Não. Devia haver outra saída, outro caminho que não levasse para aquele fim. Ela calçou os tênis e saiu atrás de um táxi que a levasse até aquela rodoviária. Ela não iria desistir dela. Que tipo de paz era essa que se sentia no direito de invadir-lhe a existência quando estava triste e se sentindo incompleta? Tinha sido a rotina? A incompreensão? A falta de atenção? Elas iriam resolver aquilo juntas. Ou ela estava indo atrás de um adeus definitivo? Ela estaria tomando uma atitude impensada e precipitada?
Durante todo o caminho ela tentava enxugar o suor de suas mãos na calça e respirava fundo em uma tentativa frustrada de se manter calma. A cada novo pensamento de que aquela era uma péssima ideia ou de que ela estava agindo como uma péssima perdedora do jogo de azar chamado amor, mais ela sentia a insegurança aumentando. Elas poderiam dar um jeito? Encontrariam um meio-termo? Era para ser?
Ela não sabia, mas de uma coisa ela tinha certeza: era tarde demais. O ônibus já havia partido. Ela se sentiu desolada, mas por um momento se deixou ter um fio de esperança. Ela esperou que, tal como naqueles filmes românticos que a outra tanto insistia que elas assistissem juntas, ela olharia para algum lugar e lá estaria a sua amada sem ter pegado o ônibus. Mas não foi o que aconteceu. A vida real não é como nos filmes. Não há beijos debaixo de chuvas, romances ao por do sol ou um amor que não traga tristeza junto. A vida real é um pouco mais triste, solitária e sem um pingo de poesia.
Por fim, ela pensou que talvez fosse melhor assim. Era a vida a poupando de mais uma frustração. Ela imaginou o quão constrangedor seria ver a outra procurar palavras na tentativa de soar menos insensível ao dizer que não existia mais nada entre elas. Tudo que elas tinham para dizer já havia sido dito. Cada palavra, cada silêncio. Não tinha mais nada o que fazer.
Ela voltou para o apartamento e pensou o que faria da vida. Talvez escrevesse um livro sobre o romance delas ou seria mais uma que riria ao se lembrar dos momentos felizes e choraria em seguida ao pensar que nada daquilo voltaria a ser como antes.
Mas o antes não importava mais. O antes já tinha sido, o agora estava sendo e o depois estava diante de seus olhos, em pé, perto da cômoda, encarando o porta-retrato. A outra levantou os olhos ao sentir o cheiro da primavera invadir aquele cômodo gélido em pleno verão. Elas ficaram observando uma à outra. Expectativa, medo, angústia, saudade. Ambas tinham muito para dizer, mas não sabiam o que dizer. E então aquele velho silêncio se instaurou no vão de seus pensamentos. Não precisaram dizer nada. Ambas sabiam que aquilo era um "eu te amo". E o abraço que surgiu calorosamente apenas confirmou o que palavras não poderiam dizer ou expressar. E o relógio estava marcando nove da manhã...
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9 Horas
Short StoryE mesmo sem terem dito nada, ambas sabiam que aquilo era um adeus.