A economia do Brasil não é algo do qual devemos nos orgulhar. Ao invés de planos e garantias, temos fracassos e dilemas mal resolvidos. Um histórico de moldes mal desenvolvidos. Porém, o sistema carcerário apesar de ser denegridor, serve como uma ponta solta, ou talvez um fio de ironia no meio dessa história toda. Comida precária. Instalações precárias. Organização... Enfim!
Não é atoa que Talles precisa mentir. Para todos os efeitos, seu irmão, embora detento, não existe. Sua história consiste num garoto simples que veio do interior para morar com o tio na cidade de oportunidades.
Não e não... Centenas de vezes, não.
Um rapagão parrudo e de estética bruta. Veias no pescoço e olhos esbugalhados. Bruno é o irmão mais velho de Talles, preso há 35 meses atrás por latrocínio. Motivo? Pagamento de dívidas com dinheiro roubado. O rapaz foi surpreendido e meteu bala, sem pensar duas vezes."Eu só me defendi, sabia que tudo iria ser responsável pelo meu fracasso".
Disse ele no tribunal, num tom arcaico na voz rouca. A vida de Talles foi destruída, tal qual não pôde ajudá-lo e ainda precisou tentar arranjar dinheiro para fiança na tentativa de uma condicional. Tolo não?
Ambos saíram de casa cedo, em busca de uma vida menos cansativa. Pais distintos, mas assassinados pelo próprio tio por motivos de vingança, por erros cometidos no passado. Sozinhos, eles buscaram recomeço e deu no que deu.
Agora, todas as quintas e domingo, Talles se locomove com o auxílio de três conduções e vai até o presídio, tentar arrancar um fio de esperança do irmão perturbado.
A revista é a pior parte.
Um cubículo, uma inhaca de mofo que dá impressão de choque nas narinas. Homens pelados, alguns cabeludos até de mais. A testosterona exposta.
Uma humilhação de quinta ou até vigésimo grau.- Vocês tem 10 minutos.
Assim que o carcereiro assume posição, Talles sobrepõe os pulsos no balcão rente ao vidro blindado. Entrelaça os dedos e observa o irmão olho no olho, sério e pálido.
Um barulho de metal anuncia a retirada do gancho. Bruno está na escuta, ansioso...
- Obrigado por ter vindo.
Talles, apanha o telefone para contato, sem exposição. Isolamento total, apenas rostos em cada lado do vidro.
- É a minha função como sua única família.
- Você só tem vinte e dois anos, e é tão responsável.
- Eu não tenho tempo para cerimônias.Talles o enfrenta. Bruno engole seco e expõe os fatos:
- Eu precise que você termine aquilo pra mim o quanto antes.
Talles diz algo sussurrando. O carcereiro tempera a garganta.
- O dinheiro está sendo pago como combinado.
- Eu sei que sim, só reforcei. Sem o pagamento dessas dívidas, eu serei assassinado aqui dentro.
- Você precisa me dizer a quem foi que você pediu esses empréstimos.
- Eu sempre quis o melhor pros dois, brother.
- Não, seu idiota. Você acabou me levando pra uma armadilha.Talles soca o vidro, irritado. Recobra a calma e continua:
- Sabe o tanto que eu perdi, já cansei de falar desse assunto. Porém, quem garante que tudo vai ser diferente quando estiver livre?
- Tem de confiar em mim, não tenho como provar nada. Mas te garanto, eu mudei pra melhor.
- Resta saber se o melhor pra você, é o melhor pra sociedade.
- NÃO FODE!
Berra Talles, segurando o telefone firmemente contra a boca.
- Ok!
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Á ordem da Burguesia
RomanceLigações imorais são inevitáveis. Qual o preço a ser pago numa batalha de egos e desejos ardentes? Lutas internas e dúvidas sexuais num mundo incompreendido. Cézar, Tales ou Vicente?