Capítulo 2

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Enquanto terminava a caixa de leite com chocolate naquela manhã, encarando a televisão, Leonardo Magal falava em uma reportagem sobre o sistema anti-alagamentos que havia recentemente sido instalado em Sta. Ágata pela Família Regente. Aparentemente toda a água coletada seria usada para irrigar o jardim botânico da cidade, um enorme parque de uso exclusivo dos membros indicados pelas famílias.

A reportagem era de alguns dias atrás mas vinha ao ar na terça-feira como uma espécie de estratégia de marketing, como se alguém não já soubesse que as eleições eram pura burocracia e os Carvana seriam a próxima família a governar a região dos Cardeais. Não era exatamente uma propaganda dos Magal, mas de todo o sistema das Famílias Regentes, que costumavam alternar-se no poder em Sta. Ágata desde a formação da cidade.

- A cidade dos pássaros não descansa para assegurar o bem estar da população, e vai na contramão das grandes metrópoles brasileiras, com problemas infraestruturais que causam problemas como inundações... - tomei o controle em mãos e desliguei avelha televisão, terminando de comer as torradas que havia feito.

Para a maior parte das pessoas, aquela era só a ultima segunda feira do ano mas, se a sua família era de Sta. Ágata, o cenário mudava totalmente. Depois de nove anos, a Família Regente se alternava entre os Magal, Carvana, Sarmento, Castelobranco,  e Reski, as famílias que originalmente controlavam a cidade e toda a região dos Cardeais. Naquela segunda, a avenida principal havia sido fechada oara uma pequena e modesta passeata a favor das famílias regentes, o pesadelo dos meus avós.

Mas nós não iamos para a passeata, ao invés disso eu estava sendo forçada a juntar-me a um movimento de resistência às famílias regentes em frente à biblioteca, um prédio moderno de vidro espelhado no centro da cidade. E para isso, tinhamos que acordar muito cedo.

Meus avós tinham camisetas com os aviões e eu modestamente usava um botom que dizia "que tal repensar seu voto?". Não era como se eu concordasse ou discordasse do protesto, eu só não me importava o suficiente para ter uma opinião.

Quando chegamos, antes de todo o resto das pessoas, ajudei minha avó a pendurar uma faixa na grade da biblioteca. Uma garota de cabelos lisos e escuros arrumava os panfletos em uma mesa. Reconhecia-a pelas fotos do meu primo, Gabriel. Eles pareciam ser bons amigos, e meus avós pareciam gostar bastante dela.

- Amanda! - minha avó chamou - Essa é minha neta, Liz. Ela acabou de mudar-se para Sta. Ágata.

Amanda andou até mim e apertou a minha mão com firmeza, como se eu fizesse parte do que quer que estava contecendo alí. Dei um sorriso sem graça.

- Se quiseres posso mostrar-te a cidade. - ela disse, com um sotaque claramente português.

- Claro. - respondi.

Eu já havia visto todos os pontos turísticos, no entento, todas as vezes que eu visitara meus avós. Mas o museu sempre tinha novas exposições, então não fazia mal ir mais uma vez.

Por volta das dez horas da minhã, a manifestação foi de um pequeno aglomerado de pessoas para uma multidão - não muito grande, no entanto. Amanda me deu um cartaz para segurar que dizia "diga não aos valores das famílias regentes". Era estranho segurar uma placa para algo em que eu realmente não acreditava.

O dia estava muito quente, então, depois de uma hora, Amanda e eu sentamo-nos em um dos degraus da biblioteca com nossas garrafas d'agua. Tivemos uma longa conversa sobre garrafas de plástico e o meio ambiente. Omovimento acabou pouco depois do meio dia.

Voltamos para casa e assistimos a parada das famílias pela televisão. Flores brancas decoravam um pequeno carro alegórico seguido pelo carro oficial do prefeito, crianças de uma escola locar e depois disso pessoas com placas que diziam "eu acredito nas famílias". Diferente das pessoas do movimento pela manhã, mas pessoas na televisão pareciam muito mais arrumadas e fotogênicas, por algum motivo. Quando as janelas do carro abriram-se, havia somente uma pessoa faltando, a garota de cabelos cacheados.

O Furacão ElieOnde histórias criam vida. Descubra agora