— Terra à vista! — um dos marinheiros exclamou da proa, quase a atirar-se na água. Guido olhava-o de longe quando um vento forte e salobro levou-lhe o chapéu para longe. — Capitão!
— Ouço-te, homem. Tragam-me o mapa — disse, ajeitando as mangas brancas nos braços. O chapéu cobria um pouco do sol que o atingia, mas causava-o dez vezes mais calor. Os cabelos castanhos desfiavam pela face suada. Céus, como ali era quente. Ergueu o lornhons da mesa e levou-o aos olhos, traçando com o dedo onde estava. Ao seu lado, o escrivão permanecia em silêncio, anotando freneticamente cada acontecimento. Assim que um dos homens ouviu dos lábios de Guido, exclamou alto e em bom tom:
— Estamos na península de Iucatã, mis hermanos!
E todos os homens gritaram, em festeja. Cortés mandou descerem quando a âncora caiu na água e foi guardado por alguns deles quando desembarcou. Quando o espanhol sentiu os pés em bota afundarem na areia, anunciou a sua chegada com um brado, em homenagem ao seu país, e ordenou que seguissem. Estava em Cempoala, uma cidade do litoral. Assim que adentraram a mata, foram recebidos, curiosamente, pelos nativos com regalias, agrados e muita comida. Faziam trocas por algumas preciosidades, dando aos nativos coisas simplórias, que pareciam superiores a ouro sob seus olhares. Sequer entendia o que tanto falavam, mas quando Cortés deu-se com vinte jovens moças, supôs que elas serviriam-no. Os homens entraram em outro alvoroço. Mais tarde, o espanhol descobriu que, das vintes moças, uma delas falava mais de três línguas. Quando mandou-a trazer-lhe água, ouviu-a perguntar baixo se queria algo mais.
— Falas espanhol?
— Sim — fora curta, tinha olhos rosados, profundos e o cabelo – aparentemente escuro a dizer por suas raízes – era tingido por um um pigmento similar ao de suas íris.
— Como aprendeste? Qual teu nome?
— Malinche. Trish Malinche.
— Não me respondeste a primeira pergunta — a moça permaneceu em silêncio, olhando-lhe as roupas estranhas e a gola alta.
— Sugiro tirar essa coisa de teu pescoço. O tempo irá esquentar.
Brevemente encantado com a personalidade de Trish, Guido passou a conversar mais com a moça. Disse-a sobre seus anseios de visitar a capital asteca, Tenochtitlán, e acabou descobrindo, por acaso, que havia algo de extrema relevância para seus interesses.
— São totonacas. Viviam em sossego até Montezuma começar a cobrar impostos absurdos. Estão, agora, em constante revolta, sem saber como acabar com todo esse abuso — Malinche tirou de uma árvore um fruto carnudo, aparentemente gostoso. Mordeu-o e Cortés viu seu suco colorir-lhe os lábios com um tom vermelho suave.
Pensando numa futura aliança, Guido interessou-se e perguntou à moça quanto tempo levariam para convencer os totonacas de que, juntos, podiam derrubar Tenochtitlán e findar o abuso de impostos. Pouco, a moça disse, principalmente com sua lábia espanhola, logo cedem.
Determinado, Guido convocou centenas de nativos e discursou, apontando as injustiças que sofriam e soluções. Trish passava a mensagem ao povo, fazendo ecoar pela mata sua voz. Tornou-se a intérprete de Guido, comunicando-se com todos que se interessavam pelo que o espanhol dizia. Acabaram por aceitar a proposta de aliança, com cerca de quatrocentos e cinquenta nativos do lado de Guido. Pouco antes de rumar para Tenochtitlán, o espanhol fundou uma cidade a fim de deixar sua conquista marcada naquele território.
— Contem minha história — bradou, antes de sair a cavalo para a capital, com Malinche ao seu lado.
Era fato que com sua lábia Guido conseguiria ir longe, mas temia que algo em seu plano deslizasse de suas mãos. No caminho, surpreendeu-se ao notar seu vice capitão-escrivão aproximar-se. Trajava calças brancas contrastadas com seu casaco negro de couro francês. Sua cinta já era inútil, tão bem formadas estavam suas curvas. Os sapatos escuros prendiam-se nas laterais do cavalo e a gola de rosa de sua camisa chacoalhava com o cavalgar. Os cabelos loiros quase brancos bagunçavam-se com o vento, e a face apresentava um cansaço indescritível. Fugo Días del Castello fora naturalizado e renomeado espanhol assim que mandaram Cortés para a América. Era um homem sábio e o rei dizia ser de confiança. Ofegava quando viu os cabelos castanhos de Cortés perto de seu cavalo.
![](https://img.wattpad.com/cover/215772314-288-k213074.jpg)
YOU ARE READING
O Tesouro de Tenochtitlán
Fiksi Sejarah[ Fu + Gio | México Pré-Colonial ] No ano de 1519, Guido Cortés tomou seu caminho para as Américas, onde ouvia dizer que muitas riquezas existiam. Viajaria serenamente até ser informado que as terras próximas dali estavam para ser tomadas pela Ingla...