Menina Má

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Autora : Deia Klein

A primeira vez foi por pura teimosia. Fui avisada e também advertida. Mas eu era jovem, mimada e muito teimosa, além de metida a independente. Minhas amigas tinham, e eu, obviamente, também queria ter. Não fazia diferença, ao menos para mim, o fato de ser a mais nova em um grupo que tinha entre 18 e 22 anos. Eu, a caçulinha, a chaveirinho da turma, estava com 16, e me julgava tão adulta quanto as demais. Ou seja, ainda que meus pais tivessem feito ameaças do tipo tirar o celular, suspender as aulas de flamenco, e mesmo as escapadas à casa de praia, fiz minha conta no aplicativo de relacionamentos.

─ E aí, Agatha, você tá pronta? Não tenho o dia todo. ─ gritou a voz, claramente irritada.

Suspirei profundamente, acertando o batom borrado e fui, abrindo a cortina preta esfarrapada que tinha como objetivo passar noção de privacidade. Grande piada! Privacidade num lugar daqueles, onde você era vigiada cada segundo das horas do dia?! 

─ Tô pronta, Cabeção, o que vai ser hoje?

─ O cliente quer um ensaio à moda garota inocente. ─ largou uma baforada do seu tabaco fétido na minha cara. ─ Cara de estudante e modos de virgem. ─ riu, de modo grosseiro. ─ Ponha esse rabo para funcionar! ─ ordenou.

Fui, obediente. Esse cara era grosso e cruel, sabia por experiência própria. Já havia sentido na pele, quando o desobedeci e ele me deixou marcas de queimaduras do seu maldito cigarro. Todas em lugares onde não fossem registradas pelas câmeras.

Uns 40 minutos depois, farta de suas apalpadelas, voltei ao “camarim”, limpei a cara, vesti o indefectível short jeans e a camiseta branca cortada logo abaixo dos seios, e fui à procura do meu dono.

Dono, você se pergunta. Como assim? Seria eu, por acaso, a cadelinha de estimação de alguém? Sim, essa é quem eu sou. Sou a rapariga do chefe. A que vaga pelo prédio de escadas infinitas, desfrutando de alguma liberdade, invejada pelas demais, presas em suas celas de 2 x 1,5m ou algemadas em suas camas repugnantes, de lençóis encardidos.

Chegando ao meu palácio, um apartamento no último andar, com porta de aço e grades nas janelas, onde eu era tratada como uma porra de uma rainha, me joguei na cama e chorei. Mais uma vez, antes que o dia findasse. Se terminasse bem, claro. Caso contrário ainda haveriam novas lágrimas sob o travesseiro de sei lá quantos fios de percal, como Rodrigão gostava. O desgraçado que apertava minha coleira a seu bel prazer, que ora me enchia de beijos nojentos e molhados, e noutras me fazia ficar de quatro no chão, como a cadela que eu era, comendo aos bocados, num pratinho com o meu nome pintado em esmalte vermelho. 

Nem acreditei quando ele deu match comigo. O maior gato. Super sarado, tatoos que se espalhavam pelo tórax estilo tanquinho, braços e um pedaço do pescoço. Olhar devorador, cara de safado, uma boca tentação. 

Contei para as gurias, ou melhor, fui dar uma de presunçosa, afinal o cara era lindo, mas ao invés de se entusiasmarem, foram logo dizendo que ele tinha cara de cafetão, foragido da polícia e tals. Imagina, pura inveja! Apontei o Camaro amarelo em uma das fotos e a moto enorme em outra. Ele era rico e gostoso, sorri de ladinho.

Contrariando o bom senso geral, continuei a conversar com o boy. Seu nome era Rodrigo, tinha 28 anos, empresário da área de entretenimento. 

Eu, menti minha idade. Disse que tinha 19 estava na faculdade, até falei de umas matérias que cursava. Marcamos de nos encontrar. Lugar público, pois eu era novinha mas não era burra. No parque, em um sábado à tarde. Junto a barraquinha de Sucos Premier, perto do bebedor, no laguinho.

Babei assim que o vi. Se nas fotos ele era bonito, ao vivo era ainda melhor. Até a dona do quiosque comentou comigo como o cara era gato. Me senti a pegadora.

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