Calafrios na Espinha

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Toda vez era a mesma coisa, ele atacava meu corpo como uma fera ataca sua presa, ele elogiava a minha pele, os meus quadris, as minhas coxas, mesmo meu corpo não sendo o mais atlético, também não era o mais franzino, mas ainda assim não era nada demais, por boa parte do tempo que gastamos juntos eu me sentia especial por esse endeusamento do meu corpo, mas agora percebo que ele só se importa com essa casca, essas expressões, as extremidades, e as mudanças de ritmo do meu corpo para acompanha-lo. Depois dele, eu não era mais eu, eu era uma marionete em sua mão.

Descartável e tedioso, era assim que eu me sentia. Descartável porque cedo ou tarde meu corpo vai atrofiar, minhas células vão morrer mais do que são capazes de regenerar e ele vai me substituir por um corpo jovem. Tedioso porque sem o corpo que o atraía, eu não passava de um conhecido, com quem ele sai para beber e ouve sobre como sua vida normal não é nada interessante como a sua vida corrida, perto dele me sinto insignificante, a presença dele é esmagadora, tenho medo de falar tudo que penso e ser mal entendido, mas tenho medo também de não falar e continuar cometendo os mesmos erros de sempre. Afinal quem eu odeio? Ele ou eu?

No fim, independente da pessoa a qual eu direcione meu ódio ou da forma como eu faça, esses momentos continuarão sendo torturantes, eu não posso desistir de quem eu sou, não mais.

- Chega...

- O que? Do que você tá falando? Eu não posso parar agora.

- Você pode sim, e vai parar, porque eu não suporto mais a ideia de você me tratar como um brinquedo, chega disso tudo – empurrei Luca.

- Porque você tá falando isso? O que aconteceu? O que te faz pensar assim agora? Depois de tudo que a gente viveu, você mudou do nada?

- Não é um bom momento, nunca vai ser. Sim Luca, eu mudei, e isso me deixa feliz, eu estava cansado de ser o mesmo e de viver do mesmo jeito. Nada disso vale mais a pena, nãos vou me desgastar por alguém que não me merece. Essa situação só me machuca, continuar agindo dessa forma, me faz perder cada vez mais uma parte do que eu sou, uma parte da minha humanidade. Uma parte do que compõe essencialmente.

- Eu não compreendo, eu realmente não consigo compreender, porque você começou a agir assim? Você acha que eu não te amo?

- Sim Luca, você não me ama, você nunca demonstrou me amar, talvez seja difícil para você fazer isso, mas para mim é insuportável você não fazer, eu cansei disso tudo, você parece temer que algo aconteça caso você resolva assumir a nossa relação. Do que você tanto tem medo? Se você realmente me ama, se você realmente se importa com o meu bem estar, assume isso.

- Não é bem assim, você sabe... eu me esforcei tanto para estar onde estou, mas você sabe que a homossexualidade não é aceita, meus pais, nossos amigos, meu trabalho, tudo isso é firmado em preceitos que precisamos seguir para convivermos felizes.

- Cala a boca! Quem está feliz com isso? Você? Se reprimindo? Eu? Como você impondo que tudo seja da tua maneira? Você só se importa com a sua imagem, você nunca esteve disposto a jogar tudo fora por mim, como eu, incontáveis vezes, fiz por você. E agora eu finalmente entendo que todo o meu esforço foi em vão, não adianta mais insistir nisso.

- Não, nada foi em vão, não desiste de mim, não me deixe aqui, sozinho. Eu não gosto disso, mas temos que seguir esses preceitos.

- Fodam-se os preceitos. O que você chama de preceitos, não passam de preconceitos mascarados por uma influência mais forte que a sua vontade.

- Do que você está falando? Eu não sou controlado ou influenciado por ninguém, você sabe bem disso.

- Como você tem coragem de dizer isso nessa situação? Você não tem discernimento? O pior dos piores, esse deveria ser o teu título, sempre se convencendo de que é único e superior, mas é a mais frágil e controlável das pessoas.

Euphoria sagaWhere stories live. Discover now