Passo minhas mãos suadas na barra da calça de novo, meu deus como isso é difícil. Queria poder ter alguém aqui comigo, me distraindo. Abro a tela do celular e dou uma olhada no meu instagram, tenho uma sessão de fotos depois do colégio, vou até ter que faltar as duas últimas aulas. Tive bastante visualizações nos stories de hoje mais cedo, pelo menos a minha carreira está indo bem.
Olho em volta, o que uma pessoa precisa fazer para ser atendida nesse lugar? Estou aqui já faz duas horas e tenho aula daqui a uns vinte minutos. Nem sei se vou pro colégio hoje, sendo bem sincera, vai depender do que eu for receber.
- Senhorita Frøseth, por favor. – Uma das enfermeiras me chama e me acompanha até uma sala. Sento na cadeira e fico esperando o médico chegar.
Por sorte o médico chega rápido, ele sorri e me cumprimenta. Senta na minha frente e abre os papéis dos exames. Ele analisa tudo e me encara. Começa a me dizer que estou saudável, os meus históricos mostravam que eu era anêmica antes e que agora estou bem. Graças ao Tom, que me ajudou numa fase bem ruim da minha vida. Ele me parabeniza por este sucesso e começa a falar o que eu tanto temia.
- Você está grávida de três semanas. Gostaria de discutir suas opções, o certo é você começar o seu pré-natal agora, fazer um ultrassom e se cuidar ainda mais, devido ao seu passado. – Ele me entrega um panfleto sobre maternidade, depois outro panfleto sobre riscos de gravidez e um outro panfleto de terapias para mães solteiras.
Parei de escutar o que ele disse no momento em que ele me entregou os panfletos. Minha cabeça começou a girar e senti um calor fora do normal. Grávida? Minha vida acabou. Tudo o que eu conquistei até hoje, minha carreira, minha relação com o Tom, meu status no colégio, tudo. Por uma criança estúpida.
Levanto da cadeira e saio dali correndo, paro quando uma enfermeira me segura pelos braços e me ajuda a sentar em uma cadeira da recepção. Ela mede a minha temperatura e eu só deixo ela fazer o trabalho dela.
Me traz uma água e eu bebo sem protestar. Tento me acalmar, mas sinto minhas mãos tremerem, assim como as minhas pernas. Estou em choque, todo o meu corpo está tremendo de medo. Ser mãe? Eu nem mesmo tenho um bom exemplo de mãe na minha casa, sempre tive que me virar sozinha, meu pai é super ocupado e nem mesmo mora por aqui. Como eu devo criar uma criança se eu não tenho estrutura nenhuma em casa? Muito menos essa criança vai ter, eu não quero.
A enfermeira me leva para um quarto e me dão calmante na veia. Mal consigo respirar. Tudo virou de cabeça para baixo de um dia para o outro. É nesse momento, sozinha na cama de um hospital, que eu me permito chorar, gritar e sentir, todas as emoções em uma só. Bato no travesseiro e grito sozinha. Não ligo se forem me colocar na ala psiquiátrica, eu só quero poder sentir tudo agora, para não deixar transpassar para os outros depois.
Não sei quanto tempo fico gritando, mas chega um momento que fico sem voz, onde só minhas lágrimas escorrem e toda a minha energia de antes se esvai. Olho as mensagens incessantes do Tom e da Eleanor, me perguntando onde estou. Queria voltar no tempo, voltar para o dia em que minhas preocupações eram sobre o colégio, ou se eu estava com mais seguidores no instagram. Minha vida acabou mesmo.
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Fico observando a paisagem de Denver, não canso de pensar que Denver é mil vezes mais bonita no frio. O jardim botânico fica ainda mais fúnebre, combinando com o meu humor de hoje. Ainda bem que estou medicada, isso ajudou bastante, mas ainda assim cada célula do meu corpo está vibrando, medo, angústia, tristeza. Um bebê é tudo o que eu não queria.
Eu sou uma boa pessoa, eu trabalho bastante, eu conquisto as coisas, como é possível que eu tenha sido tão imprudente? Eu sempre uso camisinha, nunca fiz sem. Nunca. Sei que só é noventa e oito porcento efetiva, mas quem é que conta com os dois porcentos? Que droga!
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The Gift
Short StoryAngeline Frøseth tinha a vida mais satisfatória de Denver, nascida em berço de ouro com o futuro traçado. Com uma vida bem sucedida como modelo e um lugar marcado como abelha rainha da escola. Um namorado de dar inveja e uma aparência de destruir co...