Como explicar algo que nem mesmo eu sou capaz de entender? Como expressar as mudanças repentinas que estão ocorrendo dentro e fora de mim? Serei capaz de resolver as enxurradas de pensamentos conflituosos que fazem a minha mente inundar de paranoia? Eu só queria poder nadar contra a corrente.
Não sei dizer direito quando, nem como eu comecei a ver o mundo dessa forma, talvez eu estivesse cansado da minha antiga forma de pensar. Eu era, até então, uma pessoa normal, normal até demais, acordava cedo, ia para o trabalho, no caminho tomava um café, fazia algumas pequenas pausas, voltava do trabalho, nos finais de semana saía para beber com meu amigo. Essa era minha rotina semanal, trabalhar e beber, vivia aqueles momentos como se fossem únicos e especiais, mas não eram, no fundo eu sabia que eu era apenas mais um peixe nadando na correnteza do rio mórbido chamado de vida.
Havia começado a trabalhar fazia apenas dois anos, após me formar, comecei a trabalhar numa empresa de contabilidade, devo admitir que a princípio era muito divertido para mim, eu amava aquilo, mas ainda assim, no fundo eu não suportava viver daquele jeito. Com o tempo o brilho de um lugar novo desapareceu e a podridão daquele lugar começou a se revelar para mim, pessoas mesquinhas, um chefe machista e homofóbico que a todo tempo pegava no meu pé falando "precisa crescer esses músculos, não vai querer ser confundido com uma bixinha não é?" enquanto dava tapinhas nas minhas costas e ria, as paredes estavam mofadas, e o carpete da entrada fedia a cachorro molhado.
Aquilo tudo, aquela convivência, aquele modo de vida não eram para mim, estava de saco cheio de tudo, a gota d'água foi o Michael, o genro desgraçado do meu chefe, me abraçou pelas costas falando:
- Essa é a bixinha de quem você tanto fala sogrão?
Eu me virei acertando um soco no rosto dele e gritei alto o suficiente para o meu chefe e aqueles funcionários ouvirem.
- E daí se eu for bixinha? seus filhos da puta, vão se foder, eu desisto de tentar ter uma convivência com vocês, eu me demito, está ouvindo Carl? Eu me demito, vai tomar no cu.
Peguei minhas coisas e deletei meus dados, desci as escadas com pressa fervendo de raiva e segurando as lágrimas, eu sabia que seria difícil conseguir um outro trabalho, e não iria ser nada fácil pagar o aluguel. Esse foi talvez, o pior dia da minha vida. Corri para o ponto de ônibus e me sentei, naquele assento me perdi em meio aos meus pensamentos confusos.
Quando tomei consciência de onde eu estava, já haviam passado duas horas, havia perdido o ônibus que costumava pegar, então decidi ir para casa andando, no caminho passei por um bar que nunca tinha visto naquele lugar antes "Bar Vesúvio" ele me atraía de uma forma indescritível, ele não era muito especial para mim, mas mesmo assim me atraía, e eu não pude controlar a vontade latente de entrar e beber.
O local era grande e bonito, repleto de quadros e lustres de ouro, ouro era o que mais se via pelo teto do bar, mas eu estava apressado demais para me atentar aos detalhes.
Me sentei o mais próximo possível do balcão e logo fui atendido, por um homem negro alto, pedi a bebida mais forte que ele tivesse, eu era fraco com o álcool queria cair num gole só e nunca mais acordar. Enquanto o garçom demorava para trazer minha bebida, me atentei para o ambiente em volta, a uma distância de duas mesas estava um homem baixo de cabelos escuros, não parecia tão velho, mas alguns muitos fios já estavam brancos.
Se vestia bem, parecia uma pessoa importante, tinha a mão um caderno de anotações e uma caneta, escrevia coisas repentinas e parava, olhava para os lados e voltava sua atenção, sempre, para uma moça de pele morena e cabelos cacheados que se apoiava no balcão e conversava com um homem com aparência árabe, eles riam e seguravam as mãos as vezes, pareciam pessoas apaixonadas que não conseguiam, ou não podiam se amar.