marido que buscou na religião um conforto e, então começou a sua coleção infinita de santos. E a Marina decidiu que continuaria levando os planos que seu pai tinha pra ela e aquela raiva adormeceu.
Logo depois que seu pai morreu a Marina se tornou mais apegada a mim e a cada dia que se passava ela estava mais próxima e essa proximidade se tornou amor. Logo estávamos namorando e eu criando planos para nosso futuro. Outro futuro que ela não planejou e que ninguém perguntou se ela queria e então lá estava aquela raiva despertando novamente, fazendo a cabeça dela dar voltas e voltas pensando sobre o que era certo a se fazer. O que nos levou até o seu áudio terminando comigo.

(Pre) Juízo Onde histórias criam vida. Descubra agora