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~Afonso~

Quando eu atravesso a catraca do metrô respiro aliviado. Finalmente eu estava livre daquela situação. Finalmente um pouco de paz em dias tão turbulentos.

Lidar com o divórcio dos pais não era nada fácil. Ainda mais quando você sempre os teve como referência de um bom relacionamento.

Olho para o relógio da estação de metrô que marcava duas e cinquenta da tarde. Aperto o cabo da mala de rodinhas com tanta força que os nós dos meus dedos ficaram brancos.

Meu celular começa a tocar no exato momento em que alguém dá um esbarrão em mim.

— Sai do meio do caminho idiota. — Disse um troglodita enorme. — Está achando que é pilastra?

Merda. Senhor meu Deus porquê me fizeste tão desastrado?

Ignoro as ligações dos meus pais e mando uma mensagem para o meu melhor amigo. Ele tinha me convencido a assistir ao jogo daquela tarde e me encorajado a tomar a decisão mais difícil da minha vida. Sair definitivamente de casa.

Dudu não era somente meu melhor amigo, ele era meu psicólogo, meu mestre cuca e meu verdadeiro suporte. O fato dele ser hétero e eu bissexual nunca atrapalhou nossa amizade. Eu aguentava ter que comer as gororobas que ele fazia como acarajé de atum e ele suportava meu jeito desastrado de ser.

Caminho perto da escada rolante com certa dificuldade. Quando resolvi sair de casa eu coloquei tudo que dava dentro da pobre mala. O que significava oitenta por cento de livros.

Mando uma mensagem para Dudu.

{Estou na estação de metrô de Pituaçu.}

Dudu responde imediatamente.

{Cara a Maria está enchendo o saco vou me atrasar um pouco. Vou ter que deixar ela na casa da coroa}

Começo a digitar uma resposta quando uma mulher começa a falar no alto falante.

— Senhores passageiros. Não ultrapassem a faixa amarela.

{Pfvr não demora.}

Dudu não responde e quando eu percebo minha mala havia sumido. A imunda da mala estava quicando escada rolante á baixo e quando chegou na metade ela simplesmente flutuou até o chão fazendo um barulho enorme. Desço correndo as escadas atrás da mala.

Tento levantar a mala, mas era muito pesada e quase caio com tudo para trás. Arrasto a mala até o assento mais próximo. Quando eu ficava nervoso eu mexia sem parar no couro cabeludo.

Dudu vai demorar um pouco. Meus pais em pé de guerra. A cidade um caos por causa do jogo. A estação de metrô estava tão lotada que era como se o oxigênio estivesse em extinção.

Deixei de mexer no cabelo quando uma sensação passou pelo meu corpo. Sabe quando você sente que está sendo observado? Era essa a sensação que eu estava sentindo. Então olho para o outro lado e encontro um garoto me olhando.

~Marduque~

Veja bem, não é como se eu fosse um sociopata perseguidor, mas quando o garoto sumiu eu tive um leve ataque cardíaco. A estação de metrô estava ficando cada vez mais cheia e a multidão se aglomerava.

Tentei encontrar o garoto, mas minhas várias tentativas falharam. E foi então que algo acertou fortemente o meu pé, a dor lancinante subiu pelo meu corpo. O garoto de minutos atrás se encontrava na minha frente e sua mala esmagando o meu pé.

— Meu Deus, me perdoe. — Disse o garoto. — Eu sou um desastre ambulante. Por favor cara de verdade foi um acidente.

Tento não parecer bravo e dou um sorriso sincero.

— Acontece.

Ele arrasta a mala e senta-se nela de frente para mim, mantendo contato visual.

— Eu ganho um desconto pelo fato de que você estava me encarando mais cedo? — questiona ele. — Ou você faz a linha sonso?

Minhas bochechas ficaram tão vermelhas como uma lua de sangue.

— Eu só... eu só... — gaguejei e por incrível que pareça fiquei ainda mais corado. — Eu só fiquei curioso pelo fato de você ter feito a maior algazarra com a sua mala.

— Conhecimento pesa. Prazer, Afonso Dell.

Ele estende a mão e eu a aperto no mesmo instante.

— Prazer, Marduque. — Respondo sorrindo porque eu sou besta nesse nível mesmo. — Marduque Barcellos. — Acrescento.

Os olhos de Afonso se arregalaram.

— Como o deus babilônico?! — Ele fala quase gritando.

— Você também é fã da mitologia mesopotâmica?

Ele dá de ombros.

— Na verdade eu assisto a novelas bíblicas, o que é meio estranho devido a minha bissexualidade.

Fico curioso em saber qual explicação ele daria sobre isso, mas as multidões estavam se mexendo rápido demais. As pessoas estavam correndo desesperadas e empurrando umas às outras.

— Senhores passageiros — dessa vez foi a voz de um homem, ao vivo e em estéreo. — Mantenham a calma. Não gerem pânico.

Antes que eu pudesse tentar entender o que estava acontecendo alguém em sua corrida desesperada acertou meu nariz em cheio com uma cotovelada. Fico meio tonto e quase caio. Primeiro meu pé e agora meu nariz. O que mais falta acontecer?

Sinto dedos se entrelaçando na minha mão e me puxando. Afonso começa a correr me levando consigo e eu tento me esforçar para acompanhá-lo.

Dois Amigos Em Um Dia PerfeitoOnde histórias criam vida. Descubra agora